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Miss Americana, uma breve biografia da Taylor Swift

Miss Americana (2020)

Não sou muito interessado em música pop e pouco conheço da discografia da Taylor Swift, mas estes dias vi esse documentário na Netflix e resolvi conferir.

É um rápido resumo da biografia da popstar e é de fato impressionante como sua carreira evoluiu rapidamente. Uma adolescente que começou cantando country de repente estava lotando estádios e acumulando premiações.

Taylor Swift in Miss Americana (2020)

O documentário mostra um pouco da rotina de criação dela, já que costuma compor as próprias músicas, e me chamou atenção um momento em particular, quando ela recebe um prêmio ainda no início de carreira e o Kanye West, que já era um figurão da indústria, subiu no palco só pra dizer que ela não merecia. Ali nascia a treta entre os dois que se estenderia até os dias de hoje. Foi uma grosseria da parte dele, convenhamos.

Claramente o filme também tem uma intenção de passar a imagem dela como uma boa moça, politicamente engajada, feminista, etc. Bom, se o objetivo era mostrar que ela é uma pessoa legal, creio que conseguiu, porque ela parece realmente tratar bem os fãs, um termômetro importante do tipo de índole que tem um artista.

Taylor Swift in Miss Americana (2020)

Magic in the Moonlight, uma comédia romântica vintage

Magic in the Moonlight (2014)

No final da década de 1920, um famoso ilusionista, Stanley (Colin Firth), é convidado por seu colega para visitar uma família que está sendo supostamente enganada por uma clarividente, Sophie (Emma Stone). 

Cético e conhecedor dos truques ilusionistas, Stanley diverte-se desmascarando místicos charlatães e aceita a proposta. Logo, porém, ele vai perceber que este caso é mais difícil e que Sophie parece mesmo muito convincente, além disso, irá se desenvolver um sentimento romântico entre os dois.

Emma Stone in Magic in the Moonlight (2014)

Woody Allen and Emma Stone in Magic in the Moonlight (2014)

Stanley é um homem muito racional e sarcástico, pessimista e esnobe, exibindo cultura com citações aleatórias de Nietzsche e outros pensadores. Mas os diálogos sobre o sentido da vida ou se há ou não magia no mundo são rasos e não saem do clichê. 

Enfim, é mais um daqueles contos românticos com a marca Woody Allen, que alguns vão amar e outros vão bocejar de tédio. De bônus, temos a Emma Stone em toda sua fofura vestida em tons pastéis.

Emma Stone in Magic in the Moonlight (2014)

Bruna Surfistinha, uma mistura de erotismo, drama e comédia

Bruna Surfistinha (2011)

O cinema brasileiro tem uma fama de ser muito erótico, o que remonta aos tempos da pornochanchada. O teor sexual de Bruna Surfistinha (2011), portanto, não foi nenhuma novidade. A diferença é que o filme tem uma abordagem mais dramática e intimista, afinal trata-se de uma biografia da autora, Raquel Pacheco.

O filme baseia-se no seu livro, O Doce Veneno do Escorpião (2005), em que relata como ela, uma garota de classe média, saiu da casa dos pais e foi parar numa prostíbulo, desenvolvendo a partir daí uma carreira cheia de altos e baixos, atendendo filas de homens no "vintão" ou fazendo programas de luxo em seu caro apartamento.

Deborah Secco in Bruna Surfistinha (2011)

O livro surgiu a partir de seu blog, onde contava as experiências com os clientes com um tom de humor, daí o apelido "Surfistinha", uma gíria hoje antiquada para as pessoas que "surfam" na internet. Talvez hoje se chamasse Bruna Blogueirinha.

Ao mesmo tempo em que acompanhamos a vida difícil e até trágica da garota, também nos deparamos com umas cenas cômicas envolvendo os clientes esquisitões, cada qual com suas estranhas e às vezes hilárias preferências sexuais.

Cássio Gabus and Deborah Secco in Bruna Surfistinha (2011)
Sugar daddy.

A Déborah Secco conseguiu salvar o filme e emprestar à personagem uma profundidade emocional. Ela é uma atriz experiente e não se prendeu ao mero papel de parecer sedutora. Há um ambiente dramático, melancólico no filme, até mesmo existencial.

