Qaligrafia
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O idiota implicante

O idiota implicante é uma pessoa que se satisfaz em provocar as outras. Ele não tem prazer no respeito e em ser afável, antes alimenta-se do incômodo que causa, um vampiro psíquico que vive de ódio, um narcisista que projeta nos outros o reflexo de sua própria feiura. Qualquer palavra ou situação é um pretexto para iniciar uma discussão, para tentar atrair sua atenção por meio de críticas, xingamentos e uma irritante tagarelice. 

É impossível argumentar com este tipo de pessoa, pois ele de fato não está interessado em razão. Em uma discussão, pode fingir racionalidade, enquanto recorre a falácias desonestas. Não aceitará qualquer argumento válido, sempre encontrando um meio de seguir discordando e apontando falhas, pois para ele o que importa não é um embate honesto de ideias e sim o próprio debate em si e o desconforto emocional que provoca com seus métodos ardilosos. 

A melhor arma contra o implicante é o silêncio, é evitá-lo, deixar que fale sozinho até que se canse ou procure outro alvo.

[Rascunho] Tipos de personalidade

Em termos de atitude diante dos outros, há pessoas ativas, passivas, recíprocas, reativas e neutras.

A pessoa ativa costuma tomar a iniciativa nas interações. Isto pode ser uma virtude, pois é aquela que mais rapidamente se dispõe a ajudar os outros, mas também pode ser a que mais se apressa a criticar ou mesmo prejudicar os outros. Uma pessoa ativa não sabe esperar, ela "faz a hora, não espera acontecer".

A pessoa passiva é a companhia ideal das ativas, pois ela espera que os outros tomem iniciativa e quando isto acontece acolhem com facilidade e mesmo prazer a imposição alheia. Elas querem receber orientações, sugestões, ordens, querem alguém para seguir, para lhes dizer o que fazer. Ela pode ser uma grande auxiliar ou uma cúmplice de crimes e erros por "estar apenas seguindo ordens".

A pessoa recíproca está sempre buscando este equilíbrio matemático nas relações humanas, uma espécie de justiça ou karma perfeito, dando aquilo que recebe e esperando receber em troca o tratamento que confere aos outros. Constantemente sofre frustrações, pois nas relações entre as pessoas não existe isso de troca equivalente, há sempre uma diferença de níveis, um desequilíbrio que afronta a visão romântica de esperar perfeita reciprocidade no mundo.

A pessoa reativa não nutre o sonho utópico da reciprocidade, mas suas atitudes são baseadas em responder aos estímulos. O reativo irá tratar cada pessoa com uma resposta à altura do tratamento que recebeu, o que não significa que será um tratamento equivalente, recíproco ou equilibrado. Enquanto a pessoa passiva reage às ordens da ativa com obediência, a reativa tenderá a reagir com resistência. Ela não gosta de ordens ou imposições por ter uma tensão superficial muito densa. Tudo o que bate nela recebe uma resistência em sentido oposto. Ela pode reagir à passividade assumindo a liderança ou afastando-se. Irá respeitar a neutralidade, pois o neutro não projeta nenhuma força que provoque uma reação. A pessoa reativa nunca começa uma briga, mas pode comprar a briga e provavelmente será quem decide terminá-la.

A pessoa neutra não tem a submissão da passiva nem a iniciativa da ativa, não tem interesse em reciprocidades e é permeável às forças aplicadas nela, de modo que não reage. O neutro é o que os antigos chamavam de fleumático, um tipo manso, alheio, apático, que busca viver sem provocar ou ser provocado. Podem ser as pessoas mais simplórias e desinteressantes, bem como as mais iluminadas e zen. 

A infinitude da verdade

O fogo e o relâmpago eram tão fascinantes para nossos primitivos antepassados que eles atribuíam tais fenômenos aos deuses. Então dominamos o fogo, dominamos a eletricidade e se tornaram coisas triviais. Ah, se os antigos nos vissem, se vissem os milagres que fazemos com a eletricidade, diriam que ganhamos o poder dos deuses! 

Em cada era ficamos apavorados à medida em que adquirimos novos poderes da natureza e conhecimentos do universo. Oppenheimer, diante do formidável poder da bomba atômica, lembrou-se do potente Shiva, mas mesmo a bomba atômica para nós agora se tornou apenas mais uma tecnologia, assustadora, porém nada divina.

A cada novo avanço, a cada descoberta, Deus se torna maior e mais distante. Quando pensamos tê-lo alcançado, novos horizontes se expandem. A ciência e a tecnologia não mataram Deus, antes o tornaram maior do que antes, porque ampliaram os limites da nossa imaginação. 

