Qaligrafia
Séries, livros, games, filmes e eteceteras 🧙‍♂️

A Sombra

Não preciso de inimigos, 
pois já tenho a mim mesmo. 
Eu tenho a minha Sombra 
e a ela estou preso.
Ela que me conhece,
meus erros e fraquezas;
conhece as rachaduras,
meus pontos indefesos.
Como dois condenados
acorrentados, presos
um ao outro para sempre,
sem nunca ter sossego.
Ó, Sombra, todo dia
acordo te ofereço.
Façamos uma trégua.
Me diz qual é o preço.
Vivamos em paz, Sombra,
Prometo que eu esqueço,
perdoo teus pecados.
Busquemos recomeço.
Juntos seremos fortes,
não partes, mas inteiros.

(25,12,2023)


Intel 10400F vs 12600k

Intel i5-10400F

Há alguns anos venho usando o Intel i5-10400F. Posso dizer que é um processador excelente em termos de custo-benefício para um PC gamer "de entrada". Para desempenho em jogos pesados, é uma CPU modesta e com a vantagem da economia de energia, já que tem um consumo de 65 W. Por este motivo nem necessita de um resfriamento potente. Eu uso aquele coolerzinho básico que vem na caixa do chip.

Ok, quando estou jogando o New World, o uso da CPU vai às alturas e este cooler fica gritando, se esforçando pra resfriar a peça. A temperatura máxima chega a bater 92°. Pois é, estou vivendo no limite. Bom, estava, pois chegou a hora do upgrade.

New World é um jogo mal otimizado. Com um i5-10400F e uma RTX 2060 Super, até dá pra rodar com os gráficos no alto ou mesmo no ultra, mas aí é pedir pra ficar com 15-20 FPS, então costumo jogar no mínimo ou no médio, quando consigo ter 60 FPS, mas variando dependendo do número de players no local. No centro da cidade chega a 45 e em rotas com muita gente junta em um só local chega até a 25. De toda forma, tá dando pra jogar. Sempre fui acostumado a jogar com menos de 60 FPS.

Intel i5-12600K

Neste caso, o problema não é a GPU, pois a 2060 S é uma placa decente. Chegou a hora de atualizar a CPU e optei pelo i5-12600K. Eis algumas diferenças.

O 10400F tem 6 núcleos e 12 threads, com frequência base de 2.90 GHz e turbo de 4.30 GHz. O 12600K tem 10 núcleos e 16 threads, com frequência base de 3.7 GHz e turbo de 4.9 GHz. O cache é respectivamente 12 e 20.

Além de toda esta diferença na velocidade, existe a importante questão do suporte a peças melhores. A 10400F aceita memórias RAM DDR4 de até 2666 MHz de velocidade, enquanto o 12600K aceita DDR4 de até 3200 MHz e DDR5 de até 4800 MHz. Isto garante uma boa vida útil para a CPU, pois eu continuo usando DDR4, mas futuramente posso fazer um upgrade para DDR5, o que trará uma bela de uma melhoria. Para games a DDR4 ainda é suficiente e convenhamos que memórias DDR5 ainda são caras (bem como as placas-mãe com suporte), mas em alguns anos vão baratear e quem sabe eu possa fazer um upgrade a baixo custo, mantendo a CPU. Enfim, é bom saber que a 12600K oferece essa possibilidade.

Também é importante o suporte ao PCI Express que na 10400F vai até 3.0 e na 12600K vai para 4.0 e 5.0. Inclusive uso um NVMe que é PCIe 4.0, com velocidade de 3000 MB/s, mas esta velocidade é bastante reduzida porque minha placa-mãe e a CPU só suportam 3.0. Mesmo sendo 4.0, o SSD roda numa build 3.0, mas com menor desempenho. Logo, com o upgrade para a CPU nova, automaticamente vou ganhar uma melhoria também no SSD que já tenho e que está com as mãos atadas pelas limitações do PCIe.

Bom notar que os soquetes destas CPUs são diferentes. LGA 1200 para a 10400F e LGA 1700 para a 12600K. Isto inclui uma diferença de formato. O LGA 1200 é quadrado, enquanto o 1700 é retangular. Deste modo, é preciso prestar atenção na compatibilidade do cooler, pois a área de contato deve ter o formato adequado.

A diferença de desempenho também tem um custo energético. Enquanto o antigo chip consome 65 W, o novo fica na faixa de 125 W e obviamente também aquece mais. Pela primeira vez comprei um cooler à parte do processador. Em todos os meus 20 anos usando PC (sendo que comprei meu primeiro PC há 15 anos), sempre usei o cooler básico que costuma vir na caixa da CPU ou já montado na placa-mãe. 

PCYES LORX

O 12600K nem mesmo vem com cooler na caixa, justamente porque ele exige um ventilador maior e mais potente. Optei por um cooler modesto da PCYES LORX, mas que tem um radiador bem maior que os coolers genéricos e o ventilador não fica voltado pra cima da CPU, mas para o radiador em si, o que deve otimizar a dissipação de calor.

O fato do 12600K consumir mais energia não significa que ele sempre está rodando a 125 W, mas apenas que o seu teto máximo de consumo é maior que o do 10400K. Normalmente, com o PC em baixa atividade ou apenas usando o navegador, rodando um vídeo, etc, o consumo pode ficar na faixa de 10-20 W e a temperatura entre 20 e 40 graus. Quando roda algo mais pesado como um jogo, aí é que a CPU passa a trabalhar forte e demandar mais energia e gerar mais calor, chegando a uns 70-80 graus, dependendo da otimização do jogo.

Lamentações

Os meus problemas não são da conta de ninguém. 
Só cabe a mim carregar a minha cruz,
a pedra sisífica que todo mundo tem.
Eu tenho a minha, você a sua, pois.
Mas, como o forno fumegante de um trem,
todos precisam liberar o seu vapor.
A poesia é o escape por meio da qual são
poupados meus vapores da explosão.

(22,12,2023)

Efêmera alegria

Alegria, ela é tão efêmera.
Pequenos intervalos no respirar da vida.
O crepitar da chama, apenas um momento
que nasce e se desfaz, como poeira ao vento.
Assim é a alegria, apenas a partícula,
o fragmento ínfimo, finito, fenecente.
Em ti eu não confio, efêmera alegria,
não preenches a alma, és só uma gotícula.
Onde está minha vida, meu lar, meu habitat
é o imenso mar da minha mansa melancolia.

(21,12,2023)




Geometria e magia

Poliedros de Platão
Os Poliedros de Platão ou Sólidos de Platão são uma das associações mais antigas entre misticismo e geometria.


Magia e ciência são em geral inconciliáveis, mas não se engane, muitos dos grandes cientistas tinham alguma familiaridade com a magia ou a linguagem mística, a exemplo de Isaac Newton, que deixou um grande volume de textos herméticos e análises misteriosas da Bíblia, textos que, obviamente, não são muito divulgados pela comunidade científica por não se tratarem de ciência propriamente dita, mas de magia.