Bruna Surfistinha (2011)

China vs EUA: Impérios em Guerra

China vs USA: Empires at War (2010)

Encontrei por acaso esse documentário no Amazon Prime. É de 2010 e continua mais atual do que nunca. Trata da verdadeira Guerra Fria do século XXI, a rivalidade entre as duas maiores potências da atualidade. De um lado, o portador do cinturão desde a década de 50, de outro o desafiante que está em uma corrida para tomar o seu lugar no protagonismo mundial.

É uma guerra que nunca foi declarada, mas que está bem evidente. Não é nenhum segredo. As duas nações, embora se relacionem como gentlemen fazendo negócios normalmente, vivem essa tensão tácita. O autor é Anthony Dufour. Encontrei ele no IMDb, mas este documentário não estava listado.

O Senhor das Armas e seus frasismos

Lord of War (2005)

Esta é a história de Yuri (Nicolas Cage), um imigrante ucraniano nos Estados Unidos que descobre uma oportunidade de negócios na venda ilegal de armas.

A trama começa pelo fim, com o personagem na última cena, a partir da qual recorda o passado, como cresceu no negócio por causa da Guerra Fria nos anos 80, como sua vida familiar foi prejudicada e as decisões que tomou que o levaram ao ponto em que estava.

Lord of War (2005)

O filme é curiosamente sincero em expor de forma tão simples um fato da indústria de armas: que guerras podem ser mantidas simplesmente por causa da lucratividade em termos de venda de armamentos e que militares corruptos podem desviar suas armas usadas para o contrabando.

Nicolas Cage é um ator às vezes fleumático, sem expressões. E quando ousa fazer expressões, parece caricato. Certos personagens combinam com este jeito dele e Yuri Orlov é um exemplo. Um homem indiferente, preocupado apenas em fazer algo que dê sentido à sua vida, frio o bastante para não se incomodar com as consequências de seu trabalho, pois vende armas que serão usadas para matar civis, inocentes, crianças. Detalhe também para a participação do músico Jared Leto, como irmão de Yuri, Vitaly.

Nicolas Cage and Jared Leto in Lord of War (2005)
Mais que manos, brothers.

Nicolas Cage and Jared Leto in Lord of War (2005)

Nicolas Cage and Jared Leto in Lord of War (2005)

Yuri faz narrações ao longo da história, soltando algumas frases curiosas. Aliás, o que torna este filme memorável é justamente o frasismo do personagem. Algumas pérolas:

"Existem 550 milhões de armas em circulação no mundo. Isso é uma arma para cada doze pessoas. O único problema é: Como armar as outras onze?".

"Eu tinha fugido da violência a minha vida toda, enquanto eu devia ter ido em direção a ela".

"O maior traficante de armas do mundo é o seu chefe. O atual presidente dos Estados Unidos da América".

"Eu não quero ser lembrado por nada. Se estou sendo lembrado, significa que estou morto".

"Existem dois tipos de tragédia na vida. Uma é não conseguir o que você quer, a outra é consegui-lo".

"Eles dizem que 'O mal prevalece quando homens bons não agem', mas o que eles deveriam dizer é: 'O mal prevalece'".

"Sabe quem herdará a terra? Negociantes de armas. Porque todos os demais estão ocupados matando uns aos outros".

Nicolas Cage in Lord of War (2005)

A Trilogia Distrito 9

District 9 (2009)

Em 2009 Neill Blomkamp chamou atenção com uma curiosa distopia sci-fi com uma estética bem decadente: Distrito 9. A partir daí ele inaugurava uma série de filmes que seguiriam o mesmo estilo, de modo que, mesmo sendo três histórias bem distintas, pode-se agrupá-las numa espécie de trilogia estética, a Trilogia Distrito 9.

Em Distrito 9 (2009), o planeta é visitado por uma nave com alienígenas que pedem ajuda para se abrigarem aqui, como se fossem refugiados. A história se passa numa época bem contemporânea e o mundo não está em condições de ajudar estes imigrantes espaciais, de modo que são alocados em um assentamento de forma precária. Pela primeira vez vemos em um filme de "invasão" alienígena os aliens morando em uma verdadeira favela.

Claramente essa história tem uma intenção alegórica de ilustrar uma crise de imigrantes e a forma pouco humanitária com que os governos podem tratar estas pessoas que procuram ajuda.

