Nos anos 90 a indústria de quadrinhos passou por duas grandes mudanças: 1) o crescimento do gênero de histórias adultas, densas e sombrias, com autores como Frank Miller, Alan Moore e Neil Gaiman; 2) o surgimento de um novo estilo de desenho, mais detalhista, exagerado e graficamente aprimorado com as recém surgidas ferramentas de colorização digital.
Neste segundo fenômeno se destacaram desenhistas como Jim Lee e Todd McFarlane. Tanto se destacaram que terminaram criando uma editora própria, a Image, com a ousadia de bater de frente com Marvel e DC e enfatizar esse aspecto gráfico das revistas, caprichando nas cores e traços. Os coloristas de fato são pouco lembrados, mas tiveram um papel importantíssimo. Basta dar uma comparada entre os quadrinhos dos anos 80, que tinham uma colorização mais simples e artesanal, e estes dos anos 90 com uma paleta de cores mais explorada, com fades e degradês, enchendo as páginas de muita cor, tornando-as visualmente mais atraentes e, claro, lucrativas.
Note a diferença nas cores das figuras abaixo. Nos anos 80 o Capitão América e o Ciclope tinham um azul puro no uniforme e a única marcação de sombra e tom era feita pelo nanquim da arte final, com as áreas pretas e hachuradas. Nos anos 90 veio a colorização digital e nota-se no azul do Fera e do Ciclope uma variedade de tons que ampliam a impressão de luz e sombra.
E então temos Rob Liefeld. Na época dessa revolução visual dos anos 90 ele era um garoto iniciante que teve a sorte de conseguir trabalhar para a Marvel e foi um dos mais controversos desenhistas da época, pois ele vendia bem, mas tinha um traço notavelmente tosco, uma anatomia bizarra dos corpos masculinos e femininos e tantos outros exageros. Mesmo sendo o cara que todos amavam odiar, o fato é que ele fez sucesso e foi um dos líderes na fundação da Image.
Liefeld era como uma versão turbinada, anabolizada e psicodélica de Jim Lee. Mas pensando bem, talvez ele seja o melhor símbolo para aquele estilo dos anos 90, quando se valorizou bastante heróis super musculosos com as fibras trincando e mostrando mais de 40 dentes na boca numa expressão dramática. O desenho era tão ruim que acabava sendo bom porque é impossível olhar para uma capa cheia de brucutus carregando 50 armas nas costas e não ficar curioso. Não à toa foi um sucesso de vendas. O exagero vende.
Quando eu era garoto partilhava do mesmo ódio ao desenho tosco do cara que qualquer outro leitor comum da época tinha, mas mesmo assim comprava lá minhas revistinhas da X-Force porque né, essas drogas viciavam. Agora, décadas depois, parece que alcancei uma compreensão diferente da coisa. Liefeld era ruim sim, era tosco, não entendia nada de anatomia, mas tinha algo nesse estilo que fez dele tão popular. Ele foi uma espécie de expressionista.
Apreciemos alguns desenhos.
E convenhamos, Liefeld merece uns créditos extras porque ele foi o criador de um dos personagens mais penetrantes da cultura nerd, um cara que virou um dos líderes do mundo dos memes, que é homenageado em cosplays por todo o mundo, que rendeu um dos melhores filmes de super heróis já feitos. Ele mesmo: Deadpool.
Concordo
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