Qaligrafia
Séries, livros, games, filmes e eteceteras 🧙‍♂️

Habemus The Batman

The Batman (2022)

Batman é o grande queridinho da DC e nenhum personagem de quadrinhos teve tantos filmes, séries, animações e games quanto ele. Entre as várias versões do Batman, tem umas mais cômicas, como a do Adam West, outras mais realistas, como a do Christian Bale e a mais recente, do Ben Affleck, não deu muito certo e o próprio Ben Affleck ficou desgostoso com o papel e pulou fora. Bom, pelo menos as armaduras desta última versão eram bem maneiras, como falei em outro post¹.

Agora é a vez de um novo ator assumir o manto. O famoso vampiro de Crepúsculo, Robert Pattinson, vai mais uma vez se tornar um homem-morcego. A escolha dele para o papel dividiu opiniões, obviamente, mas a verdade é que o filme promete e quem já assistiu no pré-lançamento está elogiando bastante.

Este novo Batman será literalmente o mais novo de todos os Batmans do cinema, pois a história será focada no seu início de carreira como vigilante. Pelo que já vimos nos trailers, o filme realmente promete ser bem dark, pesado e com uma bela fotografia. Tudo indica que pode ser um sucesso no nível do filme do Joker.

Notas:

Miranha no miranhaverso

Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018)

Uma coisa que a Marvel soube desenvolver bem em seu universo cinematográfico foi a diversidade de mundos fictícios (o que já falei em outro post¹). 

A DC também explorou um pouco disso, mostrando Krypton em Man of Steel e em uma série própria, bem como a ilha das Amazonas onde nasceu a Wonder Woman e o fantástico mundo submarino de Aquaman. O arrowverso foi ainda mais longe e apresentou um multiverso na saga Crise nas Infinitas Terras. 

A Marvel foi do mundo subatômico ao cósmico e deu um salto ainda maior na animação Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018) que definitivamente instalou o conceito de multiverso no MCU. Agora nem o céu é o limite.

Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018)

Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018)

Miles Morales é uma versão alternativa do Spider-Man (da Terra-1610, também conhecida como Universo Ultimate) que existe nos quadrinhos desde 2011, sendo o primeiro Homem-Aranha negro em meio à variedade de Aranhas. Bom lembrar que muito antes, em 1992, já surgira uma versão que acrescentou diversidade étnica à galeria de personagens: o Miguel O'Hara, o Aranha 2099 (Terra-928), que tem descendência islandesa e mexicana.

Até aí, a nova animação seria apenas mais um filme da Marvel acrescentando um novo personagem no MCU. Só que fizeram algo com consequências em todo o MCU, trazendo uma história baseada no multiverso.

Assim, vemos o Aranha do Miles Morales encontrar outras versões de outros universos: o Peter B. Parker (Terra-616), a Spider-Woman (Terra-65), uma versão anime do Aranha, a Peni Parker (Terra-14512), e até mesmo o Spider-Ham (sim, é Ham mesmo, o Aranha Presunto), também chamado Peter Porker (Terra-8311), que é literalmente um porco com poderes de aranha, e o estiloso Spider-Man Noir (Terra-90214) que foi dublado por ninguém menos que o Nicolas Cage.

É bom notar que este universo em que se passa a animação é classificado na vasta database da Marvel como Terra-TRN700, portanto não é exatamente o mesmo universo do Miles Morales dos quadrinhos, a Terra-1610. Também não é o mesmo mundo principal do MCU, aquele que vimos nos filmes dos Vingadores e seus personagens. Ali é a Terra-199999. Obviamente, agora que as portas do multiverso se abriram, todos estes e muitos outros mundos vão se misturar eventualmente nos filmes e séries.

Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018)
O Rei do Crime está tão grande que mal cabe na tela.

Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018)

Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018)

Quanto aos vilões, temos o Rei do Crime, que está enorme, um verdadeiro armário humano, tão grande que mal cabe na tela, o que dá um efeito estético bem interessante toda vez que ele aparece. E temos também a Olivia Octavius. Originalmente, o universo do Miles Morales nos quadrinhos, a Terra-1610, tem a sua versão do Dr. Octopus, o Otto Octavius. Para a animação criaram esta nova personagem, provavelmente para diversificar a dupla de vilões mudando o gênero de masculino para feminino.

De fato, se não fosse por ela, o filme só teria vilões marmanjos, pois além do Rei do Crime também tem Aaron Davis, Norman Osborn, Maximus Gargan e Lonnie Lincoln.

Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018)

E ainda teve uma ceninha pós-créditos em que vemos o Aranha 2099 encontrando o Aranha da série animada de 1967 (Terra-67), quando ambos replicam aquele meme dos Aranhas apontando um para o outro.

Enfim, a animação foi um show de fan service e referências, abriu a porta para o multiverso, que vai tornar o MCU ainda mais interessante e eventualmente trazer os X-Men, Quarteto Fantástico e o resto da galera que pertencia à Fox e foi recentemente comprada pela Disney.

Além disso, a qualidade do desenho é impressionante. É uma animação riquíssima em cores e detalhes, misturando 2D e 3D e com uma linguagem narrativa bem parecida com a dos quadrinhos. Tem até onomatopeias.

Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018)

Spider-Man: Into the Spider-Verse (2018)
Claro que não podia faltar um cameo do saudoso Stan Lee.

Notas:

Rússia x Ucrânia e o impasse tarantinesco nuclear

Pulp Fiction (1994)

O impasse mexicano é uma situação em que duas ou mais pessoas apontam armas mutuamente, de modo que temos literalmente um impasse: se uma pessoa atirar, as outras também atiram e, como todas têm armas apontadas umas para as outras, o provável resultado é que todas morrerão. Então, prevendo esta situação, os participantes do impasse ficam paralisados e o melhor que podem fazer é tentar negociar.

Os antigos filmes western popularizaram o impasse mexicano, mas posteriormente o Tarantino fez tanta homenagem a esta situação que o impasse se tornou uma assinatura tarantinesca.

Desde o início da era nuclear, o mundo inteiro passou a viver num impasse tarantinesco. O grande medo de todos durante a Guerra Fria era que acontecesse uma guerra nuclear, pois é óbvio que o resultado desta situação é uma catástrofe global.