District 9 (2009)

District 9 (2009)
Favela alienígena.

Em 2013 Blomkamp retorna à sua fórmula (miséria, sci-fi e crítica social) com Elysium (resenha aqui). Desta vez a trama se passa em um futuro mais distante, em 2154, quando já há tecnologias avançadíssimas, como uma máquina de cura e rejuvenescimento instantâneo e literalmente uma cidade flutuando na órbita da Terra.

Só que, em contraste com a condição utópica dessa cidade celestial, habitada apenas pelos mais ricos da Terra, o planeta se encontra em total miséria, evidenciando uma divisão da humanidade em duas castas: os super ricos que moram em Elysium e os bilhões de pobres do planeta. 

Chappie (2015)

Chappie (2015)

Por fim, em Chappie (2015), é concluída essa trilogia de Blomkamp. Agora a história acontece num futuro aparentemente mais avançado do que o de Distrito 9, porém anterior a Elysium. Em vez de aliens e uma cidade espacial, temos o foco voltado para o desenvolvimento da robótica.

Robôs com uma avançada inteligência artificial estão começando a ser usados como policiais e eis que um deles acaba desenvolvendo consciência, a tão prometida "singularidade" que é um tema já bem abordado na ficção científica. O que chama atenção neste filme é a presença da dupla Yo-Landi e Ninja, da banda Die Antwoord, que atuam como protagonistas. 

Yo-Landi in Chappie (2015)

Chappie (2015)

Além da singularidade, o longa também acaba abordando o tema da "transferência mental", ou seja, a possibilidade de se transferir não só as informações do cérebro como a própria consciência de uma pessoa para um meio artificial, um cérebro eletrônico.

Tendo em comum o visual sujo e decadente e a temática social, os três filmes contam com um detalhe que também se repete: o design dos robôs. Os robôs policiais de Elysium são bem parecidos com o Chappie.

Já no Distrito 9 essa tecnologia ainda não existia, mas vemos uns protótipos robóticos que são ainda operados por um usuário humano. Só que tem um alienzinho que se torna amigo do protagonista que me parece bem parecido com o Chappie nos trejeitos e na personalidade meio infantil.

A seguir vemos uma comparação do alien de Distrito 9 com o Chappie e os robôs de Elysium:

District 9 (2009)

Chappie (2015)

Elysium (2013)

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A miséria e distopia de Elysium

Elysium (2013)

Neil Blomkamp é um cineasta sul-africano que se destacou escrevendo e dirigindo o filme Distrito 9 (2009) e em Elysium ele retorna com uma estética semelhante. Em ambos os filmes, temos uma distopia futurista, retratando um mundo decadente, com uma explosão de pobreza e de classes marginalizadas.

Em Distrito 9, entre as vítimas de marginalização, está uma população alienígena que fortuitamente foi parar na Terra, tendo que viver em guetos e sofrer preconceitos e miséria. Em Elysium, todos os habitantes da Terra se tornam marginais, pois, diante da poluição e degradação das cidades, os mais ricos se refugiam numa nova nação construída em uma imensa estrutura espacial, a Elysium.

Elysium (2013)

O próprio nome remonta ao "paraíso" da mitologia grega, os Campos Elísios, onde viviam heróis e deuses em condição privilegiada. Da mesma forma, no filme os humanos que vivem lá gozam de fartura e acesso às melhores tecnologias, especialmente uma plataforma capaz de automaticamente realizar diagnósticos e tratamentos médicos avançadíssimos, garantindo uma longevidade e saúde perpétua aos seus usuários.

Na Terra, os humanos vivem na miséria, no subemprego e tendo acesso a tecnologia sucateada. Ocasionalmente, alguns rebeldes tentam chegar até a cidade celestial em investidas suicidas, mas os rumos de toda essa civilização dividida em duas castas vão mudar por causa da intervenção heroica de Max (Matt Damon), um pobre e renegado habitante da Terra que se vê envolvido num plano de roubo de dados, invasão e golpe de Estado em Elysium.

Elysium (2013)

Como ficção científica, o filme pode revelar algumas incoerências. Por exemplo, Elysium tem uma tecnologia fabulosa de cura e reconstrução do corpo humano, mas não tem um sistema eficiente de segurança, tanto que foi tomado de assalto por um punhado de pessoas.