Ainda hoje, numa era em que o secularismo é cada vez mais dominante e que, como diria Carl Sagan, abandonamos o "mundo assombrado pelos demônios", há cientistas que enveredam pelo misticismo, até mesmo buscando uma conciliação entre ciência e magia, como Fritjof Capra, autor de O Tao da Física. 

Sim, sim, há cientistas que abominam esta mistura e advogam a favor da "pura ciência". Enfim, esta é uma discussão sem fim, como tudo na filosofia e teologia. De toda forma, venho aqui propor um conceito peculiar que abre espaço para uma possível conciliação entre ciência e magia, a geometria espacial.

Todos sabemos que em nosso mundo existem três dimensões visíveis: comprimento, largura e profundidade. Basicamente isto significa que você pode observar o espaço à sua volta olhando para os lados, para cima e para baixo e para o horizonte. A estas três dimensões, ainda podemos acrescentar uma quarta, o tempo, algo que, mesmo que não seja observável com os olhos, pode ser mensurado pelo movimentos dos corpos dentro do espaço tridimensional. Tudo o que existe e se move, move-se no tempo.

Estas quatro dimensões são o limite do que podemos observar por quaisquer meios, seja pelos olhos, por instrumentos científicos ou por cálculos matemáticos. Desta forma, nossa ciência tem um campo de observação limitado às quatro dimensões.

Na teoria, porém, a ciência pode especular sobre dimensões que ultrapassam este limite do universo conhecido. Além das três dimensões do espaço, pode haver uma quarta, uma quinta, sexta, quem sabe até mais. São dimensões que não podemos observar, uma vez que estamos limitados, aprisionados nas três dimensões do nosso espaço, todavia, se tais dimensões existem, elas certamente têm alguma interação e influência em nosso mundo e nossa existência.


Imagine que exista um universo bidimensional, com seres bidimensionais. Para nós, que o observamos de fora, este universo pode parecer uma pizza, porém sem espessura. Uma pizza finíssima e que possui apenas comprimento e largura, como uma folha de papel de proporções cósmicas. Nós, seres tridimensionais, temos o privilégio de conseguir observar este universo plano de fora e perceber que ele é plano e bidimensional, já os seres que vivem neste universo têm uma percepção limitadíssima, pois não conseguem ver acima e abaixo ou ter noção de profundidade. Basicamente só conseguem ver o que está nos lados.

Imaginemos um exemplo mais simples. Se você desenhar um círculo em uma folha de papel e falar para uma formiga bidimensional (obviamente nossas formigas são tridimensionais, mas aqui temos uma formiga hipotética bidimensional) entrar neste círculo sem atravessar a linha de sua circunferência, será uma tarefa impossível, pois a única maneira dela entrar ali é caminhando através da folha e passando para dentro do círculo. 

Já você, que é um ser tridimensional e tem a vantagem de estar em uma dimensão além, pode simplesmente pegar aquela formiga, levantá-la para fora do papel, e colocá-la dentro do círculo sem que ela tenha que atravessar a linha. Ela foi magicamente teleportada graças à intervenção de uma força de uma dimensão superior.

Quem está em uma dimensão superior, consegue ver e interagir com uma dimensão inferior, mas o inverso é mais difícil ou impossível. Imagine então que exista uma quarta dimensão do espaço, ou uma quinta. O que quer que exista nestas dimensões, tem o poder de interagir com o nosso mundo tridimensional (ou quadridimensional, se incluirmos o tempo) e tal interação é impossível de ser observada por nós que estamos limitados às dimensões inferiores, a não ser que...

A não ser que alguma parte de nós faça parte de dimensões superiores. Qual o melhor candidato a isto? A consciência. A consciência é o maior mistério da humanidade e seu verdadeiro potencial é desconhecido. Digamos então que a consciência seja um fenômeno que tem origem em uma quarta ou quinta dimensão do universo, reverberando para as camadas inferiores, para o nosso mundo conhecido. Neste caso, a consciência seria o elo entre todas as dimensões.

A magia, portanto, pode ser um fenômeno em que a consciência obtém acesso aos poderes e "facilidades" que as dimensões superiores têm sobre as três dimensões inferiores, poderes como a clarividência, a capacidade de enxergar o curso do tempo e as suas diversas possibilidades. Os chamados "seres superiores" ou "transcendentes" mencionados em toda a religião e misticismo, podem ser seres literalmente de dimensões superiores no espaço e que, portanto, têm poderes que em muito superam os limitados poderes daqueles que estão presos nas três dimensões. 

Para a formiga bidimensional, presa nos limites da folha de papel, aquela mão tridimensional que a teleportou para dentro do círculo é uma entidade superior e de poderes praticamente divinos, poderes estes que existem pelo simples fato da mão existir em uma dimensão a mais do espaço.

Por fim, a ideia das dimensões extras pode também ser uma boa candidata para a teoria de tudo. Ela não só explicaria a magia, como também seria capaz de conciliar as leis até então inconciliáveis de nosso universo tetradimensional. As dimensões superiores podem conciliar tudo, unificar tudo, ciência e magia. O que está acima e o que está abaixo.

Quod Superius Macroprosopus, Quod Inferius Microprosopus

Palavras-chave:

A missão de sobreviver

A humanidade sempre especulou sobre seu papel, sua missão, sua razão e há muitas propostas na religião e na filosofia, mas o fato é que acima de tudo prevalece uma missão: sobreviver.

O melhor que podemos fazer neste universo é sobreviver, continuar, persistir por eras e eras para ver onde isso tudo vai dar. Talvez haja alguma grande resposta e ela está no futuro. Precisamos chegar lá, seguir sobrevivendo, enquanto nos entretemos com nossas especulações, nossas crises e soluções, nossas coisas triviais e fascinantes.

Como indivíduos somos efêmeros, somos fagulhas que se acendem e somem. Como humanidade, porém, podemos alcançar os confins do universo de alguma forma, algum dia.



Habemus Furiosa

Anya Taylor-Joy; Furiosa (2024)

Apesar da memória afetiva de adolescência que tenho com a trilogia original do Mad Max, de longe o meu filme favorito da franquia é Fury Road (2015). Acho que ali Mad Max alcançou o auge de seu potencial narrativo e estético. E digo mais: o Tom Hardy encarnou muito bem o espírito do personagem.

Tom Hardy; Mad Max (2015)

Mad Max é o retrato de um cara que perdeu tudo no apocalipse. Perdeu as pessoas queridas, a vida em um mundo civilizado, perdeu até mesmo uma parte de sua humanidade e trejeitos sociais básicos. Teve gente que não gostou da atuação do Tom Hardy, de seu jeito balbuciante de falar, mas convenhamos, se uma pessoa passa anos vivendo isolado, evitando contato humano, ela realmente acaba perdendo a habilidade de falar com fluidez. 

