Conta-se que o violinista Paganini, no século XIX, fez um pacto com o Diabo para ganhar seu talento musical. A relação entre música e o Diabo, ou seres místicos, como a Musas, é bem antiga, mas nenhum gênero consagrou tanto este conceito quanto o rock. "O Diabo é o pai do rock", disse Raul Seixas.
Assim como Paganini, o jovem músico de blues, Robert Johnson, também fez um pacto com o Diabo que ele encontrou em uma encruzilhada. Sendo o blues um precursor do rock, é como se o pai ali estivesse criando a tradição que seria adotada pelo filho.
Quando veio o rock, ele ganhou a fama de demoníaco em parte de forma pejorativa, por causa de religiosos conservadores que não viam com bons olhos um gênero musical frenético que agitava os jovens nas casas de dança, mas ao longo do tempo os próprios músicos alimentaram a ideia, alguns até de forma caricaturizada, como a banda Kiss, que se maquiava com aparências demoníacas, algo como os demônios do teatro kabuki japonês. A banda Black Sabbath traz em seu nome a referência a um ritual satânico.
Aconteceu que o satanismo propriamente dito acabou de fato influenciando cultural e intelectualmente alguns roqueiros, por meio dos livros de Aleister Crowley (ele inclusive aparece numa capa de álbum dos Beatles) e de um renascer do ocultismo com a Nova Era nas décadas de 60-70.
Misture-se a misteriosa simbologia esotérica com as influências psíquicas do LSD e temos a estética psicodélica dos anos 70. O lisérgico filme Lucifer Rising (1972)¹, por exemplo, foi originalmente produzido com trilha sonora de Led Zeppelin.
Há inúmeros exemplos da relação explícita ou discreta entre o Diabo e a estética do rock. O sinal de chifrudo com as mãos, que se tornou um dos grandes símbolos do rock, é um dos maiores exemplos. Obviamente, este sinal ganhou um sentido mais genérico para representar a atitude do rock, a energia, rebeldia, juventude, etc., mas a figura do Diabo chifrudo continua ali.
Curiosamente, o rock também desenvolveu uma relação com o cristianismo. Elvis, o pai do rock, aquele que o tornou mainstream, era um cristão convicto e até possui músicas gospel em seu repertório. O rock gospel propriamente dito também existe desde a década de 60 e hoje as bandas podem ser contadas às centenas, ou milhares se incluídas as bandas mais de garagem e aquelas formadas dentro de igrejas para tocar exclusivamente para o público cristão.
No Brasil, algumas destas bandas de rock gospel até chegaram ao meio dito secular, tocando em rádios como qualquer outra banda. É o caso de Catedral, Rosa de Sarom e Oficina G3. Alguns músicos que se converteram ao longo da carreira acabaram migrando para o lado gospel do rock, como foi o caso do vocalista Rodolfo, do Raimundos.
Enfim, o rock possui essa mistura de opostos. De fato, ele é o mais eclético e miscigenado dos gêneros musicais, absorvendo todo tipo de influência tanto musical quanto ideológica, regional e religiosa. Tem rock pra todos os gostos. Aqui no Brasil, então, a mistura foi além. Temos forró rock, samba rock, pagode rock brega rock e por aí vai.
Fala-se que o rock "morreu" ou perdeu seu trono para o pop e o funk. De fato, o cenário mainstream da música não pertence mais ao rock, todavia, este gênero está longe de desaparecer. Ele mesclou-se à cultura humana, absorveu influências e foi absorvido. Foi adotado tanto por Deus quanto pelo Diabo. No rock cumpriu-se o solve et coagula, a mistura de opostos, o casamento do Céu e do Inferno.
Notas:
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