Existe uma visão pessimista e catastrofista, misantrópica e até mesmo autodepreciativa de que somos uma praga neste planeta e a natureza nos odeia e quer nos eliminar. Para isto, ela usa de catástrofes naturais, ruge com a fúria dos vulcões e nos ataca com vírus.
É bom lembrar que não somos um estranho no ninho, pois somos fruto da natureza tanto quanto qualquer outra criatura. Se somos o que somos, é porque a natureza nos fez assim. Além disto, os fenômenos supersticiosamente considerados um ataque da natureza à humanidade já aconteciam bilhões de anos antes de aparecermos aqui. Tsunamis, erupções vulcânicas massivas, terremotos, tudo isto tem sido uma rotina no planeta desde sempre.
Quanto aos vírus e demais microrganismos, é interessante constatar o seguinte: nós mesmos somos constituídos por uma quantidade imensa de vírus e bactérias que vivem em parceria com nossas células. Fazemos parte dos vírus e eles de nós. Mais que amigos, friends.
A lógica da natureza é a sobrevivência e perpetuação. Todo ser vivo busca isto e, caso não busque, seu destino é a aniquilação. Tudo o que hoje existe no ecossistema, existe porque buscou a sobrevivência e perpetuação através das eras.
A princípio, uma maneira de um organismo alcançar este objetivo é competindo e superando seus competidores, mas isto não basta. Se a natureza fosse apenas competição, chegaria em um ponto em que restaria apenas um, apenas a espécie mais poderosa. Só que não funciona assim.
O ecossistema é, como o nome indica, um sistema, o resultado de uma interação intrincada de suas peças, de cada ser vivo. Uma vez que o leão precisa do cervo para sobreviver, não é do interesse do leão aniquilar todos os cervos. Um certo equilíbrio é necessário. Com relação aos vírus, eles precisam de hospedeiros. Ora, se um hospedeiro morre, o vírus perde o seu habitat. Por isto vírus extremamente letais tendem a sair de circulação em um curto período de tempo, pois ao matar o hospedeiro ele perde a oportunidade de se perpetuar.
Sendo assim, os microrganismos que melhor se perpetuam no mundo não são os agressivos, os matadores implacáveis, mas aqueles que cooperam. A cooperação é mais importante na natureza que a competição. Em nosso corpo, há literalmente trilhões de vírus, bactérias e fungos probióticos (palavra que literalmente significa "favorável à vida"), micróbios que não querem nos matar, mas nos manter vivos e saudáveis. Curiosamente, existem até mesmo vírus que funcionam como parte de nosso sistema imunológico, são os chamados bacteriófagos. Eles destroem bactérias que não fazem parte da comunidade saudável do nosso corpo.
Mesmo um micróbio que em determinado período evolutivo se mostra nocivo contra o hospedeiro, com o passar das gerações pode ser incorporado à "família", por meio de uma negociação mútua. O hospedeiro vai desenvolvendo resistência, o micróbio vai se adaptando e se tornando menos agressivo, enfim acontece uma convivência pacífica.
A cooperação é a estratégia evolutiva final, o endgame da corrida evolutiva. Isto vale para nosso ecossistema, para o mundo microscópico dos vírus e provavelmente também no mundo macroscópico das civilizações alienígenas. Talvez lá fora, naquilo que achamos que seja uma imensa floresta sombria, as civilizações mais avançadas sejam aquelas que aprenderam a cooperar umas com as outras.
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