Aqueles que vivem nas cidadelas do apocalipse continuam conversando, praticando a fala e as skills sociais, mas Max era um errante, vivia em uma eterna fuga, só entrando nas cidadelas quando precisava se abastecer com alguma coisa. Ele vive como um eremita, em silêncio, conversando apenas com os próprios pensamentos. 

Ele é lacônico, porque já não há vontade alguma de falar senão só o necessário. Ele não tem aspirações, tem apenas o que restou do instinto primitivo de tentar sobreviver. Mesmo assim, no fundo ainda restou algo da antiga humanidade, uma certa fagulha de esperança, pois ele, mesmo hesitando, acaba se sacrificando para ajudar outras pessoas.

Tem gente que não gostou do fato do Mad Max de 2015 ter dividido o protagonismo com outra personagem, a Furiosa (Charlize Theron), mas eu acho que a presença da Furiosa permitiu que o Max se tornasse ainda mais ele, pois assim a narrativa não precisava ficar o tempo todo focada nele. Max é "low profile". No fim daquela história, ele desaparece em meio à multidão. Furiosa funciona como um contraste, já que ela é uma líder. É ela que faz as negociações, que faz a história rolar.

Desde 2015 estamos aguardando uma sequência de Fury Road, mas é recomendável não ter pressa. George Miller trabalha no tempo dele e é assim que funciona. Entre Mad Max 3 e o 4 há um hiato de nada menos que 30 anos! Bom, espero não ter que esperar mais trinta anos para o Mad Max 5, mas já se passaram oito. Enquanto isto, teremos um spin-off a ser lançado em 2024: Furiosa: a Mad Max Saga.

Furiosa não será um spin-off genérico deixado nas mãos de qualquer diretor. Ele foi escrito e dirigido pelo próprio George Miller, o que pra mim já é promissor. Um trailer foi lançado e nele percebe-se que a estética marcante de Fury Road permanece. Acho que deram uma exagerada na saturação das cores, mas não chega a ser um problema.

A protagonista será interpretada pela bela e badass Anya Taylor-Joy, a garota com três "y" no nome. A acompanho desde A Bruxa (2015) e Fragmentado (2016) e ela só melhora a cada ano. Mal posso esperar para ver do que ela é capaz no papel de uma sobrevivente deste selvagem mundo apocalíptico. Só tem um detalhe: espero que ela sofra.

Um problema que tem se tornado muito comum nos filmes ultimamente é que tentam criar uma personagem feminina badass que já nasce pronta, que não passa por um ciclo de evolução heroica. O resultado é a insossa Mary Sue. Não é isto que esperamos em um herói ou anti-herói, seja masculino ou feminino.

O Max sempre foi um cara sofrido. Ele apanha, se rala, perde o carro, perde as armas, é largado a vagar no deserto, é aprisionado, até mesmo virou uma bolsa de sangue ambulante. Enfim, ele passa por poucas e boas e ainda assim sobrevive. É isto que faz dele um badass. Logo, torço para que a Furiosa também seja assim, que seja uma personagem sofrida e que tenha dificuldades e desafios. Se isto acontecer, Furiosa será uma personagem marcante.

Anya Taylor-Joy; Furiosa (2024)

Palavras-chave:

New World após dois anos

New World

Venho acompanhando o New World¹ desde o comecinho lá em 2021. Depois da hype inicial e de uma onda de decepções, o jogo nunca se recuperou da grande queda no número de players. Agora ele existe como um MMORPG bem nichado, como tantos outros, frequentado por um público de cerca de 15-20 mil players diários. 

Muitos que abandonaram o New World cultivam até hoje um ranço, um sentimento de decepção nunca superado, mas aqueles que continuam jogando parecem bastante satisfeitos, pois não se pode negar que a Amazon não desistiu do jogo e continua periodicamente lançando novidades. Agora em 2023² adotaram o sistema de temporadas, com passe de batalha e grandes updates a cada três meses. Tiveram até mesmo a ousadia de lançar uma DLC paga e de fato boa parte dos players mais devotos comprou a DLC.

Realmente o New World agora pode ser dividido em antes e depois desta DLC, pois ela traz uma mudança significativa na experiência do jogador. Primeiro, a DLC dá acesso à tão esperada montaria, que até o momento consiste em três tipos de criaturas com suas respectivas skins: cavalos, lobos e leões. A montaria melhora muito a qualidade de vida, pois aumenta consideravelmente a velocidade de locomoção (basta testar uma corrida entre um jogador a pé e outro a cavalo para ver a diferença) e ainda tem um bônus que é a possibilidade de escalar certas rochas que não é possível alcançar a pé.

New World mount

A região que outrora era o ponto inicial de todo novo jogador, Primeira Luz, passou por um rework, se tornando Última Luz. Agora é a área mais endgame do jogo, com criaturas de elite bem poderosas e um bioma estilo terra selvagem visualmente agradável, com criaturas novas como mamutes, gorilas e lagartos gigantes, praticamente dinossauros. Não demorou para que os jogadores organizassem rotas de baús nesta nova área.

Na certa a grande melhoria fornecida pela DLC é o aumento do level cap. Agora é possível chegar ao nível 65, bem como ao gear score 700 e, olha, estes 5 níveis a mais, somados a este novo gear score, fazem uma diferença enorme. O Thorpe, por exemplo, boss final da dungeon Nas Profundezas, é bastante desafiador para players no level 60. Ele mete medo, é uma esponja de ataques e pode derrubar jogadores com um hit. Se você o enfrenta no level 65 e gear score máximo, por outro lado, o Thorpe parece de papel e é facilmente derrotado. Essa é a diferença que faz a DLC.

Sim, neste aspecto o jogo se tornou pay to win, pois quem compra o acesso ao level 65 adquire uma superioridade de poder significante comparada a quem permanece preso no level 60. O fato é que boa parte dos players decide comprar a DLC afim de não ficar para trás e, convenhamos, se você joga diariamente, se está gostando do jogo, realmente compensa adquirir a DLC.

Assim, New World segue melhorando pouco a pouco, a cada novo update, a cada temporada. Inevitavelmente, chega em um ponto no endgame em que você realmente sente que "zerou" o jogo e ficará num hiato até o próximo grande update, de modo que, como muitos MMOs, é um tipo de jogo para o qual você retorna de forma sazonal, dando um tempo e voltando de novo e de novo. 

E assim tenho feito. Vou e volto e devo continuar assim enquanto houver conteúdo novo. Estou satisfeito com o rumo que o New World tomou, com as melhorias feitas até agora. Devo parar de vez algum dia? Provavelmente. Afinal em 2024 está chegando o Throne and Liberty, que tem sido o MMO que mais acompanho ultimamente e que estou ansioso para conhecer.

Algo me diz que o Throne and Liberty me fará aposentar o New World de vez.