Não é preciso uma simulação de supercomputadores pra saber o provável resultado de uma guerra nuclear. Se um país atacar outro com bombas atômicas, também será atacado em retaliação e a coisa vai escalando e saindo de controle. 

Terminator 2 (1991)

O grande problema das bombas atômicas é que elas produzem uma enorme nuvem radioativa, de modo que o estrago não vai se resumir à área onde a bomba caiu. Se acontecer de várias nações dispararem as bombas, a quantidade de fumaça radioativa jogada na atmosfera será imensa, percorrerá o planeta, afetando até os países mais distantes do epicentro das detonações.

Além disto, o efeito atmosférico será parecido com o que aconteceria se vários vulcões entrassem em erupção ao mesmo tempo, tornando os céus densamente nublados e provocando uma queda súbita da temperatura global. É o inverno nuclear.

Mesmo quem conseguir sobreviver ao inverno, vai a longo prazo sofrer os danos da radiação atmosférica. O que restar da humanidade irá lentamente morrer de câncer e fome, já que toda a produção de alimentos será gravemente afetada.

Nuclear war simulation
Simulação de uma guerra nuclear. É míssil pra todo lado.

Pois é, ninguém quer chegar a este ponto, nem mesmo os mais cruéis ditadores. Afinal, se o mundo for destruído, não haverá nada para dominar e a vida de luxo dos ditadores vai virar uma vida sem graça dentro de um bunker. É por isto que há décadas o mundo tem vivido neste impasse atômico e vivemos até relativamente seguros com base nesta lógica: mesmo que haja guerras, as nações nunca vão cometer a loucura de optar por um ataque nuclear.

Eis que agora estamos diante de uma situação que deixou todo o mundo apreensivo: a invasão russa da Ucrânia. Devido ao tom ameaçador com que Putin tem feito suas declarações públicas, o receio de uma guerra nuclear tem aos poucos se instalado na consciência coletiva. Será que o Putin teria a ousadia e a loucura de chegar a esse ponto?

Se ainda houver um pingo de racionalidade naquela cabeça, é improvável que ele aperte esse botão vermelho que nunca deve ser apertado. Após a Segunda Guerra, o mundo continuou a experimentar diversos conflitos, alguns bem tensos. Mesmo assim, os líderes mundiais nunca chegaram ao ponto de apelar para bombas atômicas.

A verdade é que bombas atômicas não são nem mesmo a melhor arma para se vencer uma guerra. Elas são caríssimas, causam muito dano colateral e, se forem interceptadas antes de atingir o alvo, não só vão dar um grande prejuízo pra quem disparou, como podem cair em cima de um aliado ou mesmo no território de quem disparou a bomba. O custo-benefício de um ataque nuclear é inviável.

Logo, bombas atômicas só existem mesmo para um propósito moral, para serem usadas como ameaça, como blefe, como o instrumento do impasse que evita que o adversário avance além de certo limite ou ceda a certas exigências.

Javelin
Pois é, esse cano de metal aí pode custar mais de 100 mil dólares.

Javelin

Acontece que, desde sempre, um fator decisivo nas guerras é a economia. Guerras são obviamente caras e têm se tornado mais e mais caras a cada ano. Um mísero míssil antitanque, conhecido como Javelin, é um projétil disparado por soldados por meio de uma bazuca que custa 120 mil dólares e cada projétil custa quase 80 mil. Os mísseis disparados por jatos e helicópteros são ainda mais caros.

Agora imagine o custo de uma frota de tanques, aviões e soldados disparando mísseis e o diabo a quatro. É uma fortuuuna. Um único dia de batalha pode custar milhões de dólares. Parafraseando Asimov, a guerra é o último refúgio do incompetente. 

Se um país chega ao ponto de se engajar em uma guerra, é porque falhou em tudo o que poderia ter feito pra evitar esta situação e agora vai ter que meter a mão no bolso e sacar uma fortuna absurda pra bancar a guerra. 

Logo, a tendência nas guerras modernas é que elas sejam vencidas pelo cansaço econômico. Chega um momento em que o país não tem mais de onde tirar dinheiro pra essa brincadeira cara e aí o jeito é voltar à boa e velha diplomacia.

Aparentemente é o que deve acontecer neste imbróglio envolvendo a Rússia. O que a princípio era um mano a mano entre Rússia e Ucrânia, como um Golias atacando David dentro de sua pequena casa, foi escalando com a ajuda internacional. 

A Europa está bancando esta guerra, enviando armamentos e tropas, o que vai fazer com que a campanha russa dure mais tempo, ou seja, gaste mais dinheiro. Isto pode durar dias, semanas ou meses, até mesmo anos e, somada às sanções econômicas de vários países, só vai levar a Rússia a uma enorme crise financeira.

Judo: History, Theory, Practice; Vladimir Putin (2004)

Uma curiosidade sobre o Putin. Todo mundo deve saber que ele foi agente da KGB, o que, convenhamos, é um fato bem sinistro de sua biografia, mas ele também tem uma carreira no judô e até publicou livros. Ele tem o título de presidente honorário da Federação Internacional de Judô, cuja sede fica em Lausanne na Suíça. No caso tinha o título, pois a Federação revogou tal honraria diante dos recentes eventos.

Tédio e fascínio

Às vezes olho pro céu e penso na grandiosidade cósmica e quão fantástico é o fato de que nossos olhos estão vendo objetos com bilhões de anos de existência. Às vezes só quero saber de assistir alguns vídeos bestas na internet pra preencher o tédio. Sou feito desta mistura agridoce de tédio e fascínio.

(22,02,2022) 

A estratégia do tirano

Em uma luta de boxe, é comum o lutador primeiro sondar as fraquezas do adversário. Dando jabs de leve, ele pode medir a distância, observar se o alcance do braço dele é maior ou menor, observar a agilidade com que ele se defende, etc. 

No momento climático da luta, quando o adversário cambaleia com um golpe, é aí que o lutador realmente intensifica seu ataque. É o avanço agressivo para finalizar, para tentar o nocaute. Este ato em um lutador bem treinado chega a ser instintivo. A partir do momento em que o adversário cambaleia, já desperta o instinto do ataque final em busca do nocaute.