Também é estranho ver que ainda usam monitores e teclados para operar computadores, uma vez que tudo isto poderia ser feito por uma interface holográfica ou dentro da própria mente, sem necessidade de periféricos. Afinal, já hoje estamos perto de tecnologias deste tipo, algo mais "telepático".

A forma como essa plataforma espacial possui uma atmosfera também é inverossímil. Não existe nenhuma redoma cobrindo a plataforma (o que se nota quando as naves adentram em sua atmosfera sem qualquer barreira). Como um objeto deste tamanho consegue reter o ar de sua atmosfera, uma vez que ele sofre o efeito de diversas forças de repulsão (vento solar, gravidade da Terra, o vácuo do espaço)? Não creio que a microgravidade artificial seja suficiente pra segurar assim o seu próprio ar.

Elysium (2013)

Mas, enfim, o próprio Blomkamp deixou claro em entrevista que não tinha intenção de produzir ficção científica ou grandes previsões futuristas. Ele diz que Elysium é sobre o hoje e o agora. De fato, é comum em distopias, apesar de falarem de um suposto futuro, haver a intenção de denunciar o presente. Distrito 9 também foi assim.

Elysium visivelmente critica a política rigorosa contra imigrantes nos Estados Unidos, a segregação da humanidade em classes muito ricas e muito pobres, separadas por um abismo imenso em termos de acesso a tecnologia, cuidados médicos e recursos.

Elysium (2013)

Sendo assim, não é um grande filme de ação; não é um filme para se ver lutas impressionantes envolvendo armas futuristas e explosões. A trama também é relativamente simples e tem um final muito brusco, muito simplificado como se tudo encontrasse uma solução rápida e fácil, ao estilo deus ex machina.

É bom mencionar também a participação de dois atores brasileiros, Alice Braga e Wagner Moura, que interpretam dois dos personagens principais da trama. Também no grande elenco está a atriz Jodie Foster e William Fichtner.

Wagner Moura and Matt Damon in Elysium (2013)

Falando em brasileiros, um detalhe curioso é a forma como as nacionalidades se dividem entre os dois mundos, o de cima e o de baixo. Em Elysium, vemos a personagem de Jodie Foster (Delacourt) falando francês; um dos empresários tem sobrenome britânico (Carlyle) e o presidente tem sobrenome indiano (Patel).

De certa forma, eles representam as nações poderosas de hoje, especialmente na Europa e entre os Tigres Asiáticos. Na Terra, por sua vez, a língua predominante é o espanhol, representando os povos latinos, e há atores latinos como a já mencionada dupla brasileira.

Elysium (2013)

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I, Frankenstein, uma versão steampunk do clássico

I, Frankenstein (2014)

O filme I, Frankenstein (2014), no Brasil traduzido como Frankenstein, Entre Anjos e Demônios, baseado na graphic novel homônima de Kevin Grevioux, é uma das poucas adaptações em que o monstro clássico da autora Mary Shelley ganha um nome, neste caso, Adam (Aaron Eckhart). 

É comum o monstro ser chamado de Frankenstein, mas lembremos que este é o nome original do cientista que o criou e a criatura é simplesmente um ser sem nome, o que enfatiza sua existência desumanizada.

Aqui a mitologia de Frankenstein é recriada num novo estilo steampunk, ambientada num mundo em que seres demoníacos ambicionam dominar a humanidade, mas são enfrentados por criaturas celestiais enviadas pelo arcanjo Miguel, os gárgulas. 

Apesar da ideia inovadora, o filme não agradou à crítica, e com razão, pois a trama é rasa e os personagens desinteressantes. Os demônios, por exemplo, sequer parecem ameaçadores e facilmente se desfazem em chamas com meros golpes de armas sagradas. Até os zumbis de The Walking Dead assustam mais do que estes demônios aí, viu.

A princípio pensei até que se tratasse de uma produção da Universal Pictures, de modo que faria parte do monsterverse deste studio, assim como o tosco Dracula Untold (resenha aqui), mas na verdade quem produziu foi o studio indie Lakeshore Entertainment.

