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Máquina Mortífera, a mais famosa franquia de dupla de policiais

Danny Glover, Mel Gibson; Lethal Weapon (1987)

Filmes de ação, especialmente ação policial e militar, eram nos anos 80 o equivalente aos filmes da Marvel atualmente, só que sem precisar de um orçamento blockbuster ou efeitos especiais supimpa. O importante era ter explosões, o que era feito de forma prática mesmo.

Teve algumas exceções, como a franquia Terminator que sempre investiu muito em CGI de ponta (para a época, claro), mas no geral bastava um ator querido do público e uma história maluca, cheia de tiro, porrada e bomba. Foi a era dos brucutus.

Lethal Weapon foi um dos ícones da era dos brucutus. Foi dirigido por Richard Donner, o diretor de nada menos que o fabuloso filme do Superman (1978). A trama não tinha nada de novo: dois policiais com personalidades opostas, a fórmula "good cop bad cop", enfrentam bag guys da máfia. 

No papel de Roger Murtaugh, Danny Glover é um policial já velho, com família estabelecida e que só quer ter um fim de carreira tranquilo. Martin Riggs, interpretado pelo Mel Gibson, é um ex-militar do Vietnã, muito talentoso e destemido que vive atormendado por causa da morte da esposa. Desleixado e com desejos suicidas, ele mora em um trailer e não tem nada nem ninguém para segurar sua sanidade.

Mel Gibson; Lethal Weapon (1987)

O filme já começa com o Mel Gibson peladão, passeando no trailer com sua bunda peluda. Ele vira o novo parceiro do Roger, que logo pecebe que seu colega não bate bem da cabeça, com seu comportamento imprudente e as constantes quebras de protocolo. De toda forma, vai se formando um laço entre eles, ainda mais depois que Roger fica sabendo do luto de Riggs e desenvolve uma empatia.

Danny Glover, Mel Gibson; Lethal Weapon (1987)

Riggs é claramente o personagem mais desenvolvido do filme, enquanto Roger funciona apenas como seu sidekick. A carga dramática da história está no sofrimento psicológico de Riggs e, mesmo quando a filha de Roger é raptada, é o Riggs que se torna o grande herói, pois chega a ser torturado com eletrochoque e consegue escapar e salvar tanto Roger quanto a filha num típico momento de brucutuzice.

Era de se esperar que em um filme com o Mel Gibson ele fosse o personagem mais badass. Danny Glover era um ator veterano, mas não tinha uma carreira de filme de ação. Mel Gibson, por sua vez, já deixara sua marca com a trilogia Mad Max (1979-1985), adotando este typecast de cara meio maluco e bom de briga.

Danny Glover, Mel Gibson; Lethal Weapon (1987)

A cena mais memorável e também mais zuada do filme é no final, quando a dupla cerca o vilão, também chegam vários carros de polícia, mas Riggs diz para não interferirem, porque ele faz questão de dar uma surra no cara. Aí rola literalmente uma rinha, um policial e um mafioso brigando em um círculo de policiais que assistiam a tudo sem tomar uma providência. É tosco, mas combina com o gênero, afinal o herói tinha que terminar a história em uma luta mano a mano com o vilão.

Aí tem aqueles clichês. Quando o vilão está sendo algemado, ele rouba a arma de um policial, dando o pretexto para Riggs e Roger reagirem de forma letal. Ambos sacam as armas juntos, rendendo um momento de justiça poética, quando os dois policiais atiram ao mesmo tempo no vilão.

Mel Gibson; Lethal Weapon (1987)

Mel Gibson; Lethal Weapon (1987)

Outro clichê é quando Riggs vai visitar o túmulo da esposa e está chovendo. Cenas de visita ao cemitério durante a chuva são clássicas. Um dia vou descobrir quem inventou isso.

Danny Glover, Mel Gibson; Lethal Weapon 2 (1989)

Lethal Weapon 2 (1989) já começa em plena ação, com uma cena de perseguição de carro tão típica dos filmes de policial. Desta vez o vilão é um consul da África do Sul e o tema do apartheid, que estava em alta nos anos 80-90, é claramente abordado no filme.