Assim costumam agir os tiranos. No começo eles agem com cautela, medindo a reação do povo. Então, ao perceber uma boa oportunidade de encaixar um bom soco, tomam uma medida rígida que penaliza a população, como leis de emergência, restrição de direitos, punições desproporcionais à infração, o crescimento da burocracia e da vigilância, tornando a vida mais complicada.

Uma vez que o povo cede a estas atitudes sem demonstrar uma reação firme, é como o lutador que cambaleia, mostrando que está vulnerável a um golpe mais forte. Quando o povo aceita tudo o que o tirano impõe, ingenuamente achando que ele vai se dar por satisfeito e deixá-lo em paz, é aí que o tirano avança com ainda mais imposições, sempre visando dar o golpe definitivo, o nocaute, a implantação de um estado totalitário que se tornará a normalidade.

Lost Ark e alguns outros MMORPGs

Lost Ark

Tem épocas em que estou no pique para experimentar vários joguinhos e tem época que me falta paciência até pro tutorial. Desta vez coincidiu que fui experimentar o hypado Lost Ark num dia em que me faltava paciência.

Gosto de MMORPG. Não à toa joguei Runescape por nada menos que dez anos (como já falei em tantos outros posts¹). Recentemente fiquei bastante encantado e empolgado com New World e cheguei a pensar que este seria meu novo Runescape, mas aí passou um mês e comecei a perder a paciência com os problemas do jogo², até dropar de vez.

Agora a Amazon, mesma criadora do New World, trouxe mais um MOORPG. Desta vez não o criou, mas providenciou a distribuição para o Ocidente, pois Lost Ark já bombava no Oriente desde 2019, produto da sul-coreana Smilegate.

Lost Ark chegou por aqui com a fama pronta, pois na Coréia e vizinhanças já era um grande sucesso. Isto somado à eficiente propaganda da Amazon e divulgação por meio da Twitch, produziu uma hype maior que a do New World. Teve dias em que o jogo passou de 1 milhão de usuários diários na Steam.

Enfim resolvi experimentar, mas acho que eu não estava mesmo no clima. Acontece que Lost Ark, como um bom MMORPG, tem muuuita coisa pra fazer, muita coisa pra se aprender. É de fato uma verdadeira poluição visual a interface cheia de coisinhas aqui e ali.

É comum os MMORPGs serem assim. Até mesmo um Tibia, que tem fama de ser muito simples, tem uma interface com muita informação e um arsenal de hotkeys para você configurar e ocupar todos os seus dedos. 

É normal você se sentir perdido no começo de um MMO, o que inclui também MOBAs como Dota e League of Legend, de modo que você precisará de tempo, de muitas horas de jogo até se familiarizar e se sentir confortável com toda a variedade de informações e atividades.

Genshin Impact

O fato é que eu não estava mesmo no mood pra me dedicar tanto assim e dropei o jogo ainda no level 10. Ano passado, ainda antes do New World, também experimentei o Genshin Impact, que na época estava bem hypado, e cheguei a jogar por umas dez horas, mas aí veio o New World e capturou toda minha atenção.

Genshin tem como grande atrativo o visual de anime. É realmente um jogo agradável de se ver, com uma ambientação relaxante. A jogabilidade é bem peculiar, pois você monta uma equipe de quatro personagens e pode ficar alternando entre eles a qualquer momento.

Anyway, acho que agora estou com uma ressaca deixada pelo New World e devo passar algum tempo sem experimentar MMORPGs ou RPGs singleplayers

Minimal Dungeon RPG

Curiosamente, hoje me deparei com um indie em desenvolvimento na Steam que ainda vai ser lançado, mas já disponibilizou uma versão demo gratuita: Minimal Dungeon RPG. É um joguinho realmente beeem minimalista, com aparência de mobile game.

Basicamente as dungeons são quadradinhos e você interage simplesmente clicando nos quadradinhos, seja para explorar a área, cortar árvores ou lutar contra monstros. É como se você estivesse jogando uma planilha animada, pois não tem nenhuma imagem representando o cenário ou as criaturas (exceto uns poucos ícones para representar os itens e um emoticon para representar os monstros).

É nessa vibe que estou no momento. Estou preferindo um RPG assim bem limpo, bem simples e com gráficos extremamente básicos, do que um rico e detalhadíssimo Lost Ark.

Notas:


E se

Onde quer que haja escolhas,
sempre existe um "e se".
Você pensa: "E se eu tivesse
feito isto ou aquilo?"

Em um mundo infinito,
todos os "e se" se cumprem.
Alguns são bem sucedidos,
outros sem sorte sucumbem.

Meu "e se" é um de muitos
mundos e rumos possíveis.
Mesmo assim ainda sou único,
um ponto no infinito.

(21,02,2022)


Tweettar ou tuitar

Acho curioso como há pessoas, até mesmo jornalistas, que optam pela versão gringo-abrasileirada da palavra "twitter", forjando o verbo "tweettar"ou "twittar" em vez do mais apropriado "tuitar".

É como se houvesse um receio do abrasileiramento da palavra, de modo que tentam manter a morfologia original, o w, o tt duplo, até o ee duplo, só que esta tentativa de manter a palavra inglesa é sabotada no fato de se incluir um sufixo português, assim criando o twitt + ar.

Ora, se é para transformar o "to tweet" em um verbo devidamente brasileiro, que se faça da maneira que sempre foi feito, com as devidas adaptações fonéticas.

Note-se que "tweet" é uma palavra que surge de uma onomatopéia para represantar o piado de um pássaro. Com base nisto surgiu o nome de marca Twitter, que substituiu o ee duplo por um i a fim de criar uma palavra peculiar para a marca. 

Apesar da substituição da vogal no nome do site, em inglês se tornou comum usar o verbo "to tweet" (que seria literalmente algo como "piar" ou "chilrear") para representar o ato de postar algo no Twitter.

Uma dica básica para o aportuguesamento é basear-se no som da palavra e não em sua escrita. Por que "football" virou "futebol"? Primeiro porque em português não existe oo duplo e depois, como este oo duplo se pronuncia com som de u, optaremos pelo u na transcrição aportuguesada. O mesmo vale para o "ball" que vira "bol" justamente porque é assim que se pronuncia.

