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Vamos mesmo precisar morar em Marte?

Mars Colony Builder

Existe no imaginário popular uma noção vaga de que "estamos destruindo o planeta e um dia vamos precisar nos mudar para outro". Fala-se em aquecimento global, poluição, produção de lixo, desperdício de água, etc. A verdade, porém, é que nada destas ações humanas, por mais predatórias que sejam, é capaz de tornar a Terra tão inabitável a ponto de ser mais fácil e prático nos mudarmos daqui.

Para entender a questão, é preciso ter uma noção de quão hostis são os planetas e satélites à nossa volta. Mesmo que a Terra se torne intensamente poluída pela atividade humana, mesmo que sujássemos todo o ar e os oceanos, ainda assim a Terra continuaria mais habitável do que qualquer outro lugar do sistema solar.

O motivo é simples: nós estamos na região mais apropriada para a vida humana e animal. Vênus e Mercúrio estão muito perto do Sol, sofrendo não apenas com o calor excessivo, mas também com um vento solar poderoso, uma dose maior de eletromagnetismo e radiação.

Marte ainda está próximo da zona habitável, mas não tão favorável quanto a Terra. De Júpiter até Plutão e além, é frio demais, sem contar que Júpiter, Saturno, Urano e Netuno são monstros gasosos, com uma gravidade esmagadora. É impossível para os humanos viverem nestes planetas. 

O melhor que podem encontrar é algum satélite com água, como Europa ou Titã, mas eles não têm uma atmosfera semelhante à nossa e a influência gravitacional de Júpiter, bem como sua radiação, não devem ser nada agradáveis.

Quanto a Marte, é o mais "fácil" de ser habitado, mas exigirá uma logística gigantesca. Os recursos que serão necessários para tornar Marte um planeta habitável para bilhões ou mesmo milhões de pessoas são tantos que seria mais fácil usar todo este esforço e tecnologia para restaurar a própria Terra danificada pela poluição. 

A Terra tem uma riqueza de recursos favoráveis à vida que é incomparável no sistema solar. Temos uma atmosfera ideal, nem densa demais nem fina demais; temos a dose perfeita de gravidade, radiação e eletromagnetismo produzidos pelo planeta. Afinal, nós nascemos aqui, evoluímos aqui. Tudo em nossa genética se desenvolveu de modo a combinar com o ambiente terrestre.

Então repito: se um dia a Terra se tornar muito poluída e degradada, ainda assim será mais fácil tentar restaurar a Terra do que terraformar outro planeta desértico. Além disso, nós subestimamos a capacidade de renovação do nosso planeta. Mesmo que a humanidade se esforce muito, será extremamente difícil conseguirmos tornar a Terra um lugar tão desértico e devastado quanto Marte ou outro planeta de nosso sistema.

A nossa história planetária mostra bem do que a Terra é capaz. Ela já passou por grandes extinções, por meteoros que causaram uma destruição e poluição atmosférica equivalente a um apocalipse nuclear. Tivemos vulcões que já cobriram todo o planeta com sua fumaça. E mesmo assim, como diria o Morfeu em Zion: "We are still here". O ecossistema terrestre é resiliente, se renova, se adpata. Este planeta é mais esperto do que as pessoas imaginam.

Mesmo no caso de uma hecatombe nuclear, quando a tola humanidade poluiria toda a superfície do planeta com radiação, ainda seria logísticamente e tecnologicamente mais fácil nos refugiarmos nas profundezas da crosta, em enormes cidades-bunkers, do que tentar construir colônias em Marte para abrigar o mesmo volume de pessoas.

No caso de um apocalipse nuclear, o mais prático será construirmos bunkers a uma grande profundidade e usaremos robôs para trabalhar na superfície, produzindo energia e coletando materiais, enquanto levaremos uma vida de trogloditas cyberpunk. É uma vida distópica, mas ainda mais prática do que tentar fazer algo parecido na Lua ou em Marte, onde há poucos recursos naturais. 

