Nanatsu no Taizai (2014-) começou como muitos animes shonen: conhecemos personagens com poderes peculiares que vão se enfrentando e até mesmo há momentos em que acontece algum torneio que serve simplesmente para vermos os poderes em ação.
Em termos de ação e cenas de luta, o anime já cumpre os requisitos pra ser um bom shonen, além disso, o estilo do traço é agradável, a ambientação medieval cria um lore que mistura tramas políticas, magia e chega até um nível transcendente, literalmente envolvendo o Céu, o Inferno e o Purgatório.
É curiosa a antítese feita entre os do bem e os do mal, pois os mocinhos são chamados de Sete Pecados (um título que faria mais sentido se aplicado aos vilões), enquanto os vilões, demônios de fato, são os Dez Mandamentos.
Na aparência, poderes e personalidade, os Sete Pecados são bem diferentes, de modo que há estilos para todo gosto. Meliodas e Ban são os mais típicos de shonen, dois caras sempre prontos para uma briga; Diane é uma gigante muito fofa e simpática; King é um garoto fada que a princípio tem uma personalidade bem insegura, o que obviamente vai mudando com sua evolução; Gowther já foge bastante dos estereótipos shonen, pois tem uma aparência andrógina e uma personalidade mais introvertida e meio robótica (depois é revelado que ele é literalmente um boneco).
Mais à frente somos apresentados a outros membros outrora ausentes: o casal Merlin e Escanor, claramente os mais poderosos do grupo. Eles formam uma combinação de opostos. Merlin é bastante feminina e seus poderes são mágicos, enquanto Escanor é a pura brutalidade física, um "homão". Ele é o Superman do grupo, sempre impressionando nas lutas.
Six pack? O Escanor tem um eight pack. |
Também é interessante a relação dos dois. Escanor é orgulhoso, imponente, simbolizado pelo signo de Leão. Já houve momentos em que ele recebeu a ordem de um arcanjo e se negou a cumprir por puro orgulho. Ninguém dá ordens ao poderoso Escanor... com exceção da Merlin. Com Merlin o seu comportamento muda totalmente. Ele a trata com subserviência e humildade. São um casal sub e dom.
Um dos melhores, ou talvez o melhor momento da quinta temporada é a morte do Escanor. Num gesto de sacrifício, ele consome a própria energia vital para alcançar o máximo de seu poder. Enquanto é consumido pelas próprias chamas, ele se despede de Merlin e ela, pela primeira e única vez no anime, tasca-lhe um beijo na boca, de modo que ela acabou queimando o próprio rosto.
Temos então o momento mais poético e romântico de todo o anime. Escanor era conhecido por compor poemas. Agora, na sua despedida, é Merlin quem lhe dedica um poema:
"Não pude corresponder aos seus sentimentos.
Eu vou queimar no meu corpo
a prova de que você esteve vivo.
Eu vou queimar no meu corpo
a marca do seu amor."
Ao que Escanor responde com outro poema:
"O seu amor é solitário.
Um vinho explêndido que embriaga o coração.
Porém, não posso ser o recipiente que o contém.
Eu imploro aos deuses:
façam que um dia surja um recipiente que contenha este amor."
Desde o início achei Merlin uma personagem interessante. Inteligente, sagaz, madura e confiante, a mais poderosa em termos de magia. A incomum relação dela com Escanor e o desfecho poético só aumentaram o desenvolvimento desta personagem. Aí estragaram no final da quinta temporada com um flashback de seu passado.
Quando criança, Merlin demonstrou ser superdotada e virou estudante de magia, mas o que a marcou realmente foi ter conhecido o Meliodas, por quem teve uma paixonite infantil. Eis que a grande motivação da Merlin a partir daí foi preencher o vazio que sentia por causa desta paixão não correspondida. E foi por isso que ela se dedicou aos estudos e até tramou um plano apocalíptico para o mundo.
Ou seja, mais uma vez tudo gira em torno do Meliodas. É assim com todos os outros personagens. Todos são impactados pela convivência com o Meliodas, como se ele fosse uma figura messiânica.
Bom, não há problema nisso. Com o Naruto também é assim. Só que, no caso específico da Merlin, o Meliodas a influenciou de uma forma bem bobinha, uma paixonite, e esta não parece um bom pretexto para ser a raison d'être, a grande motivação da vida dela. Isto desfaz toda a maturidade e independência que antes ela aparentava ter.
Para completar o grupo, tem a Elizabeth, que a princípio está na série pelo fan service, ou melhor, pelo ecchi, algo que não pode faltar em um shonen. Muito bela e com roupas sensuais, Elizabeth é constantemente assediada pelo Meliodas. É, todos sabemos que isto é problemático, mas só se levarmos a sério demais algo que acontece no anime apenas pelo humor controverso e pelo ecchi.
Também, como não podia faltar, há um mascote muito fofo, o porquinho Hawk, que tem um jeito engraçado de falar (e quando corre fica falando "cotocotocoto") e na verdade é um membro bem útil do grupo, desenvolvendo até um curioso poder de mudar de forma ao comer pedaços de outras criaturas.
Nanatsu no Taizai é um anime com personalidade. Ou pelo menos era no começo. Os personagens são estilosos e tem pra todo gosto. Seu estilo debochado, especialmente o ecchi, divide opiniões. Há quem curta ecchi por diversos motivos (desde a mera apreciação estética até a tara mesmo) e há quem o considere apelativo e problemático. Para quem não curte, o anime de fato não é recomendável.
Com o tempo, a história vai escalando em um nível tal que os antagonistas do começo acabam parecendo meros minions. Foi o caso do Githunder, que no começo parecia bem poderoso e ameaçador, enfrentando Meliodas de igual pra igual. Depois vieram os Dez Mandamentos e outros seres cósmicos e os Sete Pecados também cresceram bastante em poder, mas o Githunder ficou pra trás.
Com o avanço da trama, o clima do anime muda. Toda aquela comédia e ecchi do começo se perdeu depois da quarta temporada, aquele mundo medieval, com tavernas e vilarejos deu lugar a um cenário desértico e a trama se resumiu a lutas com criaturas cada vez mais poderosas.
Também o traço perdeu a beleza inicial, a animação ficou bem mais preguiçosa, com muitas cenas estáticas em que os personagens simplesmente não se mexem, uma maneira de economizar frames no trabalho de animação. Enfim, o anime perdeu o charme inicial, sinal que já estava na hora de terminar.
Curiosa referência a van Gogh. |
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