É de acordo com o mesmo princípio, o da pronúncia, que blackout virou blecaute e sandwich virou sanduíche. Inclusive neste último exemplo temos a pista para o "tweet": quando o w é pronunciado como u, é preferível substituí-lo por u na versão portuguesa.

Assim, uma vez que tweet se pronuncia tuíte, é esta a forma mais prática de se forjar uma versão portuguesa da palavra. Tweettar é uma aberração que fica no limbo entre ser uma palavra inglesa ou aportuguesada. É fruto de uma indecisão quanto à maneira de se adaptar um termo estrangeiro. 

Parafraseando Oswald de Andrade, em seu poema Pronominais:

"Vou twittar".
Diz o internauta
um tanto inseguro
e o jornalista espertinho.
Mas o bom tuiteiro
da nação brasileira
diz todos os dias:
"Deixa disso, camarada,
vamos tuitar".

A inevitabilidade do transumanismo

Kevin Warwick

O transumanismo é um conceito que está se tornando cada vez mais notável, tanto na ficção quanto na vida real. Na ficção já é algo bem comum, como vemos nas histórias de super-heróis, no Capitão América, que foi fisiologicamente modificado lá na década de 40, e no sci-fi cyberpunk em que vemos pessoas com implantes cibernéticos. Na vida real, temos o caso recente do Neuralink, um produto ainda em desenvolvimento, mas que promete levar a humanidade definitivamente para uma era estilo cyberpunk.

É um tema controverso, que tem entusiastas fanáticos, bem como críticos ferrenhos que tecem teorias conspiratórias (ou, pelo menos, são assim chamadas até que um dia percebemos que a coisa é real) sobre o uso da tecnologia para desfigurar o ser humano e transformá-lo literalmente num ciborgue.

Bom, mesmo que evitemos enxergar o assunto com o ultrapessimismo das teorias conspiratórias, ainda assim o chamado transumanismo nos dá muitos motivos para preocupações. Uma das preocupações mais consistentes tem a ver com o fato de que grandes empresas, detentoras das tecnologias de aprimoramento humano, movidas pela tão conhecida ganância, violem direitos básicos das pessoas por meio destas tecnologias.

Ou seja, uma vez que uma empresa colocou um chip na sua cabeça ou implantes no seu corpo e estes dispositivos geram big data, o seu corpo terá a privacidade roubada por tais empresas, sedentas de dados sobre você. 

Já experimentamos esta monitoração nos dispositivos que usamos para acessar a internet e estamos tão acostumados que normalmente nem nos importamos mais. No futuro, porém, a coisa vai ficar bem bizarra, pois o monitoramento vai chegar literalmente aos nossos corpos.

Transumanismo implicará em intervenções físicas em nosso corpo. Chips, próteses, dispositivos contendo circuitos, emitindo sinais eletromagnéticos, feitos de substâncias estranhas ao nosso organismo. Estas coisas vão ficar dentro de nós ou anexadas ao nosso corpo. Eventualmente haverão falhas e problemas de saúde provocados por estas partes cibernéticas. 

Transhumanism

E se uma pessoa tiver implantes hackeados? E se os implantes pifarem após a garantia e a pessoa não puder comprar peças novas? Diferente dos órgãos naturais, que são projetados pela natureza para se regenerar e viver por décadas, um implante artificial provavelmente terá uma breve vida útil. 

Ora, as pessoas hoje em dia trocam de celular a cada 2 ou 3 anos, até menos, porque o aparelho simplesmente fica obsoleto, perde o suporte a atualizações ou se torna incapaz de rodar certos aplicativos. No caso de um chip tipo Neuralink, haverá algum programa de fidelidade que permita ao usuário substituir o dispositivo regularmente sem custo extra?

A obsolescência de dispositivos implantáveis é algo que afeta muito o usuário. Um celular obsoleto não vai afetar sua saúde, mas um braço mecânico, um olho biônico, um chip na cabeça, quando fica obsoleto e começa a pifar traz consequências graves para sua qualidade de vida.

Enfim, há problemas que surgirão à medida em que o transumanismo se tornar mais comum. O fato, porém, é que o transumanismo é um caminho sem volta. Já estamos nele há um bom tempo.

A intervenção tecnológica no corpo humano é algo que existe desde os primórdios da medicina. A perna de pau do pirata era um dispositivo, um transumanismo primitivo. Os óculos, as próteses de plástico, as chapas metálicas que substituem ossos quebrados, as próteses dentárias, os aparelhos auditivos, os marca-passos, os implantes de silicone, até mesmo as perucas. Há um bom tempo, nós há somos transumanos.

Todos estes exemplos de coisas que já consideramos tão comuns nada mais são do que a tecnologia complementando e às vezes até superando a natureza. Entre as críticas ao transumanismo existe este argumento de que a tecnologia irá macular nossa humanidade, a natureza, a criação de Deus. Bom, se este é o caso, tal perversão já vem sendo feita há séculos com os exemplos que já citei. 

Pirate
Pirata, o transumano raiz.

Se um pirata perdeu uma perna e a substituiu por uma perna de pau, já estava com isto interferindo no curso da natureza e da criação. Enxergar a tecnologia como algo anti-natureza é um erro ontológico, uma vez que a tecnologia surgiu da própria evolução natural da espécie humana. A natureza fez que o cérebro evoluísse a ponto deste desenvolver a tecnologia. Tecnologia é filha da natureza e não um intruso em sua casa.

Se pensarmos em termos cósmicos, a tecnologia deve ser o curso natural do ciclo de vida de inúmeras civilizações. É a ordem natural do universo. Na máquina cósmica, a natureza segue o seguinte curso: os gases cósmicos se aglomeram e formam uma estrela a "espuma" desta aglomeração forma os planetas. 

Aqueles planetas que tiverem condições ideais vão desenvolver moléculas e depois formas de vida que se ramificarão em formas cada vez mais complexas, evoluindo ao longo de milhões de anos, até que surgem criaturas extremamente complexas e com uma inteligência capaz de produzir, armazenar, transmitir e aprimorar o conhecimento. 