Mel Gibson; Lethal Weapon 2 (1989)
É, o Riggs errou uma letrinha no "apartheid".

Lethal Weapon tem essa fórmula que mistura temas políticos, ação policial e um humor focado na dupla Riggs e Roger. O momento mais trapalhão dos dois é quando Roger fica por dez horas sentado no vaso sanitário de casa porque tem uma bomba e é o Riggs que vai salvá-lo, criando uma situação bem constrangedora entre os dois.

Danny Glover, Mel Gibson; Lethal Weapon 2 (1989)

Lethal Weapon 2 (1989)

Rubber tree; Lethal Weapon 2 (1989) and Lethal Weapon series (2016-2019)

Entre as várias brincadeiras de Lethal Weapon 2, temos a "árvore de camisinhas" que é dada de presente ao Roger. Na segunda temporada da série de 2016, é feita uma homenagem a esta cena. A árvore original é mais zueira, pois os colegas tiveram o trabalho de soprar as camisinhas para enchê-las, enquanto na série colocaram as camisinhas intactas.

Riggs começa a namorar uma garota e, quando parece que ele finalmente vai superar a perda da esposa, é atacado pela mesma máfia que matou sua esposa e ele vê a namorada morrer afogada na sua frente. Agora ele vai entrar no modo full maluco e partir pra vingança.

Assim como no primeiro filme, a história termina com o Riggs saindo no soco (e facadas) com o vilão, mas dessa vez não tinha uma plateia de policiais assistindo.

Lethal Weapon 3 (1992)

Máquina Mortífera 3 (1992) já se passa nos anos 90, mas é o mais anos 80 da franquia. Há mais zoeira do que ação e muitas piadas e trocadilhos. Já começa com Riggs querendo desarmar uma bomba só por diversão e claro que a coisa não dá certo e ele destrói um prédio inteiro. 

Danny Glover, Mel Gibson; Lethal Weapon 3 (1992)
Loucademia de Polícia.

Os dois são rebaixados, virando policiais de rua, usando aquela farda bem Loucademia de Polícia. Mesmo assim, eles não resistem à tentação de se meter em casos perigosos e, ao presenciar um assalto a um carro forte, se metem na perseguição e a coisa vai escalando.

Uma cena curiosa é quando Riggs e a policial Lorna Cole começam a trocar figurinhas mostrando suas cicatrizes de tiros e facadas, o que acaba se tornando uma espécie de strip tease de brucutus (afinal a Lorna também se encaixa na categoria brucutu).

Danny Glover, Mel Gibson; Lethal Weapon 3 (1992)

Nos anos 80-90 o cabelo mullet virou moda. Até o Superman aderiu depois que ressuscitou (tanto que os fãs mais nerds estavam torcendo que o Henry Cavill aparecesse de mullet no Snyder Cut). O Mel Gibson teve uma grande influência em popularizar este estilo¹.

Danny Glover, Mel Gibson; Lethal Weapon 3 (1992)

Lethal Weapon 4 (1998)

O Máquina Mortífera 4 (1998) não acrescentou muito à história da dupla, mas trouxe uma grande novidade, um crossover com ninguém menos que Jet Li. Jet Li estava no auge da popularidade nos anos 90. Ele e Jackie Chan eram os dois brucutus chineses mais famosos de Hollywood.

Danny Glover, Mel Gibson, Jet Li; Lethal Weapon 4 (1998)

Danny Glover, Mel Gibson, Jet Li; Lethal Weapon 4 (1998)
Um momento tarantinesco.

Nos anos 90, a China era uma potência em ascenção, o que se refletiu na popularidade de alguns atores chineses que passaram a se destacar no cinema americano. Naturalmente, o teor humorístico típico dos anos 90 não teve receios de fazer piadas com os chineses em Lethal Weapon 4, umas piadinhas bobas, mas que hoje em dia jamais Hollywood teria capaz de fazer.

Enfim, o filme termina com um ar de nostalgia e despedida desta grande franquia. Então veio um hiato de décadas, até o surgimento de um remake em formato de série.

