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Duna

Dune: Part One (2021)

Dune: Part One (2021)

Antes de ler Duna, eu já vinha me familiarizando com este universo através de vídeos e podcasts¹ dedicados ao tema. Há alguns anos assisti o filme de 1984 e confesso que não me pareceu tão interessante.

Aliás, creio que esta é a opinião de quem já leu os livros, afinal é uma obra muito vasta, um universo muito rico e que o filme de David Lynch tentou condensar ao máximo. 

Dune (1984)
Star Wars fez cenas espaciais bem melhores.

Dune parody by Corridor Crew

Este primeiro filme sofre do problema das adaptações fantásticas dos anos 80. Os efeitos especiais eram toscos, o escudo corporal dos personagens parece um boneco de Minecraft. Só que não acho que a limitação tecnológica realmente seja uma desculpa, pois Star Wars já impressionava nos anos 70.

O problema mesmo era narrativo. O filme conta tudo bem corrido e não dá tempo da gente imergir na trama. Quanto ao novo filme de Denis Villeneuve, a impressão que tive como é que desta vez estão fazendo um projeto com a devida paciência, cientes que a obra merece pelo menos uma trilogia. A parte 1, lançada agora em 2021, parece apenas um prólogo, mas um longo prólogo com duas horas e meia. 

Dune: Part One (2021)
O ornitóptero, uma espécie de helicóptero com aparência de libélula.

Dune: Part One (2021)

Esteticamente, o novo Duna está admirável. Tem uma bela fotografia, sabe explorar o cenário desértico e sua paleta de cores e ainda criaram umas naves com aparências bem estranhas, fora do formato convencional de naves em filmes sci-fi, o que por si só já mostra como este mundo, que existe em um longínquo futuro, é bem diferente do nosso.

Dune (1984)
Os principais planetas e famílias reais da série.

Nesta parte 1 somos familiarizados com a lore: a função da especiaria, a existência das casas, que são como grandes reinos interplanetários, o aspecto mítico e religioso que promete o surgimento de uma espécie de Escolhido que terá um papel crucial na história da humanidade. No caso, desde o começo já sabemos que este Escolhido pode ser o jovem Atreides.

Timothée Chalamet; Dune: Part One (2021)

Timothée Chalamet; Dune: Part One (2021)

O ator Timothée Chalamet já tem 25 anos, mas ele é daquele biótipo que parece ser ainda um adolescente. Curiosamente, o ator Kyle MacLachlan também tinha 25 anos quando interpretou o Atreides no filme de 1984, mas ele tinha cara de 25 e não de 15. Acho que neste aspecto visual o Timothée encaixou melhor no papel, já que Atreides ainda é de fato um garoto no início da história.

Dune: Part One (2021)
O minhocão literalmente com cara de cu foi a coisa mais estranha deste remake de 2021.

O filme de 2021 equilibra bem cenas de ação e batalha, alternando com contação de história e desenvolvimento da lore. A grande estrela, em se tratando de ação, é o minhocão, o verme gigante que aparece pela primeira vez na metade do filme e sequer vemos seu corpo, pois ele se move debaixo da areia, mas a sua bocarra gigantesca surge engolindo um veículo e só isso já causa uma forte impressão, pois é uma boca enorme, tipo do tamanho de um estádio de futebol.

Dune (1984)

Dune (1984)

Dune (1984)
Dois bróders cavalgando o minhocão.

Bem no finalzinho desta parte 1, temos um breve vislumbre de um guerreiro cavalgando um minhocão. Esse é o big deal da franquia em termos de ação e aventura. Sendo os vermes tão poderosos e assustadores, é preciso ser muito badass para domar um bicho desses e usá-lo como arma.

Alicia Witt; Dune (1984)

No filme de 1984, o clímax se dá quando Atreides (agora nomeado Muad'Dib, acompanhado de guerreiros do deserto, os fremen, e de vários vermes gigantes) ataca as tropas do imperador. Tem também a curiosa participação de uma criança, a atriz Alicia Witt, que interpretou a Alia Atreides, irmã mais nova de Paul e que tem uns poderes psíquicos (e uma atuação) sinistros. 

Sting; Dune (1984)
O Sting com uma sunga que tem asas. O trocadilho já vem pronto.

Ah, tem também o cantor Sting no papel de Feyd Rautha, um psicopata da casa Harkonnen. Creio que o músico foi inserido no elenco para atrair o seu público ao cinema. Foi tipo um Jared Leto da época, com a diferença que o Jared Leto é bom ator. 

O primeiro livro da série Dune, escrito por Frank Herbert, foi lançado em 1965. É um dos grandes pioneiros da ficção científica e influenciou muitos outros, inclusive Star Wars. Dizem que o autor não gostou do fato de Star Wars ter um verme gigante, o sarlacc, que pareceu um kibe descarado do George Lucas.

