Estes dias tive uma distensão muscular na coxa e é interessante como uma coisa aparentemente tão banal acaba dominando toda sua vida.
O problema foi a localização estratégica. Bem na parte interna da coxa, acabou afetando um músculo muito usado. Esse danado se contrái quando sento, quando levanto, quando ando, quando deito, em resumo, qualquer movimento que eu fizesse, ou mesmo se ficasse sentado ou deitado, doía. Era o músculozinho o dia inteiro me ocupando a atenção.
Já tive algo parecido no trapézio e até uma tendinite no pulso (sim, por digitar demais), mas nenhum destes foi tão incômodo quanto a coxa. O pior de tudo é dormir, ou melhor, tentar dormir. Quando a gente se deita, o peso do corpo é distribuído no tronco e nas pernas. Logo, não importa a posição em que eu tentava dormir, a dor era constante.
Confesso que em certo ponto até passei a gostar daquela sensação de pontada. Era um prazerzinho sadomasoquista que deve ser semelhante ao dos membors da Opus Dei usando o cilício o dia inteiro na coxa pra se penitenciarem.
O curioso na dor é que o que preocupa nela nem é o incômodo. Com o tempo a gente acostuma. Lembro que na época em que fiz radioterapia no tórax, fiquei um ano inteiro sentindo uma pontada no peito. Eram as cicatrizes que a radiação deixou no meu pulmão. E acabei me acostumando com isso, virou uma sensação que eu normalmente ignorava, igual ao som de zumbido que escuto o dia inteiro dentro da cabeça, mas na maior parte do tempo eu ignoro e só volto a escutar quando estou no silêncio total ou quando vou dormir sem o barulho do ventilador.
Até hoje não existe uma explicação definitiva para estes casos de pessoas que escutam um zumbido. Às vezes tenho impressão que é como se eu ouvisse meu próprio cérebro funcionando, como se fosse um dispositivo elétrico, como aquelas antigas TVs de tubo que, se você notar bem, emitem um som constante de zumbido ou chiado enquanto estão ligadas. Será que sou um andróide e não sei? Blade Runner feelings.
Anyway, o que preocupa na dor não é o incômodo, mas o fato de que ela está nos alertando de que algo está errado. Se eu me mexo e sinto dor, a impressão é que estou causando algum dano ao músculo, que vou acabar prolongando o tempo de recuperação. É como se o músculo gritasse comigo: "Não faça isso de novo. Fique quieto!". A dor é o mecanismo de chantagem que o corpo usa para te convencer a não danificá-lo.
Outra coisa chata é que essa distensão afetou o meu andar e eu sempre ando rápido. Simplesmente não sei andar devagar. Agora lá estava eu pateticamente mancando como um zumbi, dando um passo no mesmo tempo em que normalmente daria três ou quatro. Descer um mísero degrau então, que cena cômica.
Nestes quatro dias de recuperação, tentei analgésicos, gel, massageador elétrico e até imposição de mãos (qualquer dia escrevo sobre essa arte misteriosa que é a imposição de mãos, algo que os céticos rejeitarão como pseudociência, mas só quem teve experiências e observou o efeito das mãos até sobre plantas [logo, refutando a teoria de que é um placebo] sabe que há algo influente emanando das mãos).
Tudo isto deve ter ajudado um pouco, além da melatonina (que tem um papel importantíssimo na regeneração celular), pois, mesmo dormindo mal, tentei dormir o máximo que pude. Mas o que me trazia alívio instantâneo era a compressa gelada. O frio é um anestésico fantástico, parece até que põe as células danificadas pra dormir, acaba com as pontadas, o latejamento, e o efeito pode durar por algumas horas. Me pergunto se as pessoas que vivem em regiões geladas sentem menos dor, afinal estão imersas o dia inteiro em um ambiente anestésico.
Quando a gente começa a se recuperar, vem uma sensação de alegria por coisas triviais que geralmente ignoramos: finalmente ter tido uma noite inteira de sono, finalmente conseguir caminhar, finalmente voltar a ser produtivo e poder fazer coisas simples como sair pra regar as plantas (pois a coxa danificada me incapacitou e afetou toda minha rotina).
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