Notas:



Palavras-chave:

À deusa Melancolia

Se a Melancolia fosse uma deusa,
certamente eu seria seu devoto.
Ao seu altar eu levaria arroxeadas rosas
em uma noite minguante com neblina e fria brisa.
Olharia as estrelas, deitado em uma rocha,
até adormecer no aconchego do seu colo.
Ouviria em meus sonhos uma música tão triste
que me faria sorrir satisfeito com seu ritmo,
ela transformar-me-ia em um pássaro noturmo
e eu deixaria a Terra, indo para outro mundo.
Veria coisas incríveis, cores, vidas tão diversas,
a evolução dos povos através de longas eras,
a riqueza do universo, abundante em beleza,
tantas coisas formidáveis! E enfim encontraria
tua fonte encantada, ó deusa Melancolia.

(19,11,2023)


O conforto da tristeza

Muitos temem a tristeza, fogem dela, a rejeitam. Os masoquistas a procuram, porém como uma forma de punição. Alguns, no entanto, veem beleza na tristeza, a beleza incompreendida de uma flor alienígena. O seu frio é aconchegante, em sua penumbra noturna posso descansar os olhos. A tristeza para mim confunde-se com o relaxamento, um estado de calma como o da vigília antes do sono. Ela conserva minha energia e evita que eu me degrade com o calor das fortes emoções. Além disso, quem ama a tristeza nada teme. A alegria é sempre acompanhada do temor que algo ou alguém a roube ou a destrua. É um tesouro cobiçado. A tristeza, ao contrário, é um tesouro envolto em mistério e que muitos evitam e rejeitam. Ninguém vai querer roubar sua tristeza, ninguém vai invejá-la. Só não deixe que o mundo perceba que a tristeza é a sua paz, pois a paz, esta sim, todos querem roubar.

(13,11,2023)

O mundo em que vivo

Eu não estou no mundo, aqui fora. Estou em mim, no universo interior, o lar onírico, o abrigo dos meus pensamentos. Aqui fora eu sou apenas um diplomata, um enviado para me representar, enquanto o meu eu completo vive em seu próprio ecossistema habitado por lembranças, fantasmas, fragmentos, reflexos e aspectos do meu ser. Neste mundo, nunca há sol de meio dia, nem mesmo o vespertino. Na maior parte do tempo é nublado, com uma leve neblina a gotejar, criando orvalho nas plantas, reluzindo entre a komorebi que atravessa a folhagem. À noite a chuva se intensifica e embala meu sono. É assim na capital, na cidade onde a mente reina, um mundo noir, misturando a penumbra e as cores do neon. Há, porém, outros biomas. O deserto do eremita, contendo dunas e cavernas nas rochas, um mundo próprio para o recolhimento, um mundo de fuga. À noite, o deserto é o melhor lugar para contemplar as estrelas. O bosque do mago, do druida, um bioma multicolorido e variegado, tomado pela imaginação e a loucura. Em algum lugar do bosque há um pântano e ali vive uma criatura. Há também campos floridos e árvores gigantescas e ancestrais, guardiãs de uma longa memória e portadoras do saber. O oceano é um mundo de forças primitivas, misteriosas, e nas suas profundezas encontra-se um abismo. No continente há montanhas e uns poucos vulcões que parecem já não estar ativos, tendo sua ira aplacada ou recolhida nas profundezas do ventre da terra. Há tanto a se explorar, tanto a se conhecer, mas quanto mais eu caminho, mais o horizonte se estica e reconfigura. E pensar que isto é apenas um fragmento, um fractal, do vasto campo quântico que consiste na consciência cósmica.

(02,11,2023) 

Estamos muito longe de criar a verdadeira matrix

Unreal Engine forest

Ano após ano ficamos fascinados com a evolução dos gráficos nos jogos. A cada novo jogo nos empolgamos com a ideia de sermos capazes de criar outro mundo, um mundo digital tão detalhista e realista quanto o teal. A tecnologia ray-tracing faz um jogo de luz impressionante e que dá a sensação de imersão e realidade. Todavia, a verdade é que estamos muito longe de replicar o mundo.

Estes gráficos que chamamos "realistas", simulam apenas uma camada muito superficial da realidade, apenas o aspecto visual em uma escala humana e de uma forma ainda bastante limitada. Tomemos um pequeno exemplo para perceber o abismo que separa o mundo digital que temos até o momento e o mundo real: uma folha.

Florestas nos games são um bom exemplo de quão impressionante pode ser uma simulação de mundo. A textura dos troncos de árvores, a luz interagindo com a vegetação, atravessando as folhas a ponto de simular um efeito komorebi, o chapinhar da água quando pisamos em um rio... Tudo parece tão detalhista. Mas olhemos apenas para uma folha, uma simples folha neste cenário. Se dermos um zoom, veremos alguns detalhes da folha, mas logo vamos nos deparar com pixels, pontos de cor. Aí acaba a profundidade daquele objeto.

Na vida real, ao olharmos uma folha mais de perto, vemos os intrincados detalhes de suas nervuras, as formas poligonais da superfície, minúsculos insetos a caminhar por ela. Em um zoom microscópico, veremos uma estrutura ainda mais complexa, as células, as moléculas, todo um mundo vivo existindo ali naquele pequeno espaço de uma folha. Outro zoom ainda mais profundo revelará os átomos presentes nas moléculas, um microuniverso composto por estes planetoides de prótons, elétrons e neutrons. 

Se fosse possível olhar ainda mais a fundo, veríamos as partículas subatômicas mais fundamentais, o mundo quântico povoado por um enxame de ondas e partículas misteriosas. E talvez ainda haja uma camada mais profunda, a das cordas, vibrando de maneiras peculiares. Estamos falando aqui de algo tão pequeno e infinitesimal, que nossa imaginação mal consegue obter um parâmetro para comparar. Qual seria o tamanho de uma partícula subatômica em comparação à folha? Uma formiga no sistema solar? Ou na galáxia?

Uma folha, uma simples folha contém um mundo praticamente infinito. Não existe tecnologia computacional no mundo capaz de replicar isto em uma simulação. Ora, se sequer conseguimos criar uma folha tão profundamente detalhista, imagine quão longe ainda estamos de sermos capazes de replicar um mundo inteiro em uma simulação digital. Mesmo que a computação siga evoluindo exponencialmente, precisaremos ainda de séculos ou milênios até conseguirmos criar de fato um mundo virtual tão complexo quanto o real.

Pakavras-chave:

Luto

Eu visto preto como quem está de luto.
De fato estou. Luto pela minha alma.
Essa tristeza que me acolhe como um leito,
essa eterna noite negra que me abarca.

Talvez um dia este luto tenha fim.
Vou vestir branco, até mesmo um amarelo.
Sempre serei da Lua, da noite, do frio,
mas contemplando o alvorecer pela janela.

(23,10,2023)

A era de ouro do animismo

Flammarion engraving

O erotismo e a paixão são um campo onde o animismo floresce. Hoje em dia mais ainda com a internet. Há algumas décadas, quando criança, eu era apaixonado pela Penélope Charmosa, uma personagem de desenho animado. Eu ficava me imaginando como um herói que a salvava dos bandidos. Era um animismo infantil, atribuir a um desenho uma vida própria, uma substância tal que eu podia nutrir sentimentos por ela. 

