O Legião surgiu nos quadrinhos em 1985, na revista dos Novos Mutantes, criado por Chris Claremont e Bill Sienkiewicz (já escrevi sobre ele e estas revistas em outro post: aqui). Na ocasião, o garoto com poderes extraordinários surta e acontece uma batalha psíquica entre ele e o próprio Xavier.
Na série televisiva, produzida em 2017 pela FX em parceria com a Marvel Television, a origem é diferente. Xavier luta contra o Rei das Sombras (Amahl Farouk) para proteger seu filho David. Derrotado, o Rei das Sombras se esconde dentro da mente do garoto por décadas.
Após ter um surto, David é internado e é aí que começa a aventura dele na série. Sendo resgatado por um grupo de mutantes, irá se envolver numa trama cada vez mais grandiosa envolvendo o destino de toda a humanidade e tendo Farouk como seu grande antagonista.
Existe uma famosa teoria segundo a qual aquele clássico desenho da Caverna do Dragão é uma analogia para o Purgatório. O Mestre dos Magos, que aparentemente é o guia e ajudante das crianças perdidas, é na verdade o Diabo que ardilosamente trama para que elas nunca saiam do Purgatório. Já o Vingador, que parece ser o vilão, é de fato Jesus, tentando fazer com que saiam daquele mundo.
Pois bem, podemos encontrar algo parecido em Legion. A princípio David é o herói e Farouk o vilão, mas a história vai de tal forma se desenrolando que esta divisão de papéis vai ficando menos clara. David começa a se mostrar meio vilanesco, enquanto Farouk parece que no fundo tenta salvar a humanidade.
Seria Farouk um arquétipo de Jesus? |
Curiosamente, quando Farouk é capturado, recebe um inibidor de seus poderes telepáticos que se parece com uma coroa de espinhos, o que contribui para essa interpretação alegórica de que ele seja um tipo de Jesus, um salvador incompreendido.
Além disso, o próprio nome do protagonista, Legion, faz referência ao demônio bíblico Legião (que tinha esse nome porque dentro de uma só pessoa havia uma multidão de demônios, como uma múltipla personalidade), que Jesus enfrentou, segundo os Evangelhos. Legion não é o salvador, mas o destruidor de mundos.
Analogias à parte, o que mais chama atenção nesta série é a sua estética. Desde o começo, toda a ambientação, os diálogos, as cenas que se passam dentro da mente dos personagens são surreais, psicodélicos, como se a história fosse contada ou imaginada por uma mente esquizofrênica. Existem tantas coisas estranhas e confusas que em vários momentos você perde o fio da meada e se pergunta: "O que é isso que eu acabei de assistir?". E isso é ótimo.
A série parece um grande clipe de algum álbum de rock experimental dos anos 70. A trilha sonora, composta por Jeff Russo, combina perfeitamente com essa proposta. Nenhuma outra série da Marvel ousou tanto em explorar o surreal, de modo que Legion pode ser considerada uma Rick 'n Morty da Marvel. Tem viagem no tempo, aventuras dentro do mundo mental cheio de simbolismo e tem até um episódio dedicado ao multiverso, mostrando várias realidades e destinos alternativos da vida de David.
Versão de um mundo paralelo de David, aparentemente inspirada no Mr. Anderson de Matrix (1999). |
Numa das realidades alternativas, uma clara referência à cena de espancamento do filme Laranja Mecânica (1971). |
Falando em multiverso, o mundo de Legion tem um endereço bem definido na database da Marvel. É chamado de Terra-TRN620 (veja aqui). Ou seja, a Marvel deixa claro que Legion não se passa no mesmo mundo do Universo Cinematográfico Marvel, que é a Terra-199999 (veja aqui), mas é melhor assim, pois Legion vai muito bem como uma série fechada em si, sem necessidade de se interligar às outras produções da Marvel.
Atualmente, a maioria das séries da Marvel se passa na Terra-199999, o mesmo mundo dos filmes. É o caso de Agents of SHIELD, Agent Carter, todo o demolidorverso (Demolidor, Jessica Jones, Luke Cage, Punho de Ferro, Defensores, Justiceiro), Runaways, Manto & Adaga e até os Inumanos. Legion foi uma exceção, existindo em seu próprio e peculiar universo.
Outro detalhe bem chamativo são as capas, estas sim lembrando bastante os discos psicodélicos setentistas, cheias de cores e imagens simbólicas.
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