Estes seres, fruto da natureza, fruto de um curso natural de progresso planetário, vão aprender a lidar com instrumentos primitivos e com o tempo vão criar novos instrumentos e esta habilidade seguirá evoluindo a ponto de tais criaturas construírem máquinas, computadores, naves, até mesmo uma colossal esfera de Dyson.

Dyson Sphere Program (2021)

Se pensar bem, a esfera de Dyson nada mais é do que uma versão mais evoluída da fogueira. Um ser primitivo com certa inteligência aprende a juntar gravetos e fazer uma fogueira para se aquecer, cozinhar, etc. Esta fase, a da descoberta do fogo e da tecnologia da fogueira, é um grande salto evolutivo em uma espécie. Trata-se de um método para conseguir energia. A esfera de Dyson é uma fogueira em nível interplanetário.

Nada disso é estranho à natureza. É fruto dela, de sua própria evolução. A natureza criou o homem, criou o cérebro, fez ele ser capaz de projetar, de calcular, de construir máquinas e até mesmo de realizar intervenções no próprio corpo, dando uma "mãozinha" à natureza. Se a natureza não nos dotou da habilidade de regenerar um braço amputado, ela nos dotou da capacidade cerebral para desenvolver uma prótese. A prótese continua, portanto, sendo um produto da natureza.

Vendo desta forma, o futuro cibernético não parece tão "antinatural". Isto não significa, obviamente, que a tecnologia age sempre em concordância com a natureza. Se um dispositivo faz uma pessoa adoecer (se um chip causar um câncer, por exemplo), significa que esta tecnologia não está cumprindo seu propósito de ser um complemento à natureza.

Enfim, há casos e casos. A questão é que o transumanismo em si não é bem nem mal e não é nenhuma novidade ou coisa estranha e alienígena que de repente está surgindo no mundo. Ele existe desde quando inventamos a roda e naturalmente foi se tornando mais e mais complexo com o tempo.

É preciso também entender a natureza mista do ser humano. Quando se fala em "essência humana", "natureza humana", dá-se a entender às vezes uma noção vaga de que o ser humano é um organismo totalmente independente e "lacrado", feito de um DNA humano e nada mais além disso. A verdade é que o nosso corpo é um misto de vários códigos genéticos e vários organismos vivendo em certa cooperação.

É óbvio que podemos distinguir bem o nosso DNA humano, nosso corpo, nossas células, mas tudo isto convive com trilhões (sim, trilhões) de bactérias e até mesmo vírus que moram em nosso corpo e têm uma pouco compreendida relação de mutualismo ou mesmo de simbiose. 

Nossa digestão nem mesmo funcionaria direito sem a presença das chamadas bactérias probióticas, da flora intestinal. Esta flora intestinal nada mais é do que um monte de bactérias vivendo em nosso intestino e que nos ajudam na digestão.

As bactérias da flora intestinal não são células humanas, não têm o nosso DNA, são criaturas vindas de fora, alienígenas ao nosso corpo e que desde a tenra infância começam a desenvolver esta parceria que nos permite viver. Sem elas simplesmente adoeceríamos até a morte.

É curioso isto. Se conseguíssemos tornar um ser humano "puro", feito 100% de DNA humano e células humanas, sem nada além disso dentro dele, este sujeito morreria, pois a vida humana depende desta relação simbiótica com outras inúmeras criaturinhas.

Pode-se dizer, portanto, que, assim como somos feitos de diversos sistemas celulares (sistema respiratório, vascular, digestivo, etc.), também temos um sistema microbiano. O que o transumanismo vem fazendo ao longo dos séculos é desenvolver um terceiro sistema que se integrará cada vez mais ao corpo, um sistema tecnológico, mecânico, cibernético.

Esta terceira camada da composição humana se tornará cada vez mais complexa e nos dotará de novas habilidades e aprimoramentos. Ainda está longe de ser algo tão rico quanto os sistemas biológicos, mas ao longo dos séculos e milênios a tendência é que este terceiro sistema se integre de tal forma à nossa biologia que se torne indistinguível dela.

Frankenstein
O monstro de Frankenstein é um exemplo fictício de transumanismo que deu errado.

Metropolis (1927)
O clássico Metropolis parece associar o transumanismo ao satanismo ou à perversão da forma humana (o pentagrama invertido).

Além das questões éticas e existenciais envolvendo toda essa evolução tecnológica do ser humano, também existe a questão ética e talvez esta seja a que mais preocupa as pessoas que param pra pensar no assunto.

Nós gostamos da aparência humana. Tanto gostamos que nos esforçamos por mantê-la. Pessoas que perdem os dentes costumam se importar em recuperá-los mais por uma questão de aparência do que pela necessidade mecânica de ter aqueles dentes. 

Ninguém gostaria de viver sem um rosto ou ter o rosto substituído pela cara de uma barata (se alguém sinceramente deseja se parecer com uma barata na certa sofre de algum transtorno kafkiano e é uma exceção).

A longo prazo, é possível que o transumanismo desfigure a aparência humana que temos desde nossas origens. Claro que ao longo dos milênios fomos nos tornando menos troglodíticos, mais bonitos, podemos até dizer, mas há uma semelhança básica entre um ser humano de hoje e um troglodita. Os traços gerais continuam os mesmos.

Num futuro remoto, tais traços podem ser radicalmente alterados. E se no curso de nossa evolução biotecnológica adotarmos formas que forem mais apropriadas às necessidades do mundo futuro? E se por meio da engenharia genética e cibernética nos tornarmos realmente baratas humanas? Se um humano de hoje viajar para o futuro, para milhares ou milhões de anos no futuro, a fim de visitar seus descendentes, pode se assustar com o que vai encontrar.

Por outro lado, esta nossa preocupação estética em permanecer com aparência humana poderá guiar o curso do transumanismo. É certo que há pessoas peculiares que desejam fazer alterações físicas bizarras, como implantar chifrinhos ou ter uma língua bifurcada, mas são casos raros e não refletem o que acontecerá com a humanidade em geral. 

Vitruvian Man; Leonardo da Vinci
O Homem Vitruviano é considerado um modelo clássico do padrão de beleza humana, especialmente nas proporções do corpo.