Cada vez que surge uma nova tecnologia, sentimos o receio de estar fazendo algo blasfemo, de tentar brincar de Deus, até que esta tecnologia se torna ultrapassada e banal e os limites do divino são empurrados para além.

Nunca alcançaremos Deus ou a verdade última de tudo, pois são feitos de camadas cada vez mais sublimes. A verdade, como um buraco, sempre ficará maior e maior quanto mais nós escavarmos. 

Dedos de salsicha e frames rápidos em Everything Everywhere All at Once

Everything Everywhere All at Once (2022)

Everything Everywhere All at Once (2022)

O multiverso é um conceito presente na ficção já há muitas décadas. Talvez nenhuma mídia tenha explorado o assunto mais do que os quadrinhos, especialmente da Marvel e DC, onde o multiverso é responsável pela existência de diversos personagens e mundos.

Lá em 2011, no filme The One, o Jet Li encontrava versões alternativas dele mesmo em universos paralelos. Podemos voltar mais ainda no tempo e chegar na série clássica de Star Trek dos anos 60, onde havia um universo paralelo (chamado "mirror universe") com versões malignas dos protagonistas. Mais recentemente, o conceito se tornou mais popular graças aos filmes e séries do MCU, mas não podemos esquecer da série animada Rick and Morty, que explorou o assunto de uma maneira fantástica.

Desta forma, o filme Everything Everywhere All at Once (Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo), lançado em 2022, não veio com nenhuma novidade. Boa parte do público, senão a maioria, já deve estar familiarizada com a ideia de personagens existindo em diversas versões ao longo de infinitos universos.

O que impressiona mesmo no filme não é esta teoria científica. De fato, muito antes do surgimento da ciência moderna, a ficção já imaginava outras dimensões, outras realidades; também as religiões há milênios concebem a existência de outros reinos, como Céu, Inferno, Hades, o Pleroma, etc. É uma ideia que estamos acostumados a aceitar. A maneira como tal ideia é explorada é que pode resultar numa experiência de fantasia e encanto. No caso de Tudo em Todo Lugar... esta experiência é oferecida pela edição de imagem.

A história em si, a trama envolvendo uma família comum que se envolve em uma crise cósmica e também familiar, não é lá grande coisa. Bom, é grande por envolver uma crise do multiverso, mas a narrativa não consegue transmitir esta sensação de grandeza, já que no fim das contas tudo se resume aos problemas particulares daquela família. Os conflitos triviais entre marido e mulher, pais e filhos, são vestidos com esta capa fantástica dos "superpoderes", ganhando uma grandeza com intenção de ser épica. 

Everything Everywhere All at Once (2022)

O superpoder dos protagonistas lembra aquele da série Sense8¹, quando uma pessoa pode acessar as habilidades de outras por meio de uma conexão transcendente. No caso deste filme, a conexão se dá apenas entre uma pessoa e sua versões alternativas nos diversos universos. Por exemplo, a heroína Evelyn pode adquirir as habilidades de dança, culinária, arte marcial e outras tantas das outras Evelyns espalhadas pelo multiverso.

A troca de corpos é o que impressiona no filme justamente por causa da caprichadíssima edição de imagem. Muita coisa acontece a cada frame. Os atores estão constantemente mudando de aparência, de roupa, maquiagem, personagem. Em segundos vemos diferentes versões dos personagens, incluindo figurantes, e cada ação reverberando entre suas versões alternativas. 

Everything Everywhere All at Once (2022)

Realmente foi um trabalhão para a equipe de figurino, cenário e toda a edição e montagem das cenas. Merecidamente ganhou o Oscar de melhor montagem. Também ganhou o Oscar de melhor filme de 2022, o que tenho minhas dúvidas. Melhor montagem? Com certeza. Melhor filme do ano? Acho que não. 

Apesar da temática sci-fi e de uma história dramática de família, o filme como um todo é cômico e brinca com as múltiplas possibilidades do multiverso. Por exemplo, existe um universo onde os protagonistas são pedras e outro onde a evolução levou os humanos a desenvolverem bizarros dedos de salsicha.

Everything Everywhere All at Once (2022)

Everything Everywhere All at Once (2022)

O que é o cinema? É, entre outras coisas, uma experiência emocional, algo que herdou do teatro. Um bom filme leva você a experimentar sentimentos, a ficar imerso no mundo e na história dos personagens, seja por causa da ação, do terror, do drama, da comédia, do romance, etc.

O aparato técnico é importante para que um filme alcance esse objetivo. Por exemplo, se trata-se de sci-fi, os efeitos especiais contam muito. Em um romance, a trilha sonora será muito importante para criar o clima. No fim das contas, porém, os elementos fundamentais de um filme são o que importa: o roteiro e a atuação, ambos mediados pela direção e demais profissionais técnicos.