Hoje em dia vejo que mesmo adultos experimentam um pouco disto ao gostar de personagens de anime, games, até mesmo personagens sem uma aparência física visível, como aqueles dos livros. Mulheres talvez tenham ainda mais facilidade que homens para se apaixonar por personagens de livros e não à toa consomem romances mais que homens. Obviamente qualquer pessoa dita normal sabe fazer uma distinção entre estes sentimentos platônicos por seres fictícios e algo real, mas tais sentimentos existem e se constituem numa manifestação de animismo.

No erotismo, existe toda uma cultura de produção de material erótico baseado em desenhos, animes, jogos, etc. A chamada "rule 34". Isto é puro animismo.

Mas não só isto. Na verdade, até mesmo representações de humanos reais são animistas. Uma escultura em mármore baseada em um modelo humano real se torna um ser em si e daí nasceu o pigmalionismo. Há quem tenha sentimentos pela Mona Lisa, que hoje é apenas a representação de uma mulher real que já nem mais existe. 

Ora, o que são fotos e vídeos senão também representações de pessoas reais? Quando as pessoas assistem a um vídeo erótico ou veem fotos nuas de pessoas e se excitam com isto, até mesmo ao ponto do orgasmo, estão tendo uma relação anímica, já que a pessoa real, de carne e osso, não está ali participando deste momento erótico. 

Casais apaixonados que ficam de daydreaming um com o outro, imaginando a pessoa amada e fantasiando histórias, estão se relacionando no momento do devaneio não com a pessoa real, mas com a sua representação mental e anímica. 

Já parou para pensar nisto? Quando você sonha, pensa, imagina a pessoa com quem você está se relacionando, naquele momento você está nutrindo sentimentos por uma construção da sua mente e não pela pessoa concreta que não está fisicamente presente. De fato, todo relacionamento tem um aspecto anímico, uma vez que você não direciona seus sentimentos simplesmente a uma pessoa, mas também à projeção imaginária que você faz dela.

Sentimentos religiosos são por natureza anímicos, já que você projeta sentimentos em ídolos, talismãs, santos, anjos, espíritos, divindades, seres que geralmente não se mostram fisicamente presentes. Tudo isto nos faz perceber que a dimensão física é apenas um pequeno aspecto da realidade vislumbrada pela nossa mente. Vivemos em um misto de mundo físico e mental, sendo o mundo mental muito mais amplo.

E eis que agora a tecnologia está levando a humanidade para uma espécie de renascença do animismo, com a inteligência artificial. Algumas pessoas vão resistir inicialmente, rejeitando a ideia de humanos terem algum tipo de sentimento direcionado a máquinas, mas com o tempo isto se tornará cada vez mais comum. Ora, quando você se irrita com a Alexa ou ri de um comportamento dela, já está desenvolvendo um laço anímico com esta inteligência artificial.

Até que ponto irá se aprofundar a relação entre humanos e máquinas? Um dia haverá crianças que serão criadas por robôs e nutrirão por eles sentimentos filiais. Haverá idosos solitários que terão a valiosa companhia de um cuidador robótico e muitos vão ter por estes robôs o sentimento que se tem por um grande amigo. No mundo erótico, então, as pessoas terão experiências eróticas envolvendo máquinas com mais frequência do que as relações humano com humano.

Em algum momento, talvez até existam robôs se convertendo e praticando alguma religião. Quando isto acontecer, teremos um curioso fechamento de ciclo, pois um ser anímico, a inteligência artificial, será igualmente praticante do animismo.  

E assim toda a jornada da humanidade, que no tempo das cavernas começou com sentimentos anímicos voltados para criaturas desenhadas nas rochas e bonecos de palha, ruma para uma espécie de animismo cósmico, com a compreensão de que o universo inteiro, além de sua camada puramente física, é também um mundo mental experimentado pela consciência. 

Nós, seres conscientes, somos a consciência do universo, e vivemos neste limiar entre a matéria e o mundo mental. Ao criar um mundo virtual, chegamos ao ponto em que ambos os reinos se misturam e se confundem. Este mundo irá se expandir e se mesclar à própria consciência individual e coletiva. A era de ouro do animismo.  

Renascença

Olha o céu, olha o céu now.
Está se aproximando a aurora boreal.
Quantos se prepararam, quantos
estão se protegendo com um manto.

Gafanhotos e ovelhas marchando.
Redemoinho humano. São tantos.
Algo vai acontecer, algo vai
multiplicar-se e renascer após o caos.

Bye bye, balbuciante Babilônia.
Em breve teremos dois corações.
No céu veremos vinte mil vimanas
que vêm visitar seus anfitriões.

Aguarde mais um pouco, paciência.
A espera acumula a recompensa.
O orvalho voltará renovando o cantil
por entre as luzes do komorebi.

(28,09,2023)

A arte de rejeitar os rudes

A ofensa em si não é nada. Palavras não são paus e pedras e não podem causar dano concreto. Enquanto o dano da pedra é inevitável, o dano da palavra depende apenas de quem a escuta, de como sua mente reage. Você pode treinar a mente para ignorar palavras, para relevar insultos, assumir uma atitude socrática e até mesmo debochar dos insultos que te oferecem.

O problema do insulto, portanto, não está nas palavras, mas na atitude, na intenção. Se alguém intencionalmente tenta te insultar, esta atitude revela a hostilidade da pessoa e o desejo dela causar algum tipo de dano. Ora, se uma pessoa tem sentimentos hostis a seu respeito, é melhor afastar-se dela, pois ela nada de bom tem a oferecer. 

É por isto que rejeito os rudes: não pelas suas palavras, mas pelas suas atitudes.

(26,09,2023)

Solidão e solitude

A solidão é como um furacão
e com força terrível ela te arrebata
a um mundo turbulento de caos e de loucura,
destrói sua alegria, seus sonhos despedaça.

Muitos então se perdem no caos da solidão,
levados pelos ventos da dor e desespero,
eis que, porém, alguns conseguem ir além,
atravessando essa triste e atroz barreira.

Estes chegam no mundo de paz e de sossego,
do furacão o olho, a região mais calma.
A solitude é o olho do furacão e eis que
ali só há descanso e alívio para a alma.

(18,09,2023)

Hienas

Há pessoas que são como hienas,
com seus risos estridentes histéricos,
se agrupam em bandos e perseguem
indivíduos a fim de fazer cena.

São pessoas que não têm alma amena,
que divertem-se em tirar seu sossego.
Não conhecem o valor do respeito.
Intelectos tão pobres que dá pena.

Devorando carniça as hienas
se assemelham a estes seres simplórios
que divertem-se em semear o ódio.
Almas rudes, insensíveis, pequenas.

