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Sobre comida indiana, ecletismo e tudo o mais

Indian food

Ultimamente peguei uma mania de almoçar vendo vídeos de comida de rua indiana. Pois é, Jovem Nerd, a tradição de ver nerd player na hora do almoço acabou. O negócio agora é vídeo de indiano.

Tem gente que gosta de zoar estes vídeos, porque tem uns que são meio nojentos, as panelas parecem sujas e já vi um que o cara preparava um chá esmagando canela e outros condimentos no chão com uma pedra. Mas tirando estes casos, a verdade é que muitas destas cenas de lanchonetes e cozinheiros de rua são bem apetitosas.

A primeira impressão que tenho é que a culinária indiana é marcada pelo ecletismo, pela mistureba. Os pratos mais simples e populares, como um caldo, um pastel, um sanduíche, são feitos com uma mistura tão complexa de ingredientes que a gente fica pensando como foi que os caras chegaram a desenvolver esta receita. 

Tudo é feito com uma variedade de verduras, temperos e as doses são generosas. Muito queijo, muito ovo, muita carne, muito molho. Uma coisa é certa: indianos comem bem, comem muito e parece que esta comida não engorda. Bom, com certeza o sanduíche de rua indiano, feito naquela chapa velha respingando molho pra todo lado, é mais nutritivo que um Big Mac.

Foi assim, num momento de lanche enquanto assistia os caras cozinhando, que tive esse insight sobre o zeitgeist cultural indiano. É da natureza deste povo ser heterogêneo, misto, eclético em suas composições. Veja-se o cinema de Bollywood, especialmente o de ação. É uma mistura imensa de efeitos especiais e referências. É arte marcial, é tiro, é bomba, é tanque e helicóptero, tudo ao mesmo tempo.

A música e dança são muito ricas em coreografias e as cenas de dança sempre são cheias, muitas pessoas dançando e fazendo várias coisas ao mesmo tempo, muitas cores nas roupas. A arte é cheia de formas e detalhes, como se vê nas mandalas e na arquitetura. É uma espécie de barroco vitaminado.

A religião, então, é uma das mais complexas da humanidade. O hinduísmo contém uma quantidade impressionante de divindades e personagens míticos, acumulados ao longo de milhares de anos. E é interessante como há espaço no hinduísmo para todos os tipos de alinhamento, algo que a religiosidade maniqueísta ocidental não consegue entender, tanto que os cristãos costumam associar Shiva ao Diabo, uma vez que ele é o deus da morte.

Acontece que no hinduísmo existe esta contemplação heterogênea da realidade, como um molho filosófico agridoce, que mistura adoçantes e temperos picantes na mesma receita. Há espaço para deuses diversos, da morte e da criação, da castidade e da sensualidade.

Falando em comida, Índia e ecletismo, me veio a impressão que o ovo é o mais eclético dos alimentos. Nestas receitas indianas, quase tudo leva ovo. E já parou pra pensar como o ovo é capaz de se transformar de maneiras diversas, dependendo da forma como é preparado?

Um ovo pode ser cozido, frito, mexido, feito como omelete; pode misturar-se a carnes, pães e vegetais; pode ser componente essencial na receita de bolos, pães, doces e salgados; a simples clara pode ser transformada em glacê, em um creme; a gema é usada para dar liga a diversas receitas. 

Há algo de simbólico no ovo. É o início, a condensação da potencialidade de tudo o que pode surgir a partir dele. O ovo é a vida compactada em uma cápsula. É uma pílula de ser vivo.

Mas, enfim, estou devaneando...

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