Com base nisso, eu diria que The Whale (2022) é que merecia ser o filme do ano, pois oferece uma experiência humana intensa, um drama convincente, imersivo. Nas redes sociais há muitos comentários de pessoas que assistiram, de cinéfilos e críticos ao público comum, e a impressão geral é que o filme mexe com as emoções, causa impacto. É algo que você termina de assistir e continua pensando a respeito. Como algo assim não foi reconhecido como o filme do ano?

Talvez aí entre um aspecto político do Oscar. A Academia tentou buscar um meio termo entre cinema cult e popular, pois Everything Everywhere... tem isso, essa mistura de uma temática mais cabeça, a complexidade do multiverso, com uma maneira de se comunicar mais voltada ao público jovem, à geração TikTok que gosta de frames rápidos, de nonsense e coisas absurdas acontecendo, como os dedos de salsicha.

Além disso, The Whale tornou-se alvo do tribunal do cancelamento, pelo simples fato de abordar os dramas de uma pessoa com obesidade mórbida, então isto pode ter pesado (ops) na decisão da Academia. De toda forma, a Academia não pôde fechar os olhos para a grande atuação do Brendan Fraser, de modo que pelo menos ele ganhou o Oscar como melhor ator.

Notas:


Palavras-chave:

Oniroamante

Ah mundo do sonho!
O paraíso do esquizoide.
O mundo imaginário, 
o mundo gnóstico,
onde o tirano vira pária
e o escravo vira lorde.

Mundo dos oniromantes,
onde construo jardins e fortes,
onde a memória casa-se
com o criar caótico,
remodelando o passado
e ao futuro dando forma.

(06,02,2023)


O crossover entre Superman, Shazam e Black Adam

Superman/Shazam!: The Return of Black Adam (2010)

Superman/Shazam!: The Return of Black Adam (2010)

Black Adam (2022)¹ foi um filme decente e que até teve potencial de criar um mini universo próprio, com a Sociedade da Justiça, mas a bilheteria não foi lá grande coisa. Poderia ter sido bem diferente com escolhas melhores.

Por exemplo, existe uma animação de 2010, Superman/Shazam!: The Return of Black Adam. É um desenho de apenas 25 minutos com um team-up entre Superman e Shazam para enfrentar o Black Adam. Ora, esta seria a fórmula perfeita para um live action de sucesso. A Warner tinha a faca e o queijo na mão.

O DCU já tinha o Superman do Henry Cavill, há anos esperando para voltar a algum filme, já tinha o Shazam do Zachary Levi e só faltava combinar estes dois com o The Rock como Black Adam. Um crossover de milhões.

Não sei que tipo de dificuldade a Warner teria para juntar estes três atores que já são de casa. Crossover é o que mais faz sucesso em filmes de super-heróis. A história já estava pronta, precisando só das devidas adaptações e expansão para um filme de uma hora e meia. Só que tinha um pedra no meio do caminho, uma rocha, o ego do The Rock.

Foi o The Rock que arquitetou o filme do Adão Negro e ele é daqueles que não topa ser um vilão. No máximo ele aceitou virar um anti-herói. Para ele, portanto, devia estar fora de cogitação participar de um filme em que ele seria apenas o antagonista do Superman e do Shazam. Perdeu a oportunidade de estrelar em um blockbuster bilionário.

Anyway, o DCU já estava fazendo as malas mesmo. A ideia de um crossover de Superman e Shazam contra Black Adam vai ficar na gaveta, perdida em uma animação feita na década passada.

Superman and Shazam vs Black Adam

Notas:


Palavras-chave:

A arte de não ser

Hoje em dia se fala tanto em identidade, em ser algo, ser um rótulo. Qualquer palavra é usada para resumir as pessoas a um título, uma casta. Sou negro, sou branco, sou pansexual, sou imigrante, sou conservador, sou progressista, sou isso, sou aquilo.

Quanto a mim, vivo nesse limbo da complexidade. Sou mestiço, de modo que não me encaixo na polarização de raças. Sou um livre-pensador, de maneira que tenho opiniões com diversos espectros dependendo da questão, sem contar que já mudei de opinião várias vezes e estou disposto a continuar mudando. A metamorfose ambulante.

Não sigo alguma moda, não tenho uma tribo, meus gostos musicais variam de um extremo a outro. Sou o caos.

Logo, é difícil definir quem sou, o que sou. Não sou uma palavra, algo que me agregue a outros semelhantes. A única semelhança que reconheço é a humanidade. No mais, apenas não sou.

Quem sou eu? Não sou.

(02,03,2023)