(14,09,2023)


A evolução da etiqueta na internet

Online hate

Normalmente, se você está em um ambiente público conversando com um grupo de pessoas, inclusive pessoas estranhas que você nunca viu antes, existe um certo nível de etiqueta. Um estranho não costuma se aproximar de você com xingamentos e críticas, os conhecidos podem te xingar em tom de brincadeira, mas também evitam ser muito críticos e falar tudo o que pensam. 

Afinal, todos sabem que, se você se aproxima dos outros com uma atitude crítica, você se torna uma companhia desagradável e que todos vão evitar. Somente loucos, delinquentes e desequilibrados se comportam assim na vida real.

Na internet, por sua vez, este tipo de postura hostil é bem comum e muitas pessoas simplesmente abandonam as normas de etiqueta que usam na vida real, tornando-se mais críticas, xingando gratuitamente outras pessoas, fazendo comentários inapropriados, praticando bullying, sendo inconvenientes.

Isto acontece obviamente por causa de uma camada de anonimidade que a internet oferece. Não que você seja de fato um anônimo. Quem comete crimes na internet pode ser punido porque sempre deixa rastros. No entanto, mesmo em redes sociais, onde você pode se apresentar com seu nome e colocar sua foto no perfil, o fato de não se sentir fisicamente presente naquele ambiente faz com que você perca a noção de pessoalidade. Ao falar com outras pessoas, você não tem o mesmo nível de empatia que teria se as visse pessoalmente, em carne e osso, pois ali, na internet, são apenas uma fotinha num perfil e às vezes nem é a foto real da pessoa.

Esta sensação de anonimidade e impessoalidade deverá mudar no metaverso, o real metaverso. Um dia, você vai se mover na internet como se fosse um segundo mundo físico, e sentirá a presença das pessoas, elas vão parecer mais reais, mais sólidas. Este tipo de sensação de presença real deverá ser suficiente para fazer com que muitas pessoas naturalmente passem a adotar na internet a mesma etiqueta que adotam no mundo físico, de modo que somente loucos, delinquentes e desequilibrados vão continuar se comportando como brutos mal educados no mundo virtual.

Habemus Qaligrafia

Estamos em pleno 2023, ano em que o congresso americano fez uma audiência pública sobre OVNIS, ano em que todo mundo tem um TikTok, menos eu. Virei uma múmia digital.

Na verdade, estou sempre me atualizando sobre tecnologia e já brincava de ChatGPT quando pouco se falava disso, mas tem novidades que não me interessam e tem "velhidades" que não largo. É o caso do blog, o bom e velho blog.

Hoje em dia, quando todo mundo busca monetizar sua atividade nas redes sociais, virar "criador de conteúdo" profissional, também sou antiquado ao não dar muita importância a isso, pois no fim das contas isto aqui é um hobby. Mais ainda, é uma necessidade devido à minha hipergrafia.

Hipergrafia é uma condição que consiste em um forte impulso para escrever. Tenho isto desde criança e só foi intensificando ao longo dos anos. Sou lacônico na fala, porém maníaco na escrita. Preciso escrever. Quando vejo filmes, séries, ou mesmo quando experimento algum game, tenho esta necessidade de escrever sobre, o que para mim funciona como uma forma de mastigar e digerir melhor a experiência.

Acontece que meus interesses são relativamente variados. Filmes, séries, games, animes, mangás, quadrinhos, livros, música, poesia, tecnologia, misticismo, etc e tal. Na música, tenho playlists que vão do clássico ao rock, do brega ao eletrônico. Só não tem funk. Me desculpem, mas a batida do funk não dá pra digerir. É um tipo de barulho que afeta minha misofonia, pois tenho esta outra coisa, uma aversão a certos tipos de som.

Mas enfim, cá estou eu falando para as paredes em um blog. Venho postando aqui desde 2018 e já mudei o endereço algumas vezes. Eis que agora sinto a necessidade de um rebranding. Assim nasce o Qaligrafia.

Quanto ao nome, tem alguma história envolvida. Na infância e adolescência eu gostava muito de desenhar, mais do que as crianças em geral, pois cheguei até a produzir umas revistinhas em quadrinhos caseiras, dezenas delas. Houve um período em que criei um pseudônimo para assinar alguns desenhos que fazia: Caleidoscópio.

Não usei esta assinatura por muito tempo. Creio que só alguns meses. Inclusive hoje não tenho mais nenhum desenho que fiz neste período. Eles se perderam por aí. O que, todavia, me chamou atenção foi o fato de que já na tenra juventude eu tinha a percepção de que meus interesses e minha mente eram multifacetados, como um caleidoscópio.

A hipergrafia também se manifesta em meu interesse por constantemente criar neologismos, fundir palavras ou morfemas para criar palavras novas, bem como substituir letras por algo equivalente, apenas com o fim de criar uma nova grafia. Assim imaginei Qaleidoscópio ou Qaleidos como uma versão modificada de Caleidoscópio.

Enfim quebrei a palavra no morfema Qali, que obviamente vem do kalós grego ("belo, bom"), e combinei com grafia, em parte porque no fim das contas é disto que se trata este blog, sobre escrever e escrever. 

O resultado final é uma palavra polissêmica, ambígua, pois tanto pode se referir a caligrafia em si, a arte de escrever à mão, como pode ganhar um novo significado neste neologismo que combina o conceito de caleidoscópio com grafia: a arte de escrever sobre assuntos variados; a escrita caleidoscópica. E, por que não, também entender como a arte de escrever sobre a beleza, afinal boa parte do conteúdo deste blog envolve cinema e poesia, duas artes que prezam bastante pela beleza.

Ah, mas tem ainda outro detalhe. Ao buscar um novo nome para o blog, eu não queria apenas algo que tivesse significado, mas que também fosse visualmente agradável para mim. Já que criei a palavra, o mínimo que poderia esperar é que ela tivesse uma estética que eu gostasse. 

No caso, existem algumas letras que gosto, visualmente falando, e outras que acho feias ou desinteressantes. Creio que a letra "r" minúscula para mim é a mais feia e também desinteressante. Por outro lado, gosto de letras como f, g, q e algumas outras. Em Qaligrafia, consegui reunir pelo menos três de minhas letras preferidas.

Enfim, é isso. Vida longa ao Qaligrafia.

A mãe narcisista e o anjo vingador em Only God Forgives

Only God Forgives (2013)

O dinamarquês Nicolas Winding Refn tem um estilo bem peculiar de contar histórias. Seus filmes têm um ritmo lento, poucos diálogos, explorando bastante o silêncio dos personagens e com cenas de violência explícita que expõem o lado perturbado e sinistro dos personagens. 

Talvez o filme mais perturbado dele seja The Neon Demon (2016), mas seu grande sucesso foi Drive (2011)¹, estrelado pelo Ryan Gosling. Depois ele repetiu a parceria com o Gosling em Only God Forgives (2013).  