Devemos permanecer na Terra ainda por milhões de anos. Vamos sim construir colônias interplanetárias, mas elas servirão para fins científicos, de extração de minérios e até mesmo para turismo. A Terra continuará sendo nosso lar por um bom tempo, na saúde ou na doença.

Contrariando as previsões catastrofistas sobre a ação humana no planeta, a verdade é que o progresso tecnológico já está nos levando a um ponto de virada, quando enfim sairemos da fase poluidora (que se intensificou no começo da revolução industrial, com o aumento do uso de combustíveis fósseis) e passaremos a ajudar o planeta, até mesmo quando uma catástrofe ou poluição não tem causa humana.

Por exemplo, em breve seremos capazes de proteger o planeta de meteoros hostis. Imagine isso. Num futuro distante ou próximo, a Terra pode ser visitada por grandes meteoros e, se não fosse a presença humana, não haveria a menor chance do planeta se defender. 

Um evento de extinção em massa acontecerá a cada "meteorada" que o planeta levar e será assim até o fim dos tempos. Já com a presença humana, a tecnologia um dia (e já estamos quase prontos) será capaz de combater meteoros gigantes, salvando a Terra e seu ecossistema de tais catástrofes.

Um dia seremos capazes também de minimizar os danos causados por erupções vulcânicas ou terremotos. Poderemos até ajudar o escudo eletromagnético da Terra, caso passe por um enfraquecimento. É preciso lembrar que somos uma criação do planeta, somos fruto da natureza e podemos ser parceiros bem úteis ao planeta no futuro.

Por outro lado, existem sim situações em que nossa única opção será sair daqui. Mesmo que sejamos capazes de combater grandes meteoros, dificilmente a tecnologia humana, nos próximos milhares de anos, poderá salvar a Terra caso ela entre em rota de colisão com um astro bem maior que qualquer meteoro, como a Lua ou um planeta. 

Vai que um dia o tal planeta X ou Nibiru aparece e vem certinho na nossa direção. Aí não tem jeito mesmo. A colisão com um corpo de tal proporção vai transformar a Terra em uma bola incandescente como nos tempos do hadeano. Se um dia tal situação acontecer, aí de fato a melhor opção será ir todo mundo pra Marte.

Outra situação igualmente impossível de se resistir é o caso de uma expansão solar. Se o Sol se expandir a ponto de "engolir" a Terra, aí mais uma vez aqui será uma bola de fogo e teremos que tentar a sorte em Marte ou talvez em alguma lua de Júpiter, se Marte também for engolida pelo fogo.

No conto The Wandering Earth, de Cixin Liu, que também virou um filme (resenha aqui), é apresentada esta situação em que o Sol se expande e a humanidade precisa escapar da fúria de fogo da nossa estrela-mãe. A solução é bem fictícia: são construídos propulsores do tamanho de montanhas em toda a superfície terrestre e eles empurram a Terra pelo espaço como se fosse um foguete.

Olha, por mais impressionante que seja este conceito, na prática seria bastante problemático. Mas não duvido que um dia sejamos capazes de, de alguma forma, impulsionar o planeta para fora do sistema solar, no caso de uma catástrofe tão grandiosa quanto uma expansão ou mesmo explosão do Sol. 

Só que, pensando bem, no dia em que chegarmos a tal nível tecnológico, provavelmente já teremos feito avanços em tecnologias de viagem espacial, quem sabe até já tenhamos o warp drive e aí fará mais sentido saltarmos no espaço em naves, como botes de fuga de um naufrágio do Titanic. Deixaremos a Terra finalmente e partiremos para as estrelas, em busca de outro mundo habitável bem longe daqui.

Então, no futuro distante, o destino da humanidade, como de qualquer civilização, será realmente deixar o seu berço, seu planeta natal, e explorar os mundos interestelares. Uma civilização só consegue garantir sua perpetuação praticamente até o fim do universo, depois que alcançar esta capacidade de fazer viagens interestelares. 

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