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Nolan volta a brincar com o tempo em Tenet

Tenet (2020)
Entre as assinaturas de Nolan, também está a fotografia com tons azulados.

Christopher Nolan se destacou pela primeira vez como diretor no filme Memento (2000). Ali ele já dava indícios de que o tempo seria seu tema favorito, pois o personagem lida com lapsos de memória, de modo que para ele o tempo acontece de forma fragmentada.

O diretor virou estrela na trilogia Batman (2005-2012). Nolan, portanto, inaugurou a nova era de filmes de super-heróis que está rolando até agora. Foi a DC que trouxe de volta este gênero para os blockbusters (claro que a Marvel também fez isso num ciclo anterior, no início dos anos 2000 com X-Men e Homem-Aranha). 

A Marvel fez a sua jogada e a partir do primeiro Iron Man (2008)¹ passou a protagonizar a produção industrial e bilionária de novos filmes de super-heróis. A DC esfriou depois do Batman, mas ainda tentou criar um universo que adotasse o estilo criado por Nolan. O chamado snyderverso a princípio seria um nolanverso.

Pois é, o tal estilo "sombrio e realista" dos filmes recentes da DC não teve início com o Zack Snyder, mas um pouco antes com o Batman do Nolan. Nolan foi encarregado depois de escrever o roteiro de Man of Steel (2013)², portanto, dando o seu DNA para outro personagem tão importante quanto o Batman. Só que ele passou o bastão da direção para Zack Snyder, que então deveria a partir daí desenvolver o chamado DCU, o novo universo da DC no cinema.

Dito isto, é curioso constatar que Nolan é um diretor/roteirista de histórias de super-heróis. Ele é um diretor bem autoral e cult, no sentido em que possui fãs do seu estilo e produz "filmes cabeça" que conseguem ao mesmo tempo ter elementos cult, mas uma publicidade pop e industrial.

Inception (2010)³ é a obra-prima do diretor e neste filme ficou consagrado o seu interesse pelo tempo, pois a trama explora o tempo de uma forma fantástica (correndo cada vez mais devagar à medida em que os personagens mergulham no mundo do sonho).

Pensando bem, Inception é um filme de super heróis. São personagens com a capacidade de trafegar no mundo onírico e criar objetos com o poder da imaginação. Não só Nolan impregnou o Batman e mesmo o DCU com seu estilo, como inversamente o Batman integrou o Nolan no mundo dos autores deste gênero de fantasia.

Depois de Inception, a outra grande obra sci-fi fantástica foi Interstellar (2014) que também é um filme de super heróis, agora espacial, cósmico. O protagonista consegue se aventurar no mundo surreal e quântico do tecido do espaço-tempo, como uma espécie de Homem-Formiga versão Nolan (curiosamente, um ano depois viria o filme do Homem-Formiga).

John David Washington and Robert Pattinson; Tenet (2020)

Agora em Tenet (2020), o tempo novamente é brilhantemente explorado, desta vez na forma de palíndromo.

Sou um amante de palíndromos e reconheci logo a referência no título do filme assim que saiu o primeiro trailer. Tenet, embora também seja uma palavra em inglês ("princípio"), é parte de um dos mais clássicos palíndromos da antiguidade, um texto em latim que dizia: "SATOR AREPO TENET OPERA ROTAS". Esta combinação pode ser lida não apenas de trás pra frente, como verticalmente, pois as cinco palavras são postas na forma de um quadrado mágico.

Sator square

Tenet trata de uma conspiração envolvendo pessoas do futuro e do presente que se comunicam por uma tecnologia capaz de inverter a entropia. Ou seja, por este método da inversão, é possível fazer uma bala voltar para dentro da arma ou uma pessoa andar de costas e um carro capotado desvirar como se nada tivesse acontecido. Na prática, portanto, se torna possível voltar no tempo.

Nolan aproveita esta ideia para criar um filme de ação que, se não fosse por tal conceito surreal, seria apenas mais um filme de ação com perseguições de carro, tiroteios e bombas. Acontece que, em Tenet, vemos prédios demolidos voltando a se reconstruir, balas disparadas ao contrário e uma bizarra luta de corredor entre personagens com tempos invertidos.

No Inception também teve uma cena de luta em corredor que brincava com a mecânica do tempo desacelerado. Agora em Tenet novamente temos uma luta de corredor, só que ainda mais estranha, já que um dos personagens está indo para a frente no tempo e o outro para trás. Uma luta em forma de palíndromo.

John David Washington, Robert Pattinson, and Elizabeth Debicki; Tenet (2020)

Desta forma, Tenet é sim outro filme de super heróis do Nolan. Agora os heróis e vilões são viajantes do tempo, ou melhor, manipuladores do tempo, time benders, algo parecido com os poderes da Max no jogo Life is Strange (2015), só que, em vez de serem poderes psíquicos ou sobrenaturais, são mediados pela tecnologia, por um algoritmo criado no futuro.

Tenet, enfim, tem uma grande ideia, uma trama épica de risco global e cenas de ação com este toque especial da manipulação do tempo, mas no geral o filme não se equipara a um Inception, que uniu a ação, a fantasia e também o drama de uma forma inesquecível. 

Também em termos de trilha sonora, não foi tão grandioso quanto Inception e Interstellar, que contaram com o trabalho de Hans Zimmer. A trilha de Tenet foi composta por Ludwig Göransson, não é tão épica, mas faz uma interessante brincadeira com a inversão, em alguns momentos parecendo um disco tocado ao contrário.

É curioso também o fato de que um dos protagonistas é interpretado por Robert Pattinson, que será o novo Batman em 2022. Mais uma vez Nolan dirige um filme com o Batman.

Elizabeth Debicki
A musa de um metro e noventa, Elizabeth Debicki.

Notas:






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