Nicolas Winding Refn, Ryan Gosling; Only God Forgives (2013)

Julian (Ryan Gosling) é um criminoso expatriado dos EUA que toca um negócio de luta de muay thai na Tailândia, junto de seu irmão mais velho Billy. Além disso eles estão envolvidos no tráfico de drogas e se divertem com a prostuição. Enfim, uma vida bandida.

Julian é focado em apenas um fetiche: ele gosta de assistir uma prostituta se masturbando na sua frente, enquanto ele fica com as mãos atadas e nunca a toca. Billy é mais devasso e em uma ocasião ele ataca uma prostituta menor de idade e a mata, o que acaba atraindo a atenção do policial Chang que também atua como vigilante, fazendo justiça com as próprias mãos. Chang pune Billy fazendo que o pai da garota morta o espanque até a morte. 

Julian vai tirar satisfação com o pai da menina, Choi, mas resolve poupá-lo ao saber  que ele matou Billy para vingar a filha. Então entra em cena outra personagem, Crystal, a mãe de Julian e Billy. Ela veio para Bangkok a fim de sepultar o filho, mas também vingá-lo. Crystal se mostra uma megera fria e autoritária e, mais ainda, uma mãe narcisista e pervertida.

Ela arquiteta a morte de Choi, a fim de vingar seu filho, e também ordena um atentado contra o vigilante Chang, mas este sobrevive e agora se torna um verdadeiro anjo vingador imparável. Chang sai caçando todos os envolvidos, torturando e matando, até chegar na própria Crystal. Além disso, ele se envolve em uma luta de boxe contra Julian, dando nele uma bela surra, mas deixando-o vivo, pois, em seu julgamento, Julian não estava envolvido nos crimes cometidos por Billy.

De certa forma, Chang é o herói da história, pois ele é o vingador. Ele não ataca inocentes e seu papel é fazer justiça, ainda que de uma forma brutal e clandestina. Crystal é a grande vilã, inclusive porque acompanhamos seu relacionamento com Julian e vemos como ela o trata de forma desumana, como o humilha e manipula, além de dar indícios de que ela abusou sexualmente dele provavelmente desde a infância e o trata como se não tivesse vida própria, como se devesse viver à mercê dela. Enfim, uma autêntica e cruel mãe narcisista.

Kristin Scott Thomas; Only God Forgives (2013)
A monstruosa mãe narcisista.

Foi ela quem fez Julian ser o que era, um homem apagado, emasculado, o que explica seu fetiche de nunca tocar na prostituta. Ela criou o primogênito Billy como o "filho dourado" (um termo bem conhecido na psicologia para descrever a hierarquia dos filhos que a mãe narcisista determina a fim de manipulá-los, criando uma rivalidade ao superestimar um filho, enquanto subestima o outro), de modo que Billy virou este sujeito pervertido a ponto de matar uma garota. 

Em certo diálogo com Julian, ela literalmente fala do tamanho do pênis dos dois irmãos, elogiando o pênis enorme do Billy em detrimento de Julian. Por fim, a vilania de Crystal fica evidente quando ela comanda a matança para se vingar da morte do Billy. Mesmo sendo da vida do crime, Julian reconhece que a morte de Billy foi justa, visto que ele matou uma garota, e por isso poupou o pai da menina, mas Crystal estava pouco se importando com isto e passou pano para o crime do filho. 

A cena mais bizarra e curiosa (e atenção para o spoiler) é quando Crystal foi morta por Chang e, quando Julian encontra o corpo dela, ele abre uma fenda na barriga dela e enfia a mão. O que ele pretendia com isto?

Foi um gesto simbólico bem peculiar e que faz sentido levando em conta a relação disfuncional dos dois. Como cria de uma mãe narcisista abusiva, Julian tinha um sentimento perturbado por ela. Provavelmente no fundo ele nutria um ódio ou rejeição, mas na superfície ele tinha o apego da Síndrome de Estocolmo, o que se nota na cena em que ele fica bravo com a prostituta porque ela criticou a forma que Crystal tratava ele.

Vithaya Pansringarm; Only God Forgives (2013)
O anjo vingador.

Ele não se libertou da prisão psicológica imposta pela mãe. Em relações saudáveis, o afeto dos filhos pelos pais é uma consequência do afeto e cuidado que estes têm pelos filhos. Quem planta afeto, colhe afeto. Já em famílias abusivas, não é raro que os filhos desenvolvam um afeto ou apego aos pais por causa de um sentimento de dever, de ligação quase sagrada com seus genitores, ainda que eles tenham sido cruéis a vida toda. É uma prisão psicológica que também pode ser observada em alguns animais que, mesmo espancados e maltratados, continuam apegados a seus criadores.

Pois bem, Julian vivia nesta prisão. Desta forma, o gesto de enfiar a mão dentro da barriga dela pode ter sido um esforço de unir-se a ela da forma mais profunda, como que retornando ao útero. Por outro lado, é possível interpretar uma ideia oposta nessa cena. Talvez ali ele finalmente se libertou e o ato de enfiar a mão foi um gesto de afronta, de vingança contra aquela que o dominou a vida toda.

No fim, Julian ainda voluntariamente se entrega a Chang para ter os braços cortados, assim pagando a sua parte da dívida nessa confusão toda. Ele reconheceu a justiça do justiceiro. O filme termina com Chang cantando docemente em um karaoke, o que mais uma vez mostra que ele foi o herói da história e saiu como vitorioso no final.

O papel de Chang na história também explica o título Só Deus Perdoa. Para Chang, não existe perdão debaixo do céu, só vingança. 

Notas:


Palavras-chave:

Ryan Gosling fofo, frio e calculista em Drive

Drive (2011)

Drive (2011)

Drive (2011)

Drive (2011) foi um filme indie com um modesto orçamento de 15 milhões de dólares e que se tornou um verdadeiro ícone pop. Curiosamente, o protagonista, interpretado pelo Ryan Gosling, nem mesmo tem o nome mencionado, sendo conhecido em toda a história apenas como O Motorista.

Geralmente os filmes com cenas de perseguição policial costumam concentrar a atenção nos carros, mostrando suas manobras arriscadas, fazendo takes aéreos para dar ao espectador uma visão de helicóptero e os cortes rápidos dão a sensação de velocidade. Drive segue por um caminho diferente.

Ryan Gosling; Drive (2011)
Apenas Ryan Gosling no mercado.

O filme começa com uma cena de 10 minutos de perseguição em que o protagonista dá uma "carona" para dois assaltantes e se engaja em uma fuga, enquanto carros da polícia e até um helicóptero vasculham as ruas. Só que não vemos todos aqueles cortes rápidos dos filmes de ação e a câmera mal mostra o carro. 