Levando em conta a questão estética, é possível que o ser humano do futuro seja ainda mais bonito, mesmo para nosso gosto atual. As chamadas imperfeições, detalhes em nossos corpos que não achamos bonitos, vão ocupar a indústria transumanista. Hoje já temos uma lucrativa indústria cosmética, mas ainda falta aprimoramento tecnológico. 

Ora, convenhamos que certos procedimentos estéticos têm desfigurado as pessoas e não é que elas queiram ser desfiguradas ou que os cirurgiões queiram desfigurá-las. É a limitação tecnológica do procedimento que faz isto e aí o coitado do cirurgião faz o que pode e o coitado do cliente se ilude com o resultado, mas no fundo ele sabe que não era aquilo que vislumbrou em sua imaginação.

A estética é relativa, claro, mas tem suas fronteiras. Parecer-se com uma barata definitivamente é algo que vai contra o ideal de beleza humana. Há, porém, vários tipos de ideal de beleza, o que podemos constatar observando as pinturas e esculturas ao longo dos séculos. 

Anastasiya Shpagina

Quem sabe no futuro o ideal de beleza seja ter uma aparência de anime. Aí, neste caso, o cara que viajar pro futuro vai se deparar com pessoas literalmente semelhantes a bonecos de anime. Se bem que nos dias de hoje isso já existe.

Aquaman e seu fantástico mundo submarino

Aquaman (2018)

Ultimamente virou moda inventar motivações "justificáveis" para os vilões, especialmente nos filmes de super-heróis. Um grande exemplo foi o Thanos, que queria salvar o universo numa espécie de holodomor cósmico. Ele era um extremista com um plano totalitário e cruel, mas pelo menos as intenções eram boas, não é mesmo?

Aquaman é levemente contaminado por esta fórmula. No começo vemos o Manta, que era um pirata e invadiu um submarino. De cara vemos como ele é cruel, pois sem piedade mata o capitão enfiando uma espada em seu peito. Ok, está estabelecido que ele é o vilão. Maaas...

Aquaman (2018)
Cabeção bem fiel ao design dos quadrinhos.

O Aquaman invade o submarino para resgatar a tripulação e dá uma boa surra nos piratas, enfrentando no final o Manta e seu pai Jesse (Jesse não parece um nome muito badass para um pirata). Os socos, balas e lâminas dos piratas nem fizeram cócegas no Aquaman, mas o Jesse tinha um lança-granadas que pelo menos conseguiu derrubar por alguns segundos o herói marinho.

Em resposta, Aquaman atirou um cano no ombro do Jesse, perfurando-o, mas não fez nada além disso. Em nenhum momento ele teve intenção de matar os piratas e apenas os nocauteou. Quando ouviu que Jesse era pai do Manta, até teve misericórdia e removeu o cano e deu as costas para sair em busca da tripulação. Ou seja, ele deu uma chance aos dois piratas de se salvarem, pois a intenção dele era apenas resgatar os inocentes.

Em vez de ficar "na moral", Jesse pegou o lança-granadas e deu outro tiro no Aquaman, mas este se desviou e a granada abriu um buraco no casco, inundando o submarino. A explosão também derrubou um torpeno nas pernas do Jesse que ficou preso. Aí nessa hora o Manta ficou mansinho, implorou pro Aquaman ajudar a salvar o pai dele, mas o herói deu as costas e saiu.

Pronto, foi criada uma motivação "justificável" para o vilão. A culpa foi do Aquaman que não ajudou a salvar o pai dele, mesmo que toda a situação tenha sido provocada pelo próprio Jesse. O Jesse é o grande monstro da história. Ele que criou o Manta e fez dele um pirata, ele que continuou provocando o Aquaman, mesmo depois de ganhar uma chance de escapar, ele que provocou a própria tragédia, atirando a granada e, enquanto o Manta tentava tirar o torpedo de cima dele, Jesse acionou uma bomba pra forçar o filho a sair dali e se vingar do Aquaman. Foi o Jesse quem plantou o ódio no Manta.

Mas a omissão do Aquaman em salvar um assassino psicopata de uma situação em que ele mesmo se meteu acaba passando esta ideia de que o Manta foi vítima de uma injustiça do herói.  Manta não será o grande vilão do filme, mas tem seu próprio arco de história, que basicamente consiste em sua obcessão em matar o Aquaman. Aquaman é a Moby Dick do Manta.

Aquaman (2018)

Aquaman (2018)

Aquaman (2018)

Tirando este clichê, o filme acerta em outras coisas. A ambientação marinha é excelente, cheia de criaturas fantásticas, as cenas de ação são boas e, diferente do Aquaman do Zack Snyder, que precisava de uma bolha de ar debaixo da água pra poder falar, aqui os personagens marinhos conversam na água de boa. É inverossímil, de fato, mas é uma daquelas coisas que merecem a suspensão de descrença, afinal é um filme de super-heróis e falar embaixo dágua é o superpoder dos atlantes.

Foi curiosa a escolha de James Wan para ser o diretor. Ele tem uma carreira mais voltada ao terror. Fez fama como produtor da longa série de filmes Saw, The Nun, Anabelle, entre outros. No Aquaman ele deixou o terror de lado e se concentrou na ação e muitos efeitos especiais. Neste caso, o mérito é obviamente mais dos studios de CGI e suas centenas de designers, do que do diretor. O forte do filme é a ambientação fantástica e, portanto, mérito da galera do CGI.

O Manta sai de cena por um tempo e acompanhamos o drama da família real atlante. Para evitar que o seu irmão Orm se torne o rei de Atlantis e declare guerra à superfície, Aquaman o desafia para uma disputa pelo trono que é feita simplesmente na forma de um quebra pau entre os dois. Pois é, bem ao estilo Black Panther versus Killmonger.

Patrick Wilson, Willem Dafoe; Aquaman (2018)
Quem imaginaria um dia ver o Willem Dafoe de coque samurai?

Aquaman (2018)

Inclusive Atlantis tem essa coisa meio Wakanda: um reino isolado do mundo e extremamente avançado, mas que ao mesmo tempo tem uns costumes arcaicos¹. Só que, em termos de ambientação, a DC caprichou bem mais que a Marvel. A galera do CGI realmente se dedicou em criar um mundo submarino cheio de criaturas, cores e tecnologia. Eu diria até que foi o melhor mundo submarino já criado no cinema, ao menos em termos estéticos. Não é fácil representar uma cidade futurista embaixo da água e este foi um grande feito do filme.