I, Frankenstein (2014)


Jupiter Ascending, o grande fiasco das Wachowski

Jupiter Ascending (2015)

Jupiter Ascending (2015)

Os irmãos Wachowski (que depois se tornaram "irmãs") me conquistaram na trilogia Matrix. Até hoje acho que foi a melhor trilogia do século 20, a melhor ficção científica e distopia até então. Os Wachowski se tornaram meus ídolos.

Então veio Cloud Atlas (2012), que não teve o mesmo sucesso nem o mesmo impacto visual, mas também achei uma grande história. Grande demais até. Achei fantástica a ideia de várias histórias paralelas, separadas por séculos e bem interligadas. Foi um roteiro brilhante, embora o resultado na tela seja um pouquinho cansativo. 

Mas tudo bem, é importante ter em mente que Cloud Atlas deve ser visto como um drama, diferente de Matrix que tinha muita ação e kung fu e carros explodindo e ainda assim também usou um roteiro complexo. Matrix foi pop-cult. Cloud Atlas foi apenas cult.

Jupiter Ascending (2015)

Jupiter Ascending (2015)

Quando vi o trailer de Jupiter Ascending em 2014, fiquei bastante empolgado. Imaginei que seria como Matrix, uma distopia retratando um império tecnológico, só que agora muito maior, cósmico. Prometia ser uma space opera épica, um Star Wars com o tom freak das Wachowski... Mas quando assisti bocejei algumas vezes.

O roteiro na verdade mantém a qualidade da dupla, uma história cheia de imaginação e criando uma mitologia própria. Neste caso, a mitologia de que o universo é dominado por uma poderosa dinastia, como uma mega empresa, que semeia humanos nos planetas como se criasse gado para o abate. 

A ideia é mesmo interessante. E ainda aproveitaram para fazer referência a vários mitos nossos, como os vampiros, os reptilianos, os aliens grey, os crop circles... O problema foi a dinâmica do filme. A premissa é boa, mas não a execução. 

Jupiter Ascending (2015)

Tá certo que tinha todo o pacote básico de um filme atraente. Muitas cenas de perseguição e luta, muitas explosões, muitos efeitos especiais mostrando naves gigantescas e planetas. Talvez por isso tenha ficado clichê demais e não surpreendeu.

Tenho impressão que tanto Cloud Atlas quanto Jupiter Ascending ficariam ótimos no formato de série, pois são histórias com muito conteúdo em potencial, que podem ser alongadas e contadas confortavelmente em vários episódios, mas no filme são comprimidas em cerca de duas horas, o que é um dos motivos para a trama ter sido mal desenvolvida.

E alguns detalhes "técnicos" me incomodaram. Se aquela civilização alienígena era tão avançada, por que precisavam extrair material genético dos humanos para criar uma espécie de fonte da juventude? Ok, foi uma forma criativa de remontar ao mito da fonte da juventude, mas eu não conseguia parar de pensar que seria muito mais fácil desenvolver uma engenharia genética que tornasse os corpos deles capazes de se regenerar e viver por milênios sem essa necessidade de tomar um banho de DNA humano. Imagina a logística necessária pra fazer a tal colheita. Tudo isso para encher uns potinhos com suco de gente a fim de manter os aliens da elite saudáveis.

Jupiter Ascending (2015)

Jupiter Ascending (2015)

Aliás, esse tema da colheita humana parece ser uma marca das Wachowski: em Matrix os humanos são cultivados para gerar energia, em Cloud Atlas existem clones que se alimentam de outros clones "reciclados" e agora temos esta colheita cósmica.

Tá eu sei que estes detalhes estão cheios de analogia, inclusive num diálogo o magnata alien Balem fala sobre a pirâmide do poder. Desde Matrix que o assunto da opressão é abordado. Opressão de um governo ditador (Cloud Atlas), de um sistema de controle das mentes (Matrix), de uma corporação capitalista (Jupiter Ascending). Esse lado alegórico dos filmes das Wachowski é muito valioso e é um dos grandes méritos delas. Isso eu não vou negar.

Mila Kunis in Jupiter Ascending (2015)

Outro mérito de Jupiter Ascending é que finalmente temos uma protagonista feminina, maaas... ela não é ainda devidamente independente. Raros são os casos de mulheres à frente de uma história heroica. E neste caso, Jupiter tem um papel bastante passivo. Ela é herdeira do império, mas não é guerreira. Seu papel resume-se a ser perseguida e quem luta por ela são os dois machões, Wise e Stinger (spoiler: o Sean Bean não morre nesse filme). 

