É bizarro pensar que já presenciamos o desenvolvimento de algo tão futurista quanto o útero artificial¹. Já não há obstáculos tecnológicos para a concretização deste conceito. Por outro lado, a normalização da tecnologia enfrentará obstáculos ao longo das próximas décadas.
É de se esperar que a princípio haja uma resistência cultural de boa parte da população, seja pela simples estranheza com algo tão disruptivo, seja por motivos morais e religiosos. Pessoas vão alegar que isso é brincar de Deus, é antinatural, uma afronta à criação, até mesmo algo satânico, por roubar da mulher o seu dom sagrado da gestação.
Por quanto tempo haverá esta resistência, é difícil prever. Todavia, o que a história mostra é que mesmo os grupos religiosos mais dogmáticos acabam se rendendo às novas tecnologias e aceitando a sua normalização. Há exceções, como no caso das Testemunhas de Jeová que jamais cederam à tecnologia de transfusão de sangue. Assim sempre haverá grupos mais fechados que vão rejeitar algo tão estranho como o útero artificial.
De toda forma, no geral a teologia irá se adaptar a esse novo conceito. É dito que "teologia é escrita a lápis", justamente porque com o progresso humano certas visões de mundo têm de mudar e a teologia não pode ficar pra trás.
Haverá, por outro lado, também uma resistência psicológica por parte da sociedade. Não por motivos religiosos ou ideológicos, mas sentimentais, afetivos, até mesmo psicossomáticos. Isto deverá sem mais frequente nas mulheres.
Ora, desde sempre os homens estão habituados a viver sem a experiência física da gestação. Podem ter a experiência psicológica de saber que sua prole está sendo gerada; há até culturas indígenas onde os homens ficam de resguardo após o parto da gestante.
O fato é que nenhum homem sabe realmente como é estar grávido pelo óbvio motivo de que ele não possui a estrutura fisiológica que permita esta experiência. Logo, para os homens em geral, ser privado da gestação não é um incômodo. Já nasceram com esta limitação e vivem acostumados a ela.
A mulher, por outro lado, cresce se dando conta de que ela tem este poder, este dom, esta possibilidade de abrigar um bebê no ventre. O simples fato de saber disto influencia a visão de mundo feminina de um modo diferente da masculina. A mulher tem sua vida sexual marcada pela preocupação ou expectativa com a gravidez de uma forma bem mais intensa que o homem, afinal é ela quem vai levar o bebê dentro de si por vários meses.
Para algumas mulheres esta possibilidade é assustadora, mas para outras é uma experiência desejável e única. Muitas mulheres sonham em engravidar e, a despeito dos fardos desta condição, sentem-se satisfeitas e realizadas com a experiência da gestação.
Sendo assim, para os homens em geral será bem mais fácil aceitar a tecnologia do útero artificial, já que a gravidez nunca foi algo que eles esperassem vivenciar. Já entre as mulheres, haverá aquelas que querem usufruir da gravidez como um direito natural e não irão ceder este privilégio a uma máquina.
Por outro lado, existem mulheres que têm pavor da gestação, seja pelos riscos envolvidos, seja pela alteração do corpo, da rotina, até mesmo da aparência. Estas sentir-se-ão aliviadas em poder delegar a tarefa da gravidez a um útero artificial.
A princípio é certo que a maior parte das pessoas que irão recorrer ao útero artificial serão aquelas incapazes de optar pelos meios naturais, casais inférteis ou com qualquer limitação fisiológica. Nestes casos, a máquina será a solução de um problema.
Notas:
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