Em 2015, o radialista Joe Gelonesi¹ escreveu um artigo expressando uma interpretação perturbadora da realidade das famílias na sociedade. Ele cita a proposta de Platão, de uma sociedade em que as crianças são criadas pelo estado, e também os filósofos contemporâneos Adam Swift e Harry Brighouse.
Ele diz que os pais que são atenciosos com seus filhos, por exemplo, tendo um momento com eles para ler uma história de ninar, deveriam ocasionalmente pensar em como, com este hábito, estão dando a estas crianças uma vantagem em relação àquelas que não têm uma família saudável. O que ele pretende com isto? Implantar um sentimento de culpa? Os pais amorosos devem pedir desculpas à sociedade porque estão preparando seus filhos melhor que os pais abusivos?
"I don’t think parents reading their children bedtime stories should constantly have in their minds the way that they are unfairly disadvantaging other people’s children, but I think they should have that thought occasionally."
Argumenta que as condições econômicas influenciam na desigualdade de oportunidades, pois uma família com mais recursos pode pagar escolas mais caras e aulas de reforço, o que faz sentido, mas também inclui outro elemento: crianças com uma família funcional, que recebem carinho, que têm um bom convívio no lar, se tornarão adultos mais preparados para a vida em sociedade do que aquelas que foram privadas disto. Não há como negar esta constatação.
A bizarrice começa quando o artigo propõe uma solução para o problema da desigualdade. Segundo Swift, uma proposta é abolir a família. Isso mesmo. Já que há tanta diferença nos ambientes familiares, uns saudáveis, outros abusivos, então uma maneira de planificar as condições das pessoas é remover este fator da equação. Que gênio!
"One way philosophers might think about solving the social justice problem would be by simply abolishing the family. If the family is this source of unfairness in society then it looks plausible to think that if we abolished the family there would be a more level playing field."
Ele chega a argumentar com um tom de petulância e sugerindo a intervenção estatal nos mínimos detalhes da vida familiar. Basicamente diz que o estado não deveria "permitir" que as famílias fossem muito atenciosas e carinhosas, pois isto criaria filhos com vantagem em relação a outras pessoas que não tiveram a mesma sorte.
"What we realised we needed was a way of thinking about what it was we wanted to allow parents to do for their children, and what it was that we didn’t need to allow parents to do for their children, if allowing those activities would create unfairnesses for other people’s children".
Swift constata que ter um ambiente familiar saudável é mais decisivo para o futuro da criança do que estudar em uma escola particular. No shit, Sherlock.
"The evidence shows that the difference between those who get bedtime stories and those who don’t—the difference in their life chances—is bigger than the difference between those who get elite private schooling and those that don’t,’."
Eu sei por experiência própria o que é ter crescido em uma família disfuncional e abusiva, conheço muito bem os danos que este tipo de infância causam, o peso que põe sobre nossas costas, tornando tudo mais difícil na vida. Olhando para meu passado, posso identificar decisões erradas que tomei ou obstáculos que enfrentei com dificuldade e que eu teria lidado de uma forma bem diferente se tivesse recebido uma nutrição afetiva mais saudável. Todos aqueles que viveram em um lar problemático entendem este sentimento.
No entanto, não tenho este sentimento de inveja para com aqueles que desfrutaram da bênção de uma família funcional. Esta inveja impregna a mentalidade daqueles que querem planificar a sociedade e, se possível, até a natureza, a fim de igualar todos e igualar por baixo. É uma obsessão por uniformidades, eliminando da equação humana toda a diversidade de condições, experiências e características. Querem transformar a humanidade em uma linha de produção, produzindo humanos todos iguais, feitos na mesma forma.
A natureza abomina a simplicidade. Ela se ramifica sempre em busca do complexo, da riqueza e variedade e para isto submete todas as criaturas a diferentes condições, cada qual com suas vantagens e desvantagens. Como seres conscientes, nós temos a capacidade de questionar e intervir na natureza, mas até certo ponto. O desejo de igualdade é como o desejo de liberdade, ambos têm limites, pois a versão absoluta disto e daquilo seria a pura aniquilação.
Imagine se algum destes utópicos extremistas ganhasse o poder divino para moldar o universo. Ele reduziria toda a natureza, todos os seres, planetas e seres vivos a um grande mar feito puramente de hidrogênio, todos iguais na sua simplicidade, todos feitos de apenas 1 próton e 1 nêutron.
Notas:
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