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Narcisismo, o novo mal do século

Narciso by Caravaggio (1594-1596)

O narcisismo é algo facilmente encontrado em governantes, imperadores, políticos em geral, bem como em celebridades e artistas que ficam muito famosos. Não que necessariamente todas estas pessoas sejam narcisistas, mas as narcisistas costumam procurar os ambientes e carreiras que possa satisfazer as suas necessidades de autoglorificação.

Todo mundo tem uma dose de narcisismo, o que não é per si um problema, todavia existe o narcisismo como traço de personalidade, algo profundamente instalado na psique e, neste caso, assemelha-se bastante à psicopatia. 

De fato, há quem diga que o narcisista é nada menos que um psicopata e talvez até o pior tipo, já que ele não tem qualquer empatia pelos outros e enxerga tudo e todos como coisas que ele pode vampirizar para sua própria satisfação.

Eis que a tecnologia tornou o mundo um cenário ideal para as personalidades narcísicas, já que tais pessoas amam a exposição. Privacidade não é algo que interessa a quem vive alimentado pela vaidade, de modo que se exibir, ser visto, ser notado, é tudo o que este tipo de pessoa deseja.

Há pessoas que ficam famosas, mas se mantêm discretas e humildes, não se deixando iludir pelo veneno da fama. Já as narcisistas são fortemente contaminadas e, quando por acaso se tornam famosas, aí é que se perdem de vez.

O narcisista famoso ou pseudofamoso passa a acreditar que é tudo de grandioso que seus fãs projetam nele. Ele se ilude com o status de "formador de opinião", "influencer", e acredita que é mesmo capaz de influenciar a opinião pública, mesmo que não tenha o menor preparo e conteúdo acerca daquilo que se meta a opinar. Ele acredita que a enorme quantidade de seguidores valida a sua autoridade e suas opiniões vagas e mal fundamentadas.

Talvez a forma mais leve e inofensiva de narcisismo seja a vaidade, a vontade de ser visto e admirado por sua aparência. Sempre existiram pessoas assim, mas agora a internet ofereceu um amplo palco para os exibicionistas, onde podem postar selfies e receber elogios. Até aí, convenhamos, não há problema algum.

A coisa piora quando narcisistas querem ir além da admiração estética e tentam ganhar atenção por meio da sinalização de virtude. Não raro narcisistas costumam se tornar santarrões, puritanos ou hiper-religiosos, exibindo sua santidade, sua espiritualidade, o que acaba levando-os ao caminho da hipocrisia, pois ninguém pode ser tão santo quanto afirma. 

O hipócrita desenvolve uma capacidade de mentir para os outros e também para si mesmo, pois ele precisa acreditar na própria ilusão. É aí que a coisa vai ficando perigosa, pois o hipócrita pode prejudicar as pessoas julgando que não está fazendo nada de errado.

Por outro lado, existe o narcisista que, averso à religião, adota um puritanismo em formato mundano. Eis o politicamente correto, o lacrador, o cancelador. Por meio desta postura de constante julgamento dos outros, o narcisista atrai atenção para si. 

Alguns vão admirá-lo, acreditando em seu ilusório modelo de virtude, outros irão odiá-lo por causa de sua hipocrisia ou de seus julgamentos. Em ambos os casos, o narcisista vence, pois para ele o importante é ser o alvo da atenção, seja positiva ou negativa. "Falem bem ou falem mal, mas falem de mim".

O episódio Nosedive, da série Black Mirror, ilustra perfeitamente a condição do narcisista na sociedade moderna. Vivemos em um sistema de crédito social, onde as pessoas ganham pontos, estrelinhas, por meio da aprovação social, de seguir determinadas regras que misturam sinalização de virtude com popularidade e fama. 

É o mundo dos sonhos para o narcisista que vê todo este sistema como um jogo e ele sente-se estimulado a competir por mais pontinhos, mais estrelinhas, mais likes, tendo como fim ser alvo de constante atenção. Atenção é a grande moeda do narcisista.

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