A luta acaba interrompida pela Mera, que então foge com o Aquaman em busca de um mítico e poderosíssimo tridente.

Quanto ao Manta, ele está longe de ser um vilão na história. Ele é apenas um contratempo, um breve antagonista. O vilão mesmo é o irmão de Arthur (Aquaman), o ambicioso rei Orm que acaba empreendendo uma grande guerra submarina para conquistar todos os reinos atlantes e depois atacar a superfície.

Aquaman (2018)

Jason Momoa; Aquaman (2018)

Jason Momoa; Aquaman (2018)

Aquaman e Mera, em sua busca pelo tridente lendário, acabam entrando em um fosso abissal e vão parar na Terra oca. Isso mesmo, bem no estilo verniano, eles encontram um mundo no interior da Terra e lá também está a mãe de Arthur, Atlanna, que sobreviveu quando foi lançada no fosso pelos atlantes.

Nicole Kidman; Aquaman (2018)

Nicole Kidman; Aquaman (2018)
Contemplem a Nicole Kidman no auge dos seus 50 e tantos anos.

Curioso que tanto o Jason Momoa quanto a Nicole Kidman (que interpreta a mãe dele) são havaianos. O Zack Snyder levou isto em conta ao escolher Momoa para ser o Aquaman, já que sua descendência havaiana-polinésia cria uma identificação do ator com o mar, pescadores, etc.

Agora o Aquaman entra numa cripta onde está o tridente, preso nas mãos do esqueleto do mítico rei Atlan. O guardião da cripta é um gigantesco monstro chamado Karathen (obviamente inspirado no Kraken). Simplesmente não tem como o Aquaman vencer este bicho, mas ele nem precisa. Pra que brigar, quando uma conversa resolve?

O Aquaman há décadas é motivo de piada, principalmente por causa da imagem que ele ganhou na série animada dos Superamigos. Aquaman ganhou a pecha de super-herói que conversa com peixes, o que tem um tom pejorativo, implicando que, na Liga da Justiça, ele é o que tem o poder mais ridículo.

Aquaman; Superfriends (1973-1988)

Aquaman; Superfriends (1973-1988)

Zack Snyder, no seu filme da Liga da Justiça, já veio com a intenção de mudar a imagem do Aquaman. Este foi outro motivo porque ele escolheu o Momoa, um brutamontes de 1,93 m de altura, um pouco mais alto que o Superman do Henry Cavill (1,85 m). O porte do Momoa naturalmente ajudaria a quebrar a imagem ridícula que o Aquaman tinha até então.

Eis que, no filme do Aquaman, o roteiro caprichou bastante em reconstruir a imagem do herói, especialmente a partir deste encontro com o Karathen, pois de uma forma bem esperta explorou justamente o poder mais ridicularizado do personagem.

Já no começo do filme vemos o Arthur criança sofrendo bullying porque conversava com peixes. Quando está na cripta, ele conversa com Karathen, que fica bastante surpreso, pois nenhum atlante demonstrou esta capacidade há séculos. É uma cena até um tanto meme, pois o monstrão assume uma atitude meio carante quando diz que ninguém fala com ele há muito tempo. O coitado do monstro só precisada de um papo e um abraço que ele liberava o tridente.

Enfim, o fato é que foi o poder telepático do Aquaman que lhe garantiu acesso ao majestoso tridente e ao reino de Atlantis. A esta altura, o rei Orm estava travando sua batalha submarina, que é apenas interrompida quando Arthur brota das profundezas montado no gigantesco Karathen e usa sua telepatia para fazer que todas as feras usadas como máquinas de guerra desobedeçam os comandos dos atlantes. Neste momento ele se torna o verdadeiro rei dos mares.

Aquaman (2018)
O siri gigante foi a cereja do bolo na batalha submarina.

Dolph Lundgren; Aquaman (2018)
Dolph Lundgren como sempre faz um personagem de poucas palavras, mas muita presença.

Jason Momoa, Amber Heard; Aquaman (2018)
É clichê, mas não podia faltar o beijo do par romântico no final.

O tridente que Aquaman usou na Liga da Justiça e no começo do seu filme era herança de sua mãe e tinha certo poder, mas agora, com o tridente primordial de Atlan, ele ganha um bom upgrade em seu poder de batalha. Teria sido interessante ver este Aquaman buffado numa sequência da Liga da Justiça, enfrentando o Darkseid. Mas sabemos que não vai rolar e o snyderverso acabou.

É bom mais uma vez elogiar o caprichoso trabalho de CGI na criação do fantástico e detalhadíssimo mundo submarino. A grande batalha é impressionante, vemos o oceano lotado das mais diversas criaturas, naves, feras. As armaduras atlantes são muito estilosas e convincentes enquanto tecnologia avançada. Parecem até algo alienígena.

Todo este CGI, que soma mais de 2300 cortes, foi obra de vários studios: Industrial Light & Magic (que pertence à Lucasfilm)², Base FX, Rodeo FX, Scanline VFX, DNEG, Luma Pictures, Weta Digital, Moving Picture Company (MPC), Method Studios, Digital Domain e Clear Angle Studios.

Um detalhe que deu um trabalhão para o studio do George Lucas foi a animação dos cabelos dos personagens embaixo dágua, o que é feito com um software específico de simulação de movimento e provavelmente nada com este nível de detalhismo foi feito antes no cinema, em se tratando de cenas aquáticas. Foram cerca de 700 cortes de cenas em que os cabelos dos atores precisaram ser animados digitalmente.

Jason Momoa; Aquaman (2018)

Notas:

1: No mito platônico de Atlântida, esta avançada civilização foi para sempre extinta com uma catástrofe natural. Este mito acabou ganhando versões mais fantásticas e os quadrinhos e cinema adoram explorar a ideia desta civilização ter continuado a existir no fundo do mar.

