Qaligrafia
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Inconciliável

Já houve um tempo em que tentei conciliar as minhas discrepâncias, encontrar um equilíbrio, absorver cada um de meus aspectos, cada eu, cada ele, de modo a montar um só, homogêneo, uma síntese. Então percebi que este sintetismo seria suicídio, seria um massacre. Para que exista apenas um eu, teria de destruir todos os outros, destruir cada pedaço de mim. Seria uma amputação, uma mutilação, uma anulação. Então entendi que deveria rever o percurso, desviar-me desta jornada de autodestruição. E se, em vez de podar cada galho torto, eu deixá-los florescer? Que exista. Que existam. Que eu não me esconda de mim, nem rejeite minhas partes incongruentes. Sou inconciliável. Sou heterogêneo. Minhas discrepâncias não precisam lutar a fim de que uma síntese prevaleça. Eu ignorei um fato importante: minha alma é vasta, é ampla. Cada conflito, cada crise e o peso das contradições apenas esticou o meu mundo, alargou as fronteiras, pois a alma é elástica e se expande sob estresse. Quando olhei para seu horizonte, pude ver quão espaçoso eu havia me tornado. Não há necessidade de disputa por território, pois há bastante espaço para toda minha inconciliável multiplicidade. O eremita, o mago, o louco, o mundo... Todos têm espaço nesta alma. E se um dia as coisas começarem a ficar apertadas, não tem problema. Expandir-me-ei. 

(22,08,2022)

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