De certa forma, Jupiter Ascending parece até uma daquelas novelas eróticas genéricas que sempre têm um machão sem camisa na capa do livro, abraçado com a garota sonhadora com a qual o público leitor deve se identificar. Sabe a Bella, de Crepúsculo, com o lobisomem Jacob? É bem isso a relação de Jupiter e o seu guarda costas que também é uma espécie de homem-lobo alienígena.

Até a trama pode ser resumida como um conto erótico clichê: a garota pobre é visitada por um machão vindo do espaço que revela que ela é a rainha do universo e a protege de uns caras maus. Depois ela vai se casar com o príncipe do universo, mas o machão interrompe a cerimônia, ela monta nas costas dele e vão embora.

Mila Kunis in Jupiter Ascending (2015)
Mila Kunis como sempre linda.

Curiosidades
:

Natalie Portman foi chamada para o papel da protagonista, mas recusou. É o segundo filme das Wachowski que ela recusa, o primeiro foi Cloud Atlas. Em seu lugar entrou Mila Kunis, que se destacara contracenando com Natalie Portman em Cisne Negro (2010).

O complexo roteiro do filme contém mais de 600 páginas.

Jupiter Ascending (2015)

A Quiet Place, os aliens com misofonia

A Quiet Place (2018)

John Krasinski é mais conhecido por sua participação na comédia The Office (2005-2013). Quem imaginaria então que ele um dia iria dirigir e atuar em um filme de terror? Eis que surge A Quiet Place (2018).

O filme é um daqueles casos de terror baixo orçamento que fez muito sucesso e dinheiro, como A Bruxa de Blair (1999), que teve orçamento de 60 mil dólares e arrecadou 250 milhões, e Atividade Paranormal (2007-2015), cujo primeiro filme foi feito com míseros 15 mil dólares e acabou rendendo uma franquia de seis filmes que juntos somam cerca de 900 milhões. 

A Quiet Place (2018)

Isso mesmo, um filme indie que custou 15 mil para seus criadores se tornou uma franquia bilionária (afinal tem mais um filme programado para 2021, quando então vão chegar à marca do bilhão em seu histórico de lucro)! 

A Quiet Place na verdade não foi assim tão modesto, pois teve um orçamento de cerca de 20 milhões (o que hoje em dia é um custo médio para qualquer filme hollywoodiano), mas a sua lucratividade foi expressiva, rendendo 350 milhões.

A Quiet Place (2018)

A Quiet Place (2018)

A Quiet Place (2018)

Krasinski foi o faz-tudo do filme. Dirigindo e atuando, também participou da equipe de roteiristas. Ele está totalmente transformado em relação ao rapaz bobinho de The Office. Agora é um pai preocupado em manter sua família segura num mundo apocalíptico. Barbudo e com um olhar assustado, ele conseguiu imprimir carga dramática ao personagem.

A premissa é bem original. O mundo foi invadido por umas criaturas monstruosas que são hostis a qualquer tipo de ruído e atacam quem os produz. Pois é, são aliens com misofonia, aversão a barulho. Confesso até que me identifiquei com os bichos nesse aspecto. Um mundo mais silencioso seria um paraíso pra mim.

A Quiet Place (2018)
Só digo uma coisa: que guria chata!

Mas enfim, o fato é que a vida dos humanos se tornou uma prisão a céu aberto e todos têm de viver da forma mais silenciosa possível, se comunicando por sinais, andando como a pisar em ovos. Quando acidentalmente derrubam um objeto, são tomados pelo pavor de serem atacados pelos monstros.

Os momentos mais tensos estão nas mãos (e nos pés) da Emily Blunt, como na cena em que ela pisa em um prego e tem que segurar o grito e quando entra em trabalho de parto com um monstro espreitando bem ao lado. Também é ela que pela primeira vez consegue matar um monstro.

Já existe uma continuação de A Quiet Place em produção e em 2019 a Netflix também kibou descaradamente a premissa no filmezinho meia-boca The Silence (resenha aqui).

A Quiet Place (2018)