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As egrégoras modernas em Branded

Branded (2012)

Quando criança, Misha é atingido por um raio, mas sobrevive. Adquire um poder sobrenatural de ver no céu uma constelação em forma de vaca e até ouvir sua voz. Isto aparentemente não faz diferença alguma. 

Quando adulto, ele descobre seu talento para o marketing e envolve-se nesta carreira, tornando-se um premiado empresário de uma agência publicitária. Todavia, ele passa por um momento de crise e se recolhe numa fazenda, tornando-se criador de vacas.

Enfim seu “poder sobrenatural” retorna. Após um momento de isolamento, de ascetismo e de purificação das culpas (pois a carreira publicitária também o levou a prejudicar pessoas), ele volta a ouvir a constelação da vaca que lhe orienta a praticar um ritual ancestral de sacrifício. É aí que o filme começa a ficar bizarro.

Ele sacrifica uma vaca vermelha, com direito a altar e pira funerária. Banha-se com as cinzas da vaca e, ao voltar pra cidade, descobre que tem o poder de ver estranhas criaturas parasitando as pessoas. São as marcas comerciais. 

Ele irá entender que as marcas são uma espécie de doença mística, quase como demônios ou parasitas espirituais que se apoderam das pessoas e as obrigam a consumir produtos.

Isto é uma visão totalmente nova acerca do funcionamento do mercado e da propaganda. Misha acreditava que o criador do marketing fora Lenin, com todo o aparato propagandístico que usou pra vender a ideia do comunismo (a cor vermelha, a estrela, a promessa de felicidade...). Ele sempre acreditou que o sucesso do marketing dependia exclusivamente de técnica, de usar os artifícios certos.

Sua clarividência revela esta nova e revolucionária verdade: a vontade das pessoas pode ser controlada não por técnica publicitária, mas por forças ocultas, invisíveis, sobrenaturais. E estas entidades se tornam mais fortes quanto mais popular se torna uma marca.

Agora Misha, conhecendo o grande segredo, irá travar uma batalha mitológica, criando entidades para combater as entidades do mercado que encheram a população de hábitos não saudáveis e viciados.

A ideia de uma entidade criada e alimentada pelo pensamento das pessoas não é exclusiva do filme. Na teosofia, desenvolvida no século XIX, fala-se em “formas pensamento” e em “egrégoras”. São seres produzidos pela mente humana e mesmo pela coletividade. Décadas depois o psicanalista Jung iria desenvolver uma teoria semelhante acerca do inconsciente coletivo. 

Sem contar que todas estas ideias podem remontar a Platão, que via uma segunda realidade além do mundo físico, o mundo das ideias. Na verdade, seria esta a primeira realidade e o nosso mundo material seria apenas uma criação posterior.

Curiosamente, o episódio 134 dos Simpsons, exibido em outubro de 1995 por ocasião do Halloween, aborda uma história em que as marcas de produtos ganharam vida, aterrorizando as pessoas.

Branded é um filme genial e pouco compreendido, pois ganhou pouca repercussão. É altamente recomendado para interessados em publicidade e marketing, e, claro, para estudiosos de gnosticismo e filosofias neoplatônicas. Além disso, é um tipo diferente de distopia onde a decadência da sociedade se dá pelo domínio das marcas sobre a vontade das pessoas.

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