As novas tecnologias sempre visam aprimorar e facilitar o trabalho humano, realizando tarefas com menos tempo e menos esforço. Logo, é natural que a tecnologia reduza a quantidade de pessoas necessárias para fazer uma tarefa.
As máquinas e a automação preocupam pessoas já há séculos. Em 1811, o movimento ludista na Inglaterra realizou protestos quebrando máquinas justamente pelo fato delas estarem tomando o emprego das pessoas. Já havia naquela época o temor apocalíptico de que as máquinas iam acabar de vez com os empregos humanos.
Duzentos anos se passaram desde o movimento ludista e até hoje ainda há bastante emprego para todo mundo que quiser um e se dedicar a ter a qualificação mínima para tal. Mesmo com todo o avanço tecnológico, o trabalho humano não foi extinto, apenas se modificou ao longo do tempo.
De fato, na nossa era atual existem mais opções de emprego do que nunca e boa parte disto surgiu graças à tecnologia. Antes da revolução industrial, as opções de carreira para as pessoas eram bem mais limitadas. A tecnologia criou inúmeras novas áreas, novas especializações. Com a internet então, as opções explodiram.
Quantas pessoas hoje em dia fazem dinheiro de alguma forma por meio da internet? A internet criou um mundo de novas possibilidades de emprego e renda que simplesmente não existiam e eram impensáveis no século XIX.
E estamos só começando, pois o mundo virtual está crescendo exponencialmente ano após ano, de modo que estamos criando uma espécie de planeta paralelo, o ciberespaço ou metaverso, onde muito provavelmente boa parte das pessoas vão trabalhar num futuro próximo, enquanto as máquinas se ocupam com as tarefas mais materiais aqui no mundo físico.
Tradicionalmente se entende que um trabalho é feito por dois elementos fundamentais: os meios de produção e a mão de obra. Para pintar uma casa, é preciso tinta e pincel (os meios de produção) e uma pessoa que manipule estes objetos (o pintor com sua mão de obra).
Acontece que estamos prestes a presenciar o surgimento de uma nova classe de trabalhadores, robôs humanoides como o Atlas da Boston Dynamics ou o Optimus da Tesla. Em um futuro próximo eles serão aptos a substituir humanos em inúmeras tarefas, praticamente qualquer tarefa que exija contato físico: faxineiros, encanadores, jardineiros, trabalhos com carga e descarga, atendentes de escritórios, caixas de supermercado, cuidadores de idosos, até mesmo cirurgiões um dia serão robóticos.
Quando isto acontecer, será a fusão do meio de produção com a mão de obra, pois um robô é ambos. O robô é como um martelo, uma ferramenta, só que não precisa de uma mão humana. É um martelo que tem vida própria, como os objetos animados na casa do Mickey no filme Fantasia (1940).
Será desta vez que o trabalho humano acabará de vez? Não mesmo.
Primeiro, há um paradoxo nesta questão da automação. Sim, os robôs um dia vão ser capazes de tomar o emprego dos humanos, mas se os humanos ficarem todos desempregados e sem renda, não vão poder comprar os produtos ou serviços fornecidos pelos robôs. Essa conta não fecha. Ora, de que adianta uma padaria funcionar com robôs padeiros, fazendo pães e bolos, se os humanos desempregados serão pobres e incapazes de comprar os pães? Esta padaria simplesmente vai falir.
Para que a automação aconteça, será preciso que também se desenvolva uma maneira dos humanos continuarem gerando renda, fazendo a roda do capitalismo girar. Não adianta de nada robôs produzirem coisas que ninguém poderá comprar. Este tipo de automação entraria rapidamente em colapso.
Como, porém, já mencionamos acima, a coisa pode não ser tão catastrófica assim, uma vez que o metaverso vai criar uma abundância de empregos para os humanos. O trabalho físico será em sua maioria realizado por robôs, mas também trabalhos intelectuais serão feitos pela IA. A IA estará em toda parte, até mesmo na arte. Mas não subestimemos a criatividade humana. O metaverso terá uma variedade gigantesca de atividades, de modo que vai ter ocupação pra todo mundo, máquinas e humanos.
Uma curiosa e futurista possibilidade é que os humanos passem a produzir e possuir um tipo peculiar de moeda: energia. Energia é algo que os robôs precisam para trabalhar, de modo que uma maneira das pessoas comprarem aquilo que é produzido pelos robôs seria por meio de algum tipo de "crédito de energia".
No segundo episódio de Black Mirror, intitulado Fifteen Million Merits, vemos um mundo onde as pessoas ganham créditos literalmente pedalando em bicicletas. Não é explicado em detalhes que diabos de trabalho é esse, mas é de se supor que eles estão gerando energia ao pedalar e em troca são pagos por esta atividade.
Este futuro, porém, parece improvável, uma vez que estamos cada vez mais perto de desenvolver fontes de energia revolucionárias, como a fusão nuclear. Este método tornará a geração de energia extremamente abundante e barata, de modo que as máquinas não precisarão de humanos pedalando para alimentá-las.
Há ainda uma esperança para os humanos. Sim, os robôs vão varrer a casa, cortar a grama, fazer as comprar no mercado, fazer entregas, etc. Mas alguém será dono dos robôs, o que inclui empresas, mas também indivíduos.
Digamos que, por exemplo, você compre um robô ou, fazendo um pé de meia, compre uma pequena equipe de robôs. Você pode alugar estes robôs, fazer que eles trabalhem pra você, de modo que a renda que eles gerarem será sua e você terá apenas o custo da manutenção de seus robôs que, no fim das contas, são os meios de produção.
Olhando desta forma, o robô não necessariamente vai tomar seu emprego, mas vai trabalhar no seu lugar. Um mestre de obras humano pode ter uma equipe de robôs sob seu comando. Você pode empregar seu robô, ou robôs, como faxineiro na casa de alguém.
Esta é a mesma lógica do transporte urbano. Por que existem táxis, ônibus, uber, mototáxis? Por que uma pessoa que tem um veículo está disponibilizando ele para transportar as que não têm. Assim, nem todo mundo vai ter um robô doméstico, mas muitos vão contratar os serviços de um robô doméstico.
Este é apenas um exemplo simplório de como os robôs poderão funcionar como fonte de renda para pessoas comuns. E uma vez que os robôs vão trabalhar por você e pra você, é possível que tenhamos uma interessante era de ócio que será extremamente benéfica para algumas pessoas, para as que sabem usar o ócio de maneira construtiva. As atividades mentais, a especulação filosófica, artística e até mística, podem experimentar uma nova renascença.
Ou podemos nos tornar o mundo de Wall-E.
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