Em vez disso, a câmera concentra-se em mostrar o interior do carro, alternando entre a expressão de medo e expectativa dos assaltantes e o rosto apático e concentrado do motorista, um profissional acostumado a fazer este tipo de trabalho. E mesmo sem todo o malabarismo típico das cenas de ação, estes 10 minutos prendem a nossa atenção e nos deixam com o mesmo sentimento de expectativa dos assaltantes. No fim, há uma sensação de satisfação quando vemos o Ryan Gosling sumir em meio à multidão como um cara qualquer.


Então vem a abertura com os créditos que virou um ícone entre os fãs de música eletrônica dark, quando vemos o motorista voltando para casa estoicamente, quieto e low profile, enquanto toca Nightcall, de Kavinsky. Não à toa no Youtube existem vários clipes e montagens desta música com cenas de filmes do Ryan Gosling, incluindo o próprio Drive, mas também Blade Runner 2049 e até mesmo Barbie.

O motorista tem um jeitão quieto, é lacônico e discreto. Embora às vezes passe um ar de arrogância, ele também sabe ser doce e simpático a seu modo, tanto que conquista a simpatia de sua vizinha Irene (a fofa Carey Mulligan), bem como do garotinho filho dela. 

Carey Mulligan; Drive (2011)
Irene é fofa, mas um ímã de problemas.

Carey Mulligan; Drive (2011)

Ryan Gosling, Carey Mulligan; Drive (2011)

Ryan Gosling, Carey Mulligan; Drive (2011)
O cavalheiro moderno protegendo a donzela.

Muitos homens têm receio de se relacionar com mães solteiras, mas o motorista não só parece não se importar com isto como rapidamente cria um laço com o garoto. Irene revela que o pai do menino está na cadeia, o que poderia ser entendido como um red flag, um alerta de que se aproximar daquela moça poderia trazer problemas. Novamente, ele não se importa. Ele não tem medo algum de perigo e segue se aproximando da moça e do garoto com um jeito gentil e tranquilo. 

Ele não é um cara que busca problemas, só que os problemas acabam indo até ele. Por um lado, o marido de Irene sai da cadeia e o cara é uma bomba-relógio ambulante, arranjando encrenca com a máfia e pondo em risco a família. Ao mesmo tempo, o patrão do motorista, Shannon (interpretado pelo Bryan Cranston) também se envolve com mafiosos e as coisas vão convergindo de modo que o motorista acaba no meio de um problemão, quanto terá que lutar pela sua vida e de Irene e seu filho.

Ryan Gosling; Drive (2011).jpg

Então conhecemos outro lado do motorista, seu lado badass, frio e também violento. Não à toa ele costuma usar uma jaqueta com um símbolo de escorpião nas costas, o que pode ser uma referência a seu signo e igualmente à sua personalidade arisca e vingativa, que fica quieto na sua, mas possui um ferrão para se vingar de quem ameaçá-lo.

Ele lembra um pouco o personagem do Mel Gibson no filme O Troco (1999), um cara sozinho que consegue ser uma grande ameaça para uma máfia graças a sua engenhosidade e a frieza com que lida com o perigo. Ele não chega a ser um John Wick, mesmo porque quase não usa armas de fogo, mas é um grande badass.

Ryan Gosling; Drive (2011)
Momento Oldboy.

Ryan Gosling; Drive (2011)

Muitas pessoas, diante de uma situação dessas, simplesmente pulariam fora pra não arriscar a vida comprando os problemas que outra pessoa arranjou. No caso, o motorista não tinha nada a ver com a dívida que o marido da Irene arranjou, mesmo assim ele foi lá tentar resolver, comprando briga com a máfia. 

Ele se sacrificou para proteger Irene e o filho, o que foi um ato heroico, mas ele não é exatamente um herói. Se por um lado era cavalheiro com Irene, por outro ele não hesitou em dar uns tapas e ameaçar a Blanche (personagem da Christina Hendricks). Ele é bonzinho apenas com as pessoas com quem tem intimidade, como Irene, o menino e o Shannon. Creio que ele se caracteriza como um lawful neutral. Ele não é nem bom nem mal e só é leal a um pequeno número de pessoas.

Ryan Gosling é um ator versátil, que já atuou em romance, musical, comédia, drama, sci-fi, etc. Ele obviamente é um dos galãs de Hollywood e crush de muitas garotas, justamente por ter este ar romântico, mas sem exagero. Ele parece um cara legal, amistoso e leal com aqueles que gosta, mas ao mesmo tempo ele consegue convencer como badass e transmitir uma aura ameaçadora. 

A seguir fiz uma montagenzinha misturando a cena em que ele persegue o mafioso Nino e a música da cena de perseguição do Batmóvel no filme The Batman (2022), de autoria de Michael Giacchino.


Palavras-chave:

A angustiante e aconchegante vinheta do Supercine

Supercine

Antes da internet se tornar o maior meio de entretenimento e comunicação do mundo, quem reinava era a TV, sendo o principal meio para as pessoas assistirem filmes. No Brasil alguns programas na TV aberta se consagraram na veiculação de filmes, como Sessão da Tarde, Cinema em Casa, Tela Quente, Cine Belas Artes e Supercine.

É curioso que o Supercine tinha uma vinheta que despertava certos sentimentos nas pessoas. Hoje com a internet podemos facilmente encontrar pessoas comentando nas redes sociais sobre isto e me chama atenção o fato de que muita gente costuma comentar que aquela vinheta causava uma sensação de solidão e tristeza.


Não é preciso muito esforço para entender o motivo. O Supercine passa tarde da noite de Sábado, já virando a madrugada. É final de semana e a pessoa que está em casa assistindo TV neste horário em muitos casos está sozinha. Se é criança ou adolescente, está sozinha no meio da noite enquanto o resto da família dorme. Se é adulto e mora sozinho, a sensação de solidão é ainda maior, pois a pessoa está vendo filme em casa num Sábado à noite em vez de estar nas baladas e noitadas lá fora. Assim, muita gente acaba associando o som da vinheta do Supercine a momentos tristes de solidão.

Para mim a experiência foi diferente. Não que eu seja o diferentão, mas estou ciente que faço parte de uma minoria de pessoas que tem prazer na solidão. É isso mesmo.

Como a maioria das pessoas naturalmente associa solidão a tristeza, pode ser difícil conceber que exista gente que realmente goste de ficar sozinha. Criamos até mesmo uma palavra para definir este estado: solitude.

Para mim, os momentos de solitude assistindo TV de madrugada eram aconchegantes. Eu adorava a vinheta do Supercine, com seu estilo noir. Ela me preparava para a imersão em um mundo de ficção. Somado ao fato de que eu gostava de solidão desde criança, também sempre fui noturno, sempre apreciei o escuro da noite e o silêncio. 

Desta forma, a vinheta do Supercine pode ter sido angustiante para muitas pessoas, mas para mim e provavelmente para outros amantes da solitude, ela era bem aconchegante.

Detalhe que o compositor da vinheta, Roger Henri, já foi tantas vezes questionado pelas pessoas se havia uma versão completa da música que ele acabou compondo a música completa, tendo a vinheta como refrão.

Palavras-chave: