Há pessoas que costumam falar que gostam mais dos animais do que da humanidade porque eles são puros, inocentes, sem maldade. A verdade é bem diferente disso.
Eu tinha umas galinhas e notei um curioso comportamento em algumas delas. Eram quatro e duas delas tinham uma atitude dominadora sobre as outras. Por exemplo, sempre que eu colocava comida, as duas valentonas expulsavam as outras duas, simplesmente não permitiam que elas comessem. Passei então a distribuir a comida em dois pontos diferentes, um para as valentonas e outro para as rejeitadas. O que aconteceu? As valentonas deixavam a comida que coloquei para elas e iam até onde estavam as rejeitadas só para expulsá-las de lá e ficar com a comida delas. Aí as coitadas tentavam mudar de spot, indo para a comida que as valentonas deixaram para trás. Assim que as valentonas viam isso, voltavam de novo para lá a fim de expulsar as bichinhas.
Pois é, não se tratava de escassez, de luta por recursos, pois eu colocava bastante para todas. Era simplesmente um sentimento vil de egoísmo, de ganância. Este tipo de comportamento existe no mundo animal. Estas valentonas não toleravam sequer que as rejeitadas ciscassem perto delas e já avançavam, adotavam uma atitude ameaçadora.
Quem cria gatos também deve se deparar com situações de sadismo animal. Se você já viu um gato "brincando" com um passarinho, deve saber como estes felinos, por mais fofinhos que sejam com o seu cuidador humano, podem ser bem sádicos com outro ser vivo, arrancando as penas do pássaro uma a uma, sem se importar com seu sofrimento. E sim, o gato sabe quando está machucando alguém, pois ele sabe dosar a força de seu arranhão ou sua mordida no humano. Ele sabe mordiscar de leve uma pessoa, pois tem noção que se morder forte demais vai machucar. Quando brinca com uma presa, ele não se importa com isto.
Estes exemplos são bobos se comparados à real violência bruta da natureza selvagem, dos leões que estripam cervos e os comem ainda vivos e em estado de choque. Machos de diversas espécies se envolvem em brigas que podem resultar em morte ou em grave aleijamento, tudo para impor seu monopólio sexual sobre as fêmeas disponíveis.
Há outras coisas que animais cometem que é melhor nem descrever aqui.
Ao mesmo tempo, também podemos encontrar exemplos de animais afetuosos, de gatas adotando pintinhos como filhotes, de cães pulando na correnteza para salvar outra criatura, etc.
A natureza, assim como a humanidade, tem exemplos tanto de candura quanto de selvageria. Afinal, humanos são a natureza, somos fruto dela. É incoerente a misantropia que julga a natureza melhor que os humanos, pois os humanos são um produto da natureza. Somos o que somos graças à ela e à sua evolução de milhões de anos. Não somos anjos caídos que se rebelaram contra a natureza. Foi ela quem nos moldou assim.
Os sentimentos de ganância, egoísmo e competitividade exacerbada existem tanto na humanidade quanto nas galinhas, nos gorilas, nos pets mais fofinhos. Os humanos, de fato, são os únicos animais que questionam este aspecto sombrio da natureza. Somos os únicos que ficamos enojados com a injustiça, que temos um conceito bem definido de maldade e buscamos um mundo menos cruel.
A misantropia é como uma doença autoimune surgida deste nosso desejo de bondade e justiça. Este desejo se deturpa, perde o propósito e vira ódio generalizado à espécie humana. É um sentimento ontologicamente paradoxal, pois um verdadeiro misantropo, se realmente deseja o fim de toda a humanidade, deveria começar dando o exemplo com o próprio fim. É impossível ser um misantropo honesto e continuar existindo.
O ódio à injustiça não deve se transformar em misantropia, sob risco de perder sua nobreza, seu grande propósito. Questionar a injustiça e a maldade é questionar a própria natureza. Nós somos o esforço da natureza em superar sua própria brutalidade.
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