A série

Lethal Weapon (2016-2019)

A série baseada nos filmes teve três temporadas entre 2016 e 2019, protagonizada por Damon Wayans (conhecido no Brasil como o cara de Eu, a Patroa e as Crianças) e Clayne Crawford. A série faz as devidas homenagens aos filmes, com referências diretas como a árvore de camisinhas, e no quesito ação vai muito além, com situações bem asburdas de tiro, porrada e bomba, sem medo de ser galhofa.

Durante a segunda temporada rolou uma treta, até hoje mal explicada, envolvendo o Clayne. Uns diziam que ele não se dava bem com o Damon, que era grosso no set, já ele disse que foi chantageado. Enfim, tretas. 

Aí na terceira temporada o Martin Riggs, o principal personagem da franquia desde os tempos do Mel Gibson, simplesmente foi retirado da fórmula e em seu lugar entrou um novo parceiro, Wesley Cole, interpretado por Seann William Scott (conhecido por todos como o lendário Stifler de American Pie, o frat boy escroto que todos amam odiar). De toda forma, a série não passou da terceira temporada.

Como era de se esperar de uma série, há bastante tempo e espaço para desenvolver os personagens e suas relações, a amizade zueira entre Roger e Riggs e especialmente o drama de Riggs, um cara quebrado por um trauma e que recebeu bastante atenção nas duas temporadas, passando por diversas experiências de relacionamento, tanto amizades quanto namoros, em que tenta reconstruir sua capacidade de lidar com pessoas. Neste aspecto a série foi bem feliz, pois deu carga dramática ao Riggs. 

Não só a profundidade emocional do Riggs foi ampliada, como também sua história. Na segunda temporada vemos que seus problemas vão muito além do luto pela esposa ou da experiência de guerra que o deixou meio pirado (enquanto nos filmes o Riggs serviu no Vietnã, no remake a timeline foi atualizada e ele serviu no Afeganistão). A raiz de seus problemas era seu pai abusivo e o velho voltou a encontrá-lo, só pra trazer mais problemas, até que, numa catarse final, rola um quebra pau entre os dois.

Riggs teve sua história bem desenvolvida, um ciclo completo. No final da segunda temporada ele visita o túmulo da esposa uma última vez, agora para se despedir, pois está disposto a encarar um novo relacionamento. Ele teve todo seu martírio e redenção e agora poderia se estabelecer, virar um pai de família e tal. 

Só que Riggs é um personagem trágico e também um fim trágico vem a calhar, sem contar que era o pretexto ideal para encerrar a participação de Clayne Crawford. Então um cara aparece do nada e dá um tiro no peito do Riggs. RIP.

Lethal Weapon (2016-2019)

Na terceira temporada Martin segue a vida e ganha um novo parceiro, o Wesley "Stifler" Cole. A dinâmica continuou sendo a mesma: Roger é o personagem mais cômico e Cole é mais maluco e dramático. Já bem no final da temporada ainda fizeram uma homenagem à cena de Máquina Mortífera 2 em que Roger senta na privada com uma bomba, só que dessa vez era só uma cadeira e a cena envolve Cole salvando sua ex-esposa.

A terceira temporada foi mais curta, mais parecida com um epílogo, após a morte de Riggs. Mas calma que Riggs continua vivo em outro universo, o dos filmes. Máquina Mortífera 5 está em planejamento e será interessante ver o sessentão Mel Gibson de volta ao papel.

Notas:

1: Naquela época, inclusive, eu desenhava meus próprios super-heróis infantis e o protagonista (que se chamava simplesmente Tom Cruise) tinha um corte mullet com um longo rabo de cavalo. Não lembro se me inspirei exatamente no Riggs, mesmo porque o rabo de cavalo masculino era bem comum no cinema da época. Inclusive eu mesmo deixei crescer um rabo de cavalo na adolescência. Infelizmente não tirei nenhuma foto. Não era ainda a época dos celulares e selfies, e fotos eram coisas raras.

Art by Sadat Oliveira (1995)

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