Laura Esquivel (1950), escritora mexicana, começou a carreira como roteirista para programas de TV e filmes. Desde a juventude tem interesse em filosofia e misticismo oriental. Estes dois elementos, o cinema e o misticismo, estão presentes no estilo da escritora, como se nota em Como Água Para Chocolate (1989), um romance fantástico e narrado de maneira cinematográfica e dramática.
A história é ambientada durante a Revolução Mexicana, no começo do século XX, particularmente em uma fazenda onde vive uma família governada por uma opressora tradição matriarcal. O termo "como água para chocolate" é um ditado popular comum no México e se refere ao estado em que a água fervente está pronta para receber o chocolate, o que pode representar o fervor sexual, por exemplo. No Brasil temos uma expressão parecida que é "em ponto de bala".
Fervor é o estado da alma da protagonista Tita, e o livro está repleto de fogo, um fogo sexual que surge na alma de Tita e ganha vida de maneira mágica, chegando a provocar incêndios reais e mesmo a incendiar uma casa inteira! Não à toa a autora usou a cozinha e a culinária como o ambiente principal, pois lá a fervura está sempre presente, como que simbolizando a própria temperatura dos sentimentos da personagem.
Tita apaixona-se por Pedro, num momento descrito como cheio de brasa:
"...podia recordar perfeitamente... o olhar de Pedro sobre seus ombros... Esse olhar! Ela caminhava até a mesa levando uma bandeja de charão com doces feitos de gemas de ovos quando o sentiu, ardente, queimando-lhe a pele. Voltou a cabeça e seus olhos se encontraram com os de Pedro. Nesse momento compreendeu perfeitamente o que deve sentir a massa de um filhó ao entrar em contato com o azeite fervendo".
Pois bem, essa brasa será contida por causa das tradições e tabus da família, rigorosamente governada pela mãe de Tita, Elena, representante de um poder tirano e estagnado, que irá de encontro ao espírito inovador e rebelde de Tita. Tita é designada pela mãe a ser a solteira da casa, obrigada a permanecer a serviço dela até a velhice. A moça, porém, quer a liberdade para poder seguir sua vida e experimentar o relacionamento amoroso.
Esse antagonismo irá levar Tita ao sofrimento, ao desespero, doença e mesmo à loucura, de modo que terá que passar por uma jornada de renascimento e redenção com ajuda de outro personagem, o médico John.
O livro é dividido em 12 capítulos nomeados com os meses do ano e cada qual traz uma receita culinária especial, adequada às festividades de cada época. A culinária é tratada como algo mágico, alquímico, e o estado de espírito de Tita sempre exerce algum efeito sobre os pratos que ela prepara.
Desta forma, o estilo da obra pode ser classificado como de "realismo mágico", uma narrativa levemente surreal, mas na qual a magia e o fantástico aparecem como parte do cotidiano, parte de eventos rotineiros como o ato de cozinhar ou a manifestação amorosa. Como Romeu e Julieta, a história é um romance trágico e dramático, no qual os apaixonados têm seus sentimentos reprimidos por pressões da família.
O filme, lançado em 1992, teve roteiro da própria Laura Esquivel de modo que a trama se mantém fiel à história original. Claro que o filme não chega aos pés do livro em sua aura mágica e nas descrições vívidas dos sentimentos da protagonista, mas vale a pena conferir.
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