Herbert publicou seis livros desta série, mas o universo de Dune se expandiu ainda mais com prequelas e sequelas escritas por outros autores. Um diferencial de Dune é que Herbert evitou apresentar um mundo futurista repleto de robôs.

Nos anos 60, robôs e inteligência artificial já eram de certa forma um clichê no sci-fi. Enquanto no nosso mundo os primeiros computadores mal conseguiam processar míseros bytes, na ficção já se imaginava um futuro com computadores de inteligência igual ou superior à humana, bem como robôs humanoides.

Já em 1950, Asimov publicara seus contos apresentando conceitos como o cérebro positrônico (que era uma versão avançadíssima de hardware com uma super IA) e as 3 leis da robótica. Herbert não quis imitar Asimov e seguiu por um caminho mais peculiar.

Dune (1984)

Em Dune, a inteligência artificial avançada não existe mais, pois fora banida da civilização devido aos danos que ela causou no passado. O avanço tecnológico humano seguiu mais voltado à própria evolução genética do que aos computadores. Há computadores e robozinhos em Dune, mas estão longe de serem superinteligentes.

Uma vez que a civilização se tornou interplanetária, a navegação espacial  necessitava de complexos cálculos que humanos normais não poderiam realizar, ainda mais sem a ajuda de uma IA. É aí que entra o papel da especiaria, uma substância rara, encontrada apenas no arenoso planeta Arrakis, que literalmente dá superpoderes aos usuários, expandindo sua consciência de tal modo que conseguem guiar as naves pelo espaço com destreza.

A especiaria dá diversos poderes a quem tem contato com ela e também possui um efeito psicodélico, claramente uma marca do movimento New Wave dos anos 60 que influenciou muitos autores da época e mesmo de décadas seguintes.

Assim, Dune mostra um futuro em que a civilização progrediu mais em termos de sua biologia do que na tecnologia computacional e robótica. A obra também faz uma analogia com a batalha pelo petróleo que já estava em alta nos anos 60 e foi simbolizado pela especiaria de Arrakis. 

O fato de Arrakis ser um grande deserto também pode ser uma referência aos países do Oriente Médio e mesmo seu nome, Arrakis, pode ser uma referência ao Iraque, o país onde foi fundada a Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) em 1960. Coincidentemente, um dos imperadores do universo de Duna se chamava Shaddam IV, o que lembra Saddam Hussein, que se tornaria presidente do Iraque em 1979.

Edição em maio de 2024:

Em Duna: Parte 2 (2024), quem encarna o Feyd Rautha é Austin Butler, um jovem ator que recentemente protagonizou o filme sobre o Elvis (2022). Butler caprichou no papel, dando ao Feyd um ar convincente de sadismo e psicopatia. Ele realmente parece ameaçador e teve tempo de tela suficiente para ser bem desenvolvido, diferente da rasa versão interpretada pelo Sting.

O elenco destes dois filmes do Villeneuve é de qualidade. Temos Christopher Walken, Rebecca Ferguson, Javier Bardem, Josh Brolin, Dave Bautista e a Anya Taylor-Joy que aparece muito brevemente em uma visão futurista, representando a Alia, irmã de Paul, já adulta.

Neste segundo filme, Alia ainda está no ventre da mãe, mas devido aos efeitos poderosos da água da vida que a Lady Jessica tomou, alguma mutação aconteceu com o bebê de modo que ainda no ventre Alia já é muito inteligente, tem uma forte intuição e se comunica meio que telepaticamente com a mãe. Alia será muito mais poderosa que Paul e devemos vê-la em ação no terceiro filme que ainda virá.

Chani, a fremen que se casa com Paul, é interpretada pela Zendaya, que fisicamente parece se encaixar na descrição da personagem, mas nos livros ela é mais sorridentes, enquanto a versão da Zendaya está sempre carrancuda, até mesmo parece ter sentimentos contraditórios para com Paul, em parte amando e em parte odiando, como uma frenemy. Uma fremen frenemy (eu não podia perder este trocadilho).

Villeneuve, além de garantir ao filme um visual exótico e bem peculiar (uma das especialidades do diretor), também conseguiu administrar a história do primeiro livro com o timing adequado. Não correu demais a narrativa, como o filme de 1984, dando tempo para nos acostumarmos àquele mundo e aos personagens.

No segundo filme enfim chegamos ao clímax da história do primeiro livro, com a batalha dos fremen liderados por Paul para derrubar o imperador Shaddam IV.

Notas:

1: Tem um youtuber em particular, Quinn's Ideas, que é fanático por Dune e tem uma vasta produção de vídeos sobre este universo.

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