Por mais interessante que eu ache este conceito, fico a matutar uma coisa. Ora, se os atlantes eram tão avançados tecnologicamente, por que, quando a ilha foi destruída, eles não migraram para outro lugar e construíram uma nova cidade na superfície? Era algo bem mais prático de se fazer do que evoluir biologicamente, ganhar guelras e viver embaixo da água.

O evento da catástrofe natural não me parece uma boa explicação para o fato deles terem mudado de civilização terrestre para aquática. Faria mais sentido se eles voluntariamente, ao longo de sua evolução, migrassem para as profundezas, por exemplo, por considerar que o mundo marinho tem mais recursos, é mais vasto ou mais adequado à sua evolução.

De fato, se pensarmos bem, uma civilização muito avançada, a ponto de ter domínio sobre a própria genética e que, portanto, pudesse escolher qualquer ambiente do planeta para viver, consideraria mais proveitoso adotar o oceano como habitat, justamente por ser maior que a área continental, menos sujeito a catástrofes como terremotos, furacões, meteoros, secas, etc. O ambiente submarino oferece muito mais espaço para expansão tanto vertical quanto horizontal.

Por outro lado, uma civilização submarina seria mais ensimesmada. Quem vive na superfície vive a contemplar as estrelas, pode explorar o céu com telescópios, pode enviar foguetes para o espaço. Quem vive embaixo da água tem a visão do céu turva e será incapaz de estudar o espaço com a mesma abundância de dados que se obtém na superfície. Não à toa os atlantes são tão isolados e voltados só para seu próprio mundo marinho.

2: A Lucasfilm/ILM é um studio lendário, que existe desde a década de 70, criado a princípio para a produção de Star Wars e que ao longo das décadas sempre acompanhou a evolução dos efeitos especiais, nunca ficou obsoleto, ao contrário, sempre esteve liderando esta indústria e alcançando vários marcos.

Transcrevo aqui os vários milestones do studio, segundo a Wikipédia:

"1975: Resurrected the use of VistaVision; first use of a motion control camera (Star Wars Episode IV: A New Hope)
1980: First use of Go motion to animate the Tauntaun creatures of The Empire Strikes Back
1982: First in-house completely computer-generated sequence — the "Genesis sequence" in Star Trek II: The Wrath of Khan. (Previous computer graphics in Star Wars Episode IV: A New Hope were done outside of ILM.)
1985: First completely computer-generated character, the "stained glass man" in Young Sherlock Holmes
1988: First morphing sequence, in Willow
1989: First digital compositing of a full-screen live action image during the final sequence in Indiana Jones and the Last Crusade
1989: First computer-generated 3-D character to show emotion, the pseudopod creature in The Abyss
1991: First dimensional matte painting — where a traditional matte painting was mapped onto 3-D geometry, allowing for camera parallax, in Hook.
1991: First partially computer-generated main character, the T-1000 in Terminator 2: Judgment Day
1992: First time the texture of human skin was computer generated, in Death Becomes Her
1993: First time digital technology used to create a complete and detailed living creature, the dinosaurs in Jurassic Park, which earned ILM its thirteenth Oscar
1994: First extensive use of digital manipulation of historical and stock footage to integrate characters in Forrest Gump.
1995: First fully synthetic speaking computer-generated character, with a distinct personality and emotion, to take a leading role in Casper
1995: First computer-generated photo-realistic hair and fur (used for the digital lion and monkeys) in Jumanji
1996: First completely computer-generated main character, Draco in Dragonheart
1999: First computer generated character to have a full human anatomy, Imhotep in The Mummy
2000: Creates OpenEXR imaging format.
2006: Develops iMocap system, which uses computer vision techniques to track live-action performers on set. Used in the creation of Davy Jones and ship's crew in the film Pirates of the Caribbean: Dead Man's Chest
2011: First animated feature produced by ILM, Rango
2019: First use of real time rendering (with Unreal Game Engine) and digital LED displays as a virtual set (known as StageCraft or The Volume), The Mandalorian".

Os anões de The Witcher e a Branca de Neve sem anões

Dwarves in The Witcher

Anões têm uma presença constante no folclore europeu. Eles estão nos contos de Grimm, no Senhor dos Anéis (que é fruto do vasto conhecimento de Tolkien da mitologia européia) e tudo o que esta obra inspirou.

Anões também sempre tiveram uma presença forte no cinema. Convenhamos, anões são interessantes, são fotogênicos, as pessoas gostam de ver anões, mas também algumas produções contratam anões pela praticidade. Por exemplo, o robozinho R2D2 era performado por um anão que cabia dentro da máquina. George Lucas, aliás, sempre colocou muitos anões em seus filmes.

Eis que recentemente saiu uma notícia curiosa de que a Disney resolveu demitir os atores anões do seu remake de Branca de Neve e os Sete Anões, por mais paradoxal que isso pareça. Aparentemente, tudo o que precisou para a Disney tomar esta estranha decisão foi uma crítica do ator anão Peter Dinklage.

Na opinião dele, que ele fez questão de enfatizar que tem a ver com sua pauta progressista (ou, em outras palavras, politicamente correto), era um absurdo nos dias de hoje representarem anões vivendo em cavernas como no conto clássico.

O interessante é que os sete atores anões que foram demitidos não partilham da mesma opinião do famoso ator de Game of Thrones e pelo visto a Disney nem se importou de perguntar a eles. 

É um caso de minoria barulhenta. Como o Peter Dinklage é bem conhecido, o simples fato dele ter expressado uma interpretação bem pessoal sobre o que ele acha ser o politicamente correto com relação aos anões no cinema, a opinião dele importou mais do que a dos próprios atores que provavelmente estavam adorando participar do projeto e não se sentiam ofendidos em interpretar versões folclóricas de anões.

No exemplo oposto disto, recentemente também vimos vários atores anões participando da segunda temporada de The Witcher, representando, veja só, anões caricatos do folclore, pequenos guerreiros com machados e barbas longas. E olha, claramente eles parecem estar se divertindo bastante com o papel.

São exemplos como este que mostram que há um abismo separando o ser civilizado e ter respeito pelas pessoas e o ser politicamente correto e forçar a barra do que é certo ou errado, alcançando um nível de santarronice puritana e farisaica do qual a história já nos deu tantos